Há 25 anos, em 22 de Novembro de 1994, a Sega lançava um novo console: o Sega Saturn. A empresa estava no auge graças ao sucesso do Mega Drive no ocidente (especialmente EUA e Brasil) e a expectativa pelos primeiros consoles da geração 32-Bits, com sons e gráficos melhores e novos estilos de jogo, era grande.

A Nintendo não tinha nada parecido e a Sony, que lançaria o PlayStation um mês depois, era uma total novata sem tradição no mercado de videogames. Parecia que o sucesso da Sega estava garantido.

Infelizmente as coisas não saíram como planejado. Decisões ruins por parte da Sega, bem como o sucesso do PlayStation, fizeram com que o console fosse abandonado no final de 1998, após apenas quatro anos no mercado.

Ainda assim, o Saturn (ou Saturno, aqui no Brasil) deixou uma marca no coração dos gamers com inovações no hardware, como controles analógicos, e jogos que se tornaram verdadeiros clássicos como Nights: Into Dreams e Panzer Dragon, entre outros. Venha conosco relembrar (ou conhecer) um pouco da história deste console.

A origem do nome

O nome Saturn nasceu em uma época em que a Sega usava planetas do sistema solar como codinome para seus projetos internos, e todos os consoles lançados durante esta época ficaram conhecidos como sendo parte da “série planetas”. São eles o Game Gear (Mercury / Mercúrio), Nomad (Venus), 32x (Mars / Marte) e Saturn.

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Sega Pluto, variante do Saturn com modem integrado. Crédito: Sega Retro

Além deles sabe-se do Neptune (Netuno), uma mistura de Mega Drive com 32X que nunca foi lançada (embora exista um protótipo) e Pluto (Plutão), um Saturn com modem para jogos online que também não chegou ao mercado. Uma versão do Saturn para os arcades, que usava cartuchos em vez de CDs para os jogos, foi batizada de Titan (uma das luas de Saturno).

Lançamento conturbado

O Saturn teve um lançamento muito conturbado, que acabou prejudicando o console por toda sua vida. O lançamento nos EUA estava programado para 2 de Setembro de 1995, data que seria conhecida como “Saturnday” (uma brincadeira com Saturday, Sábado). Mas a Sega no Japão pressionou a filial norte-americana a adiantar o lançamento do console, para que chegasse às lojas antes do PlayStation, da Sony.

Com isso durante a primeira E3, em 11 de Maio de 1995, o CEO da Sega of America Tom Kalinske subiu ao palco e anunciou que o console estaria disponível “imediatamente” ao preço de US$ 399, que incluía uma cópia do jogo Virtua Fighter. Segundo o executivo, devido à “grande demanda” pelo console entre os consumidores 30 mil unidades tinham sido entregues às redes Toy’s R’ Us, Babbage’s, Electronics Boutique e Software Etc.

O problema é que outras grandes redes de varejo nos EUA, como Best Buy, Walmart e Kay-Bee Toys, não foram informadas da mudança de planos e ficaram furiosas ao descobrir que os concorrentes tiveram acesso ao console antes deles. E o que fizeram? Se recusaram a vender o console da Sega.

Para piorar, os desenvolvedores também foram pegos de surpresa, já que estavam se programando para o lançamento em setembro. Com isso, jogadores que compraram o Saturn logo nos primeiros dias amargaram alguns meses quase sem novos títulos, além dos 6 que foram lançados junto com o console. Nenhum deles, com exceção de Virtua Fighter, muito impressionante.

E como a Sony reagiu? Horas depois de Tom Kalinske anunciar o lançamento surpresa do Saturn no palco da E3 o diretor da Sony Computer Entertainment of America (SCEA), Olaf Olafsson, subiu ao mesmo palco, se aproximou do microfone e disse apenas “duzentos e noventa e nove”.

Com um preço US$ 100 menor que o do Saturn e o apoio de sucessos do arcade como Ridge Racer já no primeiro dia, a Sony abriu caminho para a vantagem que seu console teve sobre o concorrente durante toda sua vida.

Fera difícil de domar

Outro fator que prejudicou o Saturn foi a dificuldade de desenvolvimento. Sua arquitetura era muito incomum para a época, com dois processadores Hitachi SH-2 e dois chips de vídeo: VDP1, que cuidava dos sprites, polígonos e texturas, e VDP2, que cuidava dos elementos de fundo da cena.

Os programadores não estavam acostumados a lidar com sistemas multiprocessados, e para piorar a Sega não se esforçou em criar ferramentas de desenvolvimento que facilitassem sua vida. Inicialmente não havia um compilador C, nem bibliotecas de desenvolvimento que ajudassem a explorar o poder do console.

Com isso era necessário programar o console “do zero” em Assembly, e o Assembly do Hitachi SH-2 é diferente do usado no Motorola 68000 do Mega Drive. Os programadores não podiam usar sua experiência no Mega Drive como ponto de partida para o Saturn, em vez disso teriam de aprender uma linguagem e um hardware completamente novos.

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Placa-mãe do Sega Saturn. As CPUs estão destacadas em laranja, os processadores de vídeo em azul e o processador de som em vermelho. Crédito: Wikimedia Commons.

