Rappi e Uber foram notificadas pela Fundação Procon-SP sobre a morte de um entregador na cidade de São Paulo. Thiago de Jesus Dias, motoboboy, teve um acidente vascular cerebral (AVC) durante uma entrega. Quando contatada, a Rappi não prestou qualquer tipo de socorro. No momento do incidente, um motorista da Uber se recusou a levá-lo ao hospital e o SAMU não enviou ambulância ao local. Em posicionamentos oficiais, as empresas se isentam de qualquer responsabilidade pelo ocorrido, alegando que prestam serviços aos motoristas e entregadores, que utilizam de suas plataformas — e não o contrário.
O caso
No dia 6 de julho, Thiago de Jesus Dias, motoboy que trabalhava em nome da Rappi sofreu um acidente vascular cerebral (AVC) enquanto fazia uma entrega. Na ocasião, Thiago queixou-se de dor de cabeça e pediu à cliente que ligasse para a irmã dele, Daiane de Jesus Dias, e avisasse a Rappi. Ao contatar o app, o único questionamento apresentado, segundo relatos, foi “Então ele não vai poder finalizar nenhuma das próximas entregas?”; nenhum socorro foi prestado. Um motorista da Uber recusou-se a levar o motoboy ao hospital, porque ele havia vomitado e urinado em suas roupas.
Tanto a cliente quanto a irmã de Thiago tentaram contato com o Samu, sem sucesso. O mesmo retornou para Daiane às 23h03, mais de meia hora depois — neste tempo, os “socorristas” resolveram recorrer ao Uber, sem sucesso, e, por fim, optaram por levá-lo por conta ao hospital. Chegando no local, outra dificuldade: conseguir atendimento prioritário, já que o motoboy não chegou em uma ambulância. Thiago morreu 12 horas depois de chegar ao hospital.
Posicionamento
Em resposta ao Procon-SP, a Rappi diz que “não contrata os entregadores parceiros; muito pelo contrário, são os entregadores parceiros que contratam a Rappi para, por meio de plataforma tecnológica disponibilizada, entrar em contato com os usuários e angariar clientes para a sua atividade comercial de motofrentistas”
A empresa também contou que “está desenvolvendo um botão de emergência, que estará disponível dentro do aplicativo dos entregadores, por meio do qual eles poderão optar por acionar diretamente o suporte telefônico da Rappi — que contará com equipe especializada — ou as autoridades competentes (caso se deparem com situações relacionadas à saúde ou segurança)”.
Em entrevista ao BuzzFeed News, Isaque de Jesus Dias, de 24 anos, irmão do entregador manifestou sua revolta. “Eles descobriram que podem salvar vidas só agora? Depois de anos de aplicativo, eles tiveram a consciência de criar um botão? (…) É revoltante eles terem essa ideia só agora, depois de a gente perder nosso irmão. Afinal, o que ele deixou de fazer a Rappi pode substituir por outro, mas nós da família não temos esse poder de contratar um novo irmão”.
O posicionamento da Uber foi semelhante. “O motorista parceiro cadastrado não presta serviços à Uber, mas, sim, aos usuários da plataforma. Ou seja, a relação é exclusivamente comercial, pela qual o motorista parceiro é o contratante da Uber para a utilização de sua plataforma tecnológica”.
Além disso, a empresa alegou seus motoristas “não são profissionais de saúde capacitados a avaliar o estado das vítimas”, e que os carros oferecidos através do aplicativo “não são adaptados para substituir ambulâncias”.
Procon-SP adotará medidas cabíveis
“Mesmo que as empresas aleguem existir apenas relação comercial com entregador e motorista… É responsabilidade das empresas prepararem seus parceiros para que atuem em todas as situações, inclusive, em casos de risco ou iminente perigo”, afirma a entidade.
Segundo o Procon-SP, “não se trata de discussão sobre qual a natureza da relação entre os motoristas, entregadores e suas plataformas digitais, mas a discussão sobre a violação do direito à vida… ninguém pode ter a sua vida colocada em risco ou abandonada em iminente perigo em decorrência de uma simples discussão sobre ausência de responsabilidade legal”.
A entidade promete adotar “medidas e sanções com base no Código de Defesa do Consumidor”. O CDC prevê a responsabilidade solidária entre as partes que fornecem e que oferecem produtos.
Polícia Civil e Secretaria de Saúde apuram caso
Inquérito foi aberto pela Polícia Civil de São Paulo afim de apurar se a recusa do motorista da Uber configura crime de omissão de socorro, previsto no Código Penal. “Vamos investigar até que ponto essa negativa do motorista repercutiu no agravamento do quadro de saúde da vítima”, contou o delegado Antonio José Pereira à Folha de São Paulo.
A Secretaria de Saúde, responsável pelo Samu na capital paulista, abriu investigação interna para apurar se o serviço cometeu negligência. Os bombeiros e a Polícia Militar afirma não ter recebido nenhum pedido de resgate para o entregador.
Via: Folha de São Paulo