Problemas envolvendo a coleta e análise dos resultados de testes da Covid-19 podem ter sido responsáveis por uma diferença de até seis mil mortes nas estatísticas oficiais divulgadas pelo Ministério da Saúde.
Estes indivíduos passaram pelos testes de RT-PCR, no entanto, tiveram resultados negativos. De acordo com a estimativa, ao menos 61% obtiveram essa classificação por conta de amostras coletadas fora do período em que o exame é sensível à doença.
Porém, este não é o único problema. Segundo especialistas, há outros fatores prejudiciais para as análises feitas e que, consequentemente, podem levar aos falsos negativos.
Recentemente, como divulgado pela Folha, até o dia 2 de maio, o país registrou 9.805 mortes em decorrência da Covid-19. O número foi divulgado diretamente pelo Sistema de Vigilância da Síndrome Respiratória Aguda Grave do Ministério da Saúde.
No entanto, na época, os dados divulgados eram diferentes. O próprio ministério indicava 6.724 óbitos. Isso mostra que houve uma atualização em relação aos números informados. Essa alteração pode ser explicada pelo fato de que o sistema é alterado de acordo com a data em que as mortes são notificadas pelas secretarias de Saúde, e não quando ocorreram de fato.
Além disso, outros 6.339 óbitos registrados como por Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) ultrapassaram a média histórica para o período. Porém, não foram consideradas como Covid-19. Isso pode ter acontecido justamente por problemas nos testes realizados.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) e a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) definem alguns parâmetros para que os testes RT-PCR tenham resultados que condizem com a realidade do paciente.
Se forem feitos fora do período recomendado, testes podem dar um falso resultado negativo. Foto: AvailableLight/ iStock
De acordo com eles, para que o diagnóstico seja feito corretamente, a coleta das amostras deve ser feita sob certas condições, como entre o terceiro e sétimo dia a partir da manifestação dos sintomas comuns da doença.
Obviamente esse procedimento não é regra absoluta, já que, em alguns casos, após um tempo, o vírus se aloja nas vias aéreas inferiores, o que necessita de um sistema de coleta totalmente diferente.
Problemas de coleta
De acordo com a reportagem, em 61% dos casos analisados, o material foi coletado muito cedo ou muito tarde usando materiais para as narinas e garganta – o que diminui a precisão do diagnóstico.
Para as autoridades de saúde, realizar a coleta no tempo ideal é um desafio. Em geral, a doença leva alguns dias para se agravar, o que faz com que o paciente procure atendimento fora do período indicado para a coleta.
Em outros casos, o infectado pode não associar certos sintomas à doença, como a dor de cabeça, e não indicar corretamente a data em que começaram a se manifestar, fazendo com que o teste seja realizado fora do período, causando um falso negativo.
Um fator predominante, e que pode alterar também o número de casos, é que muitas equipes de saúde não têm familiaridade com os instrumentos de coleta e, devido à rápida evolução da pandemia, não tiveram um treinamento adequado de utilização.
Além de tudo isso, ainda há questões envolvendo o armazenamento das amostras, transporte e tempo até que sejam de fato analisadas. Outro ponto importante é a qualidade dos reagentes utilizados – o que pode comprometer os resultados.
Defesa
Em resposta aos questionamentos da Folha, o Ministério da Saúde atribuiu o aumento dos casos de SRAG a maior sensibilidade dos sistemas de vigilância em decorrência da pandemia. Essa declaração indica que, em outros anos, ocorreu subnotificação dos mortos pela síndrome.
O Instituto Butantan, que realiza os testes em São Paulo, disse que observou problemas na coleta, registro e armazenagem das amostras no início do surto. No entanto, informa que produziu e distribuiu material para treinar as equipes de coleta em conjunto com a Secretaria de Saúde.
Via: Folha de São Paulo