É de conhecimento popular que só pegamos algumas doenças, como a gripe, de outras pessoas. No entanto, um novo artigo sugere que muitas doenças vistas como não transmissíveis, como condições cardíacas e a maioria dos cânceres, podem sim ser transmissíveis – graças aos micróbios aparentemente inofensivos que vivem no corpo humano.
Todos somos cheios de microorganismos como bactérias, vírus e outras criaturas que dependem de nosso corpo para sobreviver. Por pior que pareça essa realidade, esses seres geralmente coexistem conosco sem causar nenhum dano, e muitos são benéficos, como as bactérias que quebram os alimentos em nosso intestino.
O mundo invisível onde esses organismos vivem é chamado de microbioma. Recentemente, começamos a desvendar as formas que o microbioma pode afetar nosso corpo, especialmente quando desequilibrado. Estudos envolvendo animais de laboratório e humanos, por exemplo, vincularam uma variedade de condições crônicas não transmissíveis, como obesidade e doenças cardiovasculares, a um microbioma fora de sintonia.
Ainda estamos nos estágios iniciais de compreensão do microbioma. Porém, em um novo artigo publicado na revista Science, os autores argumentam que há evidências o bastante para começar a testar a teoria de que muitas doenças não transmissíveis podem ser transmitidas através do microbioma.
Por um lado, condições como a obesidade são conhecidas por agrupar-se em um grupo seletivo de pessoas. Um estudo, de mais de 12 mil pessoas, em um período de 30 anos, descobriu que aqueles que tinham um amigo obeso tinham 57% mais chances de se tornarem obesos. Existia um padrão semelhante para quem tinha um cônjuge obeso ou irmão que se tornou obeso na idade adulta.
Em animais, estudos mostraram que, ao se eliminar o microbioma intestinal de camundongos saudáveis e transplantar um microbioma de camundongos obesos, é provável que os roedores fiquem “cheinhos”. Estudos que faziam o inverso também demonstraram tratar ou retardar a progressão, não apenas da obesidade, mas de doenças crônicas como Alzheimer e doenças cardíacas.
Há até evidências precoces da transmissão de humano para humano de nossos microbiomas, em geral, como de mãe para filho no útero ou de bactérias fecais de outras pessoas, que acabam em nossa água ou alimentos.
A obesidade pode ocorrer em grupos, mas a genética, ou um ambiente compartilhado, é responsável por parte desse risco aumentado. Ao mesmo tempo, ambiente e genética também moldam a aparência dos microbiomas. E mesmo que exista um microbioma “arriscado” para o Azheimer, não é como se alguém nesse ambiente acordasse com demência na manhã seguinte. Muitas condições crônicas levam anos ou até décadas para surgir, mesmo em pessoas com alto risco, e nem todas ficam doentes.
Todos esses desafios tornam a teoria difícil de provar, mas os autores dizem que desenvolveram regras para orientar pesquisas em andamento e as futuras, com base nos critérios estabelecidos por Robert Koch (conhecidos como postulados de Koch) e outros, no final do século 18, para afirmar que um germe específico estava causando uma doença.
As regras incluem:
- Mostrar que certos padrões de micróbios são mais comumente encontrados em pessoas com uma doença não transmissível, do que em populações saudáveis;
- Ser capaz de cultivar esses micróbios em laboratório;
- Mostrar que animais saudáveis podem desenvolver a mesma doença quando os microorganismos são transplantados;
- Ser capaz de encontrar um padrão semelhante de micróbios nos animais agora doentes.
Muitos cientistas já estão estudando as ligações entre as doenças humanas e o microbioma. Mas levará muito tempo e pesquisa antes que possamos considerar doenças não transmissíveis como contagiosas, e mais ainda para tratá-las de maneira confiável através do microbioma.
Via: Gizmodo