O centro da Via Láctea é um lugar, no mínimo, animado. Muita coisa acontece ao redor de Sagitário A* (Sgr A*), o buraco negro com uma massa de quatro milhões de vezes a do Sol. O vento nuclear da região, por exemplo, esculpiu duas esferas gêmeas de poeira, gás e raios cósmicos que emergem do buraco negro, acima e abaixo do plano galáctico, estendendo-se por um total de 50 mil anos-luz: as bolhas de Fermi.
Mas uma equipe internacional de pesquisadores descobriu algo novo dentro dessas bolhas, um gás frio e denso, que é lançado a partir do centro da Via Láctea “como uma bala”. Exatamente como o gás é ejetado ainda permanece um mistério, mas os cientistas acreditam que essa perda pode ter implicações importantes para o futuro de nossa galáxia.
“Quando você expulsa muita massa, está perdendo parte do material que poderia ser usado para formar estrelas e, se perder o suficiente, a galáxia não poderá mais formar estrelas”, afirma a astrofísica Naomi McClure-Griffiths, da Universidade Nacional Australiana (ANU), uma das autoras do estudo publicado na Nature.
Para encontrar as nuvens de gás molecular denso e frio, os pesquisadores estudaram nuvens de hidrogênio atômico previamente identificadas nas bolhas de Fermi, usando o radiotelescópio Atacama Pathfinder Experiment para procurar sua assinatura espectral. Assim, foram encontradas duas nuvens contendo pelo menos 380 e 375 massas solares de gás molecular e movendo-se a 240 quilômetros por segundo e 300 quilômetros por segundo, respectivamente.
A equipe de pesquisa analisou as duas nuvens, agora conhecidas como MW-C1 e MW-C2, e descobriram que elas eram muito mais frias do que os gases descritos anteriormente no vento da Via Láctea. “Em termos de temperatura, a diferença entre o gás quente e o gás frio é da ordem de mil”, afirma McClure-Griffiths.
O gás frio mede em torno de -212°C e é “muito denso”, o que o torna muito mais difícil de se mover em comparação com o gás quente difuso. “Uma maneira de pensar nisso é que você consegue soprar a fumaça para longe do seu rosto, mas não pode soprar uma pedra”, explica a astrofísica.
O estudo também levanta novas questões sobre o que está acontecendo em nosso centro galáctico agora. “O vento no centro da Via Láctea tem sido tema de muito debate desde a descoberta, há uma década, das bolhas de Fermi”, lembra McClure-Griffiths. “Observamos que não há apenas gás quente vindo do centro de nossa galáxia, mas também gás frio e muito denso, que por ser mais pesado, se move com menos facilidade”.
Também não está claro se esse gás é expelido por Sgr A* ou se é soprado por milhares de estrelas massivas que ficam no centro da galáxia. “Não sabemos como o buraco negro ou a formação de estrelas podem produzir esse fenômeno, e fica mais complicado à medida que aprendemos mais sobre isso”, afirma Enrico Di Teodoro, da Johns Hopkins University, principal autor do artigo.
“Esta é a primeira vez que algo assim foi observado em nossa galáxia. Vemos esse tipo de processo acontecendo em outras galáxias. Mas, com galáxias externas, você obtém buracos negros muito mais massivos, a atividade de formação de estrelas é maior, o que torna mais fácil para a galáxia expelir material. E essas outras galáxias estão obviamente muito longe, não podemos vê-las em muitos detalhes”, completa.
Via: Science Alert/CNet