Em uma extensa entrevista Hideki Sato, engenheiro de hardware creditado com o desenvolvimento do Master System, Mega Drive, Saturn e Dreamcast, e mais tarde CEO da Sega, relembra o momento:

“Os estúdios tinham dificuldade em programar o SH-2 em Assembly, e nós tínhamos dois processadores e o CD-ROM. Nós pedíamos aos estúdios para criar jogos, mas sem bibliotecas de desenvolvimento eles não conseguiam fazer nada. Eles levavam uma semana tentando e mal eram capazes de mostrar alguma coisa na tela, quanto mais começar a criar um jogo. Nosso suporte aos estúdios era horrível”.

Yu Suzuki, responsável por muitos dos sucessos da Sega no arcade, como Space Harrier, Outrun, After Burner, Virtua Racing e Virtua Fighter, reconhece a dificuldade no desenvolvimento, e admite que uma arquitetura simplicada seria melhor.

“Uma CPU muito rápida seria preferível. Eu não acho que todos os programadores tem a capacidade de programar duas CPUs – a maioria consegue no máximo uma vez e meia o desempenho que você pode conseguir de um SH-2. Eu acho que apenas 1 em cada 100 programadores são bons o bastante para conseguir o dobro de desempenho no Saturn”.

Face à escolha entre investir tempo (e dinheiro) para “aprender” a domar o Saturn ou desenvolver para o PlayStation, o que era muito mais fácil, a maioria dos estúdios preferiu a escolha óbvia e apoiou o sistema da Sony.

Controle pioneiro

Responda rápido, qual foi o primeiro console a ter um controle com direcional analógico integrado? PlayStation? Nintendo 64? Não senhor, a resposta é o Saturn. Pelo menos no ocidente, onde o 3D Control Pad (Joystick 3D, no Brasil) chegou às lojas antes do Nintendo 64.

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3D Control Pad: o pioneiro em direcional e gatilhos analógicos. Crédito: Sega Retro.

Grandalhão, o acessório foi originalmente projetado para dar mais flexibilidade no controle das personagens em Nights: Into Dreams, mas foi eventualmente suportado por cerca de 70 jogos e influenciou o design do controle do Dreamcast, sucessor do Saturn. Outro ponto pioneiro foi a inclusão de gatilhos analógicos, algo que a Nintendo só iria adotar no Gamecube e a Sony no PlayStation 3.

Mascote incomum

“Segata Sanshiro! Segata Sanshiro! Sega Satan, shiro!”. Este era o jingle dos comerciais do Saturn estrelados por Segata Sanshiro, um judoca que percorria o Japão punindo as pessoas que não estavam jogando Saturn.

O personagem era uma paródia de Sugata Sanshiro, herói do filme Sanshiro Sugata (A Saga do Judô, no Brasil) de Akira Kurosawa, e uma brincadeira com a frase “Sega Satan, shiro!”, que significa “Jogue Sega Saturn!” em japonês. Foi tão popular que ganhou uma canção tema, um videoclipe e apareceu em seu próprio jogo, uma coleção de minigames chamada Segata Sanshiro Shinken Yuugi.

Quando lançou o Dreamcast a Sega decidiu abandonar a personagem, mas não sem antes fazer uma homenagem: no último comercial os concorrentes lançam um míssil contra a sede da Sega para impedir o lançamento do Dreamcast. Sanshiro pula em cima do míssil e o desvia para o espaço, onde ele explode. Na cena final a imagem do herói sorridente aparece sobre a cidade, ao lado de uma estrela cadente. O narrador diz: “Segata Sanshiro viverá para sempre em nossos corações”.

Rei do 2D

O Saturn foi criado originalmente como um console para gráficos “2D”, como os do Mega Drive, SNES e a maioria dos sistemas de arcade da época. Mas durante o desenvolvimento a Sega ficou sabendo do projeto PlayStation e adicionou um processador extra e modificou o sistema de vídeo para que fosse possível trabalhar com gráficos poligonais.

Ainda assim não foi o suficiente e o PlayStation era inegavelmente mais forte quando o assunto era 3D. Mas o Saturn batia o console da Sony no 2D, graças em parte à maior quantidade de memória de vídeo, o que permitia que os desenvolvedores criassem cenários e personagens mais complexos.

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Graças à memória extra, as versões para o Saturn de jogos de arcade como Street Fighter Zero 3 eram muito mais fiéis. Crédito: VGDB

Além disso, o slot de cartucho do Saturn permitia a expansão da memória do console, e cartuchos de 1 MB e 4 MB foram lançados. Com isso, jogos como Marvel Super Heroes, Street Fighter Zero 3 e The King of Fighters, entre muitos outros, eram muito mais fiéis ao arcade, com todas as animações e golpes intactos.

Saturn no bolso

Hoje em dia você pode relembrar os jogos do Saturn em qualquer lugar, graças a emuladores como o Yaba Sanshiro, para Android. Apesar de não ser perfeito ele consegue rodar muitos jogos com boa fidelidade e o desempenho em smartphones recentes, como o Galaxy A50 ou Motorola One Vision, é excelente.

O emulador é gratuito, mas você vai precisar de cópias dos CDs com os jogos (na forma de arquivos .ISO) e, preferencialmente, um controle Bluetooth como o iPega 9087. Depois é só curtir. Vai uma partida de Virtua Fighter?