Ao longo do fim de semana, o quadro de saúde de Donald Trump foi monitorado pelo mundo inteiro, incluindo também o tratamento que ele recebeu durante os últimos dias, que fornece algumas informações interessantes sobre a situação do presidente dos Estados Unidos diante da Covid-19.
Primeiro de tudo, chamou a atenção que Trump não usou cloroquina ou hidroxicloroquina durante o tratamento, medicamento que já perdeu a autorização emergencial de uso nos Estados Unidos. No lugar, a equipe médica do presidente americano recorreu a alternativas experimentais novas ou a medicamentos de difícil acesso, que demorarão bastante a estarem disponíveis para serem disponibilizados para um grande público.
Conheça os tratamentos:
Anticorpos monoclonais
Aqui, a equipe médica de Donald Trump optou por seguir adiante com um tratamento novo e não-comprovado, apesar de alguns resultados promissores. O coquetel desenvolvido pela Regeneron visa inserir diretamente na corrente sanguínea anticorpos que anulam o vírus, mesmo se o sistema imunológico ainda não foi capaz de produzi-los.
É uma terapia que produziu alguns resultados promissores. Como nota a revista Science, há estudos demonstrando que a técnica funcionou em camundongos e macacos. Além disso, a Regeneron revelou dados preliminares animadores de seus experimentos com seres humanos, apontando redução de carga viral e tempo de sintomas nos pacientes tratados com o medicamento. Os pacientes no grupo placebo também precisaram mais frequentemente de ir ao médico, indicando que a terapia pode ser eficaz em evitar o desenvolvimento de formas severas. Até o momento, porém, a empresa não publicou os dados em forma de artigo para revisão.
A terapia de Trump usa uma combinação de dois anticorpos que tentam anular a ação do coronavírus, impedindo que a proteína “Spike” se ligue aos receptores das células humanas, permitindo sua reprodução. Um dos anticorpos tem origem em outra pessoa, produzido a partir de linfócitos B, a célula responsável pela produção dos anticorpos, de alguém que contraiu Covid-19 e se curou; já o outro foi coletado a partir de um camundongo que foi geneticamente alterado para desenvolver um sistema imunológico similar ao de seres humanos. O animal recebeu a proteína viral e produziu os anticorpos, que são então injetados no corpo humano para combater a infecção.
Pode não ter ficado evidente, mas mesmo que essa terapia se prove eficaz, será bastante difícil levá-la às massas. Os anticorpos não são produzidos sinteticamente e dependem de organismos vivos, o que faz desse tratamento algo caríssimo e escasso. A Regeneron tem um acordo de fornecimento do seu medicamento com o governo dos Estados Unidos que prevê o fornecimento de até 300 mil doses para tratamento da Covid-19 por nada menos que US$ 450 milhões, ou US$ 1.500 por dose.
Remdesivir
O remdesivir é um dos poucos medicamentos que passou por testes clínicos e teve algum resultado positivo confirmado, ainda que modesto. O antiviral da farmacêutica Gilead Sciences foi originalmente projetado para combater o vírus da Hepatite C, mas sem grande sucesso. Foi testado também contra vários outros vírus, incluindo o Ebola, após resultados animadores in vitro e em animais, mas foi com a Covid-19 que ele encontrou algum sucesso.
É um sucesso pequeno, no entanto. O medicamento visa inibir uma enzima viral necessária para a replicação, e os experimentos mostraram uma redução no tempo médio de internação, de 15 para 11 dias. Não foi observada uma redução de mortalidade no experimento de maio que baseou a autorização emergencial de uso emitida pela FDA, agência equivalente à Anvisa nos Estados Unidos. O país também passou a usar a droga para casos leves e moderados, embora não haja eficácia confirmada para esses casos.
Apesar de o estudo inicialmente não ter demonstrado redução de mortalidade inicialmente, a Giled liberou posteriormente, em julho, novos dados que o medicamento poderia, sim, ajudar alguns dos pacientes em condições mais graves e reduzir as mortes.
Mas quanto custa o remdesivir? É outro medicamento que você não verá sendo distribuído em grande escala em um futuro próximo. A Gilead colocou um preço não muito amigável em seu produto: US$ 520 por dose nos Estados Unidos para pacientes com seguro saúde; considerando que o tratamento recomendado utiliza seis doses por cinco dias (duas doses no primeiro dia), o preço do tratamento é de US$ 3.120. Para outros países, a dose custa US$ 390, totalizando US$ 2.340 pelos cinco dias.
Corticoides
A dexametasona é um corticoide que também demonstrou resultados muito bons em ensaios clínicos, mas o seu uso entrega que talvez as condições de Trump não tenham sido tão tranquilas como sua equipe médica divulgou.
O medicamento foi um dos poucos que demonstrou efeito claro na redução da mortalidade de casos graves de Covid-19, mas ele tem ação imunossupressora. Ele atua modulando as tempestades de citocinas, uma reação exagerada do organismo à infecção que pode agravar a doença em vez de combatê-la e é uma das causas comuns de mortes ligadas à Covid-19. O uso do medicamento no momento errado, enquanto a doença ainda não desenvolveu severidade, pode ter efeito oposto ao desejado, enfraquecendo o sistema imunológico e tornando-o menos capaz de combater o coronavírus.
Ao contrário do remdesivir e dos anticorpos, a dexametasona é um medicamento muito barato, que pode ser encontrado até mesmo no Brasil.