Para tentar responder questões em aberto sobre o novo coronavírus, cientistas de diferentes instituições da China, dentre elas a Universidade de Hong Kong, criaram um estudo que testou a capacidade da doença em se espalhar por ambientes fechados.

A conclusão dos pesquisadores foi de que a transmissão pode acontecer através do ar, por meio de partículas suspensas, principalmente em lugares em que as condições de ventilação são precárias e há muitas pessoas aglomeradas.

A prévia do trabalho de pesquisa, publicada no portal medRxiv, confirmou que clientes de um restaurante de Guangzhou, cidade portuária a noroeste de Hong Kong, foram infectados pelo novo coronavírus sem a necessidade de contato com outros indivíduos ou superfícies.

De acordo com os resultados, a fala de um infectado pelo vírus dentro do ambiente fechado e mal ventilado foi o fator responsável por disseminar a doença no local. As partículas expelidas por ele acabaram circulando no ar através de um fluxo criado por um aparelho de ar-condicionado.

Objeto de estudo

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O acontecimento estudado pelos pesquisadores aconteceu em 24 de janeiro, durante as festividades do Ano Novo Chinês. O resultado do episódio foi que dez pessoas foram infectadas dentro do restaurante. Todas elas membros de três famílias diferentes.

Os indivíduos foram contaminados por apenas um indivíduo, que contraiu o novo coronavírus após uma viagem à Wuhan, epicentro inicial da doença. No entanto, a pessoa doente era assintomática, por isso, não sabia que estava infectada.

A possibilidade de transmissão do vírus sem contato físico já havia sido levantada em outro estudo recente. A ideia, no entanto, ganha mais força por conta do estudo atual, em que os cientistas simularam a situação de contágio do restaurante.

Reconstituição

Para entender como a situação ocorreu, durante dois dias, 19 e 20 de março, os pesquisadores foram ao restaurante em questão e recriaram a cena de contágio. Todo o processo foi possível graças aos relatos de agentes de saúde e diversas outras informações, como imagens de câmeras de segurança, plantas arquitetônicas do local e até dados meteorológicos.

A conclusão foi de que as três famílias, que estavam sentadas em uma fileira única, compartilharam o mesmo fluxo de ventilação estabelecida por um ar-condicionado localizado no terceiro andar do restaurante, local em que estavam.

Para entender o fluxo percorrido pelas partículas, os especialistas propagaram no ar um gás marcador com características semelhantes às partículas do vírus. Com isso, foi possível definir o caminho da infecção.

Disposição das mesas

No dia do ocorrido, a pessoa infectada se sentou em uma mesa distante do aparelho, reunida com quatro parentes. Entre o local onde o portador do vírus estava sentado e o ar-condicionado, haviam outras duas mesas ocupadas por dois grupos familiares.

Na família do infectado, as quatro pessoas presentes tiveram teste positivo para a doença nas semanas posteriores. Na segunda família, sentada na mesa ao lado, três dos quatro membros presentes foram contaminados. No caso da terceira família, a que estava mais perto do ar-condicionado – e mais longe da pessoa contaminada -, dois dos sete membros que estavam no local foram acometidos pela doença.

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Curiosamente, os outros 193 clientes e 57 funcionários presentes no local, espalhados por todos os cinco andares do restaurante, não foram afetados na ocasião. O contágio ficou restrito às três famílias que foram ventiladas pelo mesmo aparelho.

Como observado pelos pesquisadores com o uso do gás marcador, as partículas foram transportadas para outros aparelhos e se espalharam pelo local, mas isso se deu em menor escala. Fazendo com que as gotículas ficassem quase que exclusivamente em uma única área.

Ventilação natural

Como conclusão, os responsáveis pelo estudo definiram que não só o fluxo criado pelo ar-condicionado foi o responsável pelo contágio, mas também a falta de ventilação natural. Embora as três mesas ficassem próximas a uma janela, ela estava fechada.

O local também conta com exaustores para circulação de ar, localizados nas paredes do estabelecimento, no entanto, eles estavam desligados. As únicas fontes de ar natural eram o exaustor localizado no banheiro e a porta de entrada. No entanto, ambos não foram suficientes para impedir a disseminação dessas partículas pelo equipamento.

Por isso, os cientistas alertam para os riscos de contágio em locais fechados, com aglomeração de pessoas e mal ventilados. Porém, os pesquisadores indicam que os resultados “não mostram que a transmissão de aerossóis do Sars-Cov-2 pode ocorrer em qualquer espaço fechado, mas que essa transmissão pode sim acontecer em locais mal ventilados”.

Como recomendação, os especialistas apontam que as medidas restritivas contra aglomerações sejam mantidas. Além de que os estabelecimentos que continuam funcionando, pois, são considerados essenciais, redobrem a atenção com a ventilação de seus espaços.

Via: O Globo