Há dez anos descobrimos um parentesco com os neandertais. Isso porque geneticistas encontraram vestígios entre os nossos ancestrais e os hominídeos da Idade da Pedra que habitavam a Europa no passado.

Com isso, Svante Pääbo, um dos responsáveis pela descoberta, iniciou um processo de extração, sequenciamento e análise desse DNA antigo a partir de ossos encontrados. Agora, uma equipe de pesquisadores europeus levou a ciência para outro nível. Eles produziram partes de tecido cerebral com DNA e proteínas derivadas dos neandertais – um processo que cria “minicérebros“.

O objetivo é esclarecer como os neandertais se relacionam com os humanos modernos. “Estávamos curiosos sobre o quanto do genoma neandertal poderia ser explorado se tivéssemos acesso a células-tronco das pessoas certas”, disse Grayson Camp, líder do grupo de pesquisa do Instituto de Oftalmologia Molecular e Clínica em Basileia, sediado na Suíça.

Ele ainda afirma que a pesquisa é um projeto que poderia ajudar no entendimento das diferenças cognitivas entre humanos e neandertais – embora o estudo ainda esteja em estágios iniciais de desenvolvimento e deve levar anos para que resultados conclusivos sejam apresentados.

Anteriormente, Camp já havia produzido um tecido semelhante, porém, a partir de células de um chimpanzé. O objetivo era o de tentar entender como o nosso cérebro mudou desde que divergimos dos primatas.

Métodos de pesquisa

O estudo, publicado na revista Cell Stem Reports, detalha os procedimentos adotados pelos pesquisadores. Para o projeto, foram utilizadas células-tronco da Iniciativa Induzida por Células-Tronco Pluripotentes Humanas (HipSci). Recentemente, a iniciativa conseguiu reunir um biobanco de células extraídas de pessoas comuns – a maioria do Reino Unido e do norte da Europa.

De acordo com Camp, essa população é a mais provável de ter genes neandertais. “Analisamos o genoma de cada um desses indivíduos. Para verificar as semelhanças, usamos como base a referência criada pelo laboratório de Pääbo. Com isso, pudemos descobrir quem tinha parte neandertal e quem não”, afirma.

“Por indivíduo, há algo entre 1% e 4% de genoma proveniente dos neandertais. Se você olhar para 200 pessoas, acabará recuperando 20% desses genes. Isso significa que todo esse recurso de células-tronco é muito valioso para nós”, explica Camp.

A partir disso, a equipe produziu organoides cerebrais – bolhas 3D de tecido cerebral com apenas alguns milímetros de largura. Essa não é a primeira vez que esses pequenos organismos são criados. No entanto, segundo Camp, “ninguém nunca se preocupou em olhar onde o DNA neandertal poderia estar”.

Minicérebros

Apesar do avanço, o cientista faz questão de enfatizar de que a criação não é um “cérebro neandertal cultivado em laboratório”. Ele continua: “Essas são células humanas, não neandertais. São células que possuem DNA neandertal naturalmente dentro delas, mas são humanas”.

Os pesquisadores também conseguiram demonstrar que os organoides, chamados de “minicérebros“, conseguem fazer conexões e até gerar alguma atividade elétrica – mas ainda estão longe de parecer com a versão original.

A expectativa é de que, no futuro, tecidos de diferentes partes do corpo possam se cultivados e estudados para entender como os traços neandertais podem ter moldado os nossos, afirma Camp.

Como exemplo, ele cita que os genes podem ser usados para entender como a cor da pele e o cabelo mudaram com o passar do tempo. Da mesma forma, pode-se usar os organoides como forma de definir a maneira como o conjunto de enzimas do intestino dos nossos antepassados processavam alimentos.

Por fim, Camp acrescenta que seria interessante analisar células-tronco de outras populações ao redor do mundo. A ideia é encontrar DNA Denisovano – um primo distante dos neandertais cujo material genético não foi encontrado nos europeus.

Via: CNN