Remédio criado pela Unicamp para tratar câncer acelera recuperação da Covid-19

Medicamento teve resultados positivos em diminuir o tempo de internação de pacientes em estado grave
Luiz Nogueira18/06/2020 13h02, atualizada em 18/06/2020 13h06

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Pesquisadores da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) criaram um medicamento, chamado OncoTherad, que ajuda na estimulação do sistema imune para combate ao câncer. No entanto, foi descoberto que o imunoterápico também pode ser um grande aliado contra o novo coronavírus.

O remédio, que está em fase de testes clínicos, foi aplicado em cinco pacientes que estavam com sintomas graves da Covid-19. O medicamento, juntamente de antibióticos e corticoides, ajudou a controlar a resposta inflamatória do pulmão, além de reduzir o tempo de internação – normalmente de 18 dias – para apenas dez.

A situação em que a aplicação foi mais significativa aconteceu com um paciente de 78 anos. O idoso contraiu a doença durante um cruzeiro feito pela costa brasileira. Ele foi tratado no Hospital Municipal de Paulínia.

O estado do paciente era avançado. Segundo Wagner José Fávaro, professor do Instituto de Biologia da Unicamp e coordenador do estudo, publicado no Social Science Research Network, o homem “chegou ao hospital com 50% do pulmão comprometido, febre de 38,3 graus, dor de cabeça, falta de apetite, dificuldade para respirar e nível de oxigenação no sangue em 87%”.

Devido ao quadro em que se encontrava, o paciente, por recomendação dos médicos, deveria ser intubado. No entanto, ele relutou quanto a isso. Temia não sair da ventilação mecânica com vida por conta de problemas envolvendo várias doenças crônicas e por ser fumante de longa data.

Reprodução

Paciente chegou ao hospital com 50% do pulmão comprometido. Foto: sorbetto

“Após conversar com a família, decidimos fazer apenas a suplementação de oxigênio por cateter intranasal e administrar o imunoterápico associado aos antibióticos e corticoides do protocolo padrão do hospital. Após 72h de internação, os marcadores inflamatórios no sangue tinham diminuído significativamente, a saturação de oxigênio estava em 95%, a coriza havia diminuído e a febre, sumido. No sétimo dia, já sem o cateter intranasal, o nível de oxigênio no sangue atingiu 98%. No décimo dia ele teve alta”, conta Fávaro em entrevista à Agência Fapesp.

Em exames posteriores, os pesquisadores descobriram que as lesões encontradas no pulmão haviam cicatrizado e que o paciente havia desenvolvido anticorpos do tipo IgG (imunoglobulina G), que são encontrados em indivíduos curados da Covid-19.

Outros quatro pacientes que também receberam doses do remédio apresentaram resultados semelhantes. Todos eles, assim como o recuperado, apresentam câncer de bexiga e algumas doenças crônicas – além de terem mais de 65 anos.

“O que chama a atenção é que indivíduos nessas condições tendem a piorar nos primeiros dias de internação por Covid-19. Mas todos que tratamos com esse protocolo – que consiste em administrar antibióticos e corticoides durante seis dias e o imunoterápico por duas semanas – apresentaram sinais de melhora desde o início”, diz Fávaro.

OncoTherad

O medicamento começou a ser desenvolvido há 13 anos pela Unicamp. O objetivo principal é o de estimular o sistema imunológico do corpo para que possa combater doenças infecciosas e tumores. Ele é composto por uma nanopartícula, totalmente sintética, que consegue fazer com que o organismo desenvolva uma resposta imune de células T.

Em um primeiro momento, em que vários testes foram realizados, a segurança do fármaco foi comprovada. Agora, os responsáveis por sua criação buscam comprovação de eficácia contra o câncer de bexiga – condição compartilhada entre os infectados pelo coronavírus já citados.

Inicialmente, o medicamento estava sendo ministrado em 30 pacientes. Com a chegada da pandemia, os pesquisadores identificaram que, mesmo mantendo contato com pessoas infectadas, eles não apresentaram sintomas graves de infecção, mesmo fazendo parte do grupo de risco.

A ideia de o medicamento ser eficaz contra o novo coronavírus começou a ser analisada com mais cuidado após estudos internacionais começarem a indicar que o vírus inibia a capacidade do organismo humano de produzir o interferon, proteína produzida para inibir a replicação de vírus e bactérias.

“Ao que parece, quando as células do pulmão são infectadas pelo novo coronavírus tem início uma tempestade de citocinas que inibe a ação das células T produtoras de interferon. E o OncoTherad é justamente um ativador da produção de interferon”, explica Fávaro.

Estudo de eficácia

Mesmo com os resultados positivos, o medicamento ainda deve passar por outros testes. De acordo com o pesquisador, também é necessário verificar a aplicação do fármaco em pacientes com outros quadros da doença, independentemente de realizarem acompanhamento oncológico.

Atualmente, um estudo com 140 participantes, com duração prevista de um ano, tramita na Comissão de Ética em Pesquisa (Conep). O principal medicamento do teste é o OncoTherad, associado ao tratamento clínico padrão contra a doença.

Caso sejam comprovados, os resultados podem ajudar a diminuir os custos por uso de UTIs no SUS. Além disso, mais pacientes podem ser tratados. “À medida que se reduz a necessidade de ventilação mecânica, amplia-se o número de pacientes graves que podem ser tratados com sucesso”, finaliza Fávaro.

Via: Agência Fapesp

Luiz Nogueira
Editor(a)

Luiz Nogueira é editor(a) no Olhar Digital