Com quase três milhões de pessoas infectadas pelo coronavírus no Brasil, o CFM (Conselho Federal de Medicina) apresentou um dado positivo referente ao tratamento contra o vírus: a oferta de leitos de UTI no país aumentou 47% na pandemia. O problema, no entanto, é a desigualdade na proporção dos leitos entre a rede pública e privada, sem contar que o serviço se concentra apenas nas regiões metropolitanas dos estados.

Baseado em dados do Ministério da Saúde, o levantamento do CFM aponta que o total de leitos (públicos e privados) subiu de 45.427 em janeiro para 66.786 em junho deste ano, muito em função da abertura de leitos temporários e exclusivos aos pacientes diagnosticados com a Covid-19.

O grande problema é a desigualdade encontrada na distribuição entre as redes públicas e privadas: dos 21.359 novos leitos de UTI abertos até junho, 9.006 estavam no SUS — sistema público de saúde —, enquanto 12.353 foram abertos em hospitais ligados à rede privada.

O dado ajuda a evidenciar a discrepância de financiamentos recebido pelas redes. “Quando o Estado não assume fortemente a política de saúde, acaba acontecendo uma lógica de mercado. Se formos calcular quanto se gasta em saúde no Brasil, cerca de metade fica com o SUS, que corresponde a 75% da população [de forma exclusiva], enquanto a outra [gasta metade] e tem 25%. Isso já mostra a disparidade”, afirma Donizetti Giamberardino, do CFM.

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Apesar de atender grande parte da população, SUS recebe apenas metade dos investimentos do Governo. Foto: Rômulo Serpa/Divulgação

Dificuldade de alcance do serviço

Apesar do crescimento de leitos de UTI, outro ponto negativo observado é um déficit no alcance do serviço. Quase metade dos leitos de UTI do Brasil estão localizados apenas nas capitais, e em alguns estados como Amazonas, Roraima e Amapá, a situação fica mais crítica, já que os leitos de terapia intensiva se encontram exclusivamente em suas metrópoles.

O episódio é um grande fator negativo para o combate contra a Covid-19, tendo em vista que as regiões interioranas estão contabilizando cada vez mais casos — após o vírus já ter contaminado as regiões metropolitanas.

“Se for pensar na dimensão territorial do Brasil e onde esses municípios estão, atingir [quase 100%] em cinco meses é rápido. No Amazonas, o vírus chegou até de barco, ou a tribos indígenas”, disse à Folha, Diego Xavier, da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).

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Apenas 14 estados do Brasil atendem o requisito mínimo de três leitos de UTI para cada 10 mil habitantes. Foto: Erasmo Salomão/Divulgação

Pandemia escancara falta de infraestrutura

O déficit de leitos de UTI no país já era um dos grandes impasses da saúde pública, antes mesmo da pandemia. Um dos parâmetros indicado pela Amib (Associação de Medicina Intensiva Brasileira) recomenda a existência de um a três leitos (no mínimo) para cada 10 mil habitantes. Contudo, apenas 12 estados do país atendem o requisito mínimo indicado.

O problema pode ficar ainda mais grave já que 20% dos novos leitos de UTI podem ser ser fechados por pertencerem à hospitais de campanha. Giamberardino reivindica que parte deles sejam incorporados. “Nos estados brasileiros que já têm mais carência de leitos, especialmente no Norte e Nordeste, é importante que esses leitos sejam mantidos”, diz.

Questionado pela Folha sobre a possibilidade de manutenção dos leitos, o ministério da Saúde disse que irá examinar a situação. “Estamos iniciando um estudo para verificar os municípios-polo que concentram as demandas das cidades. [A incorporação de leitos] Vai aumentar as despesas relativas ao SUS e isso deve ser conduzido de forma responsável para que haja sustentabilidade no decorrer do tempo”, afirmou o secretário-executivo da pasta, Élcio Franco.

Em nota divulgada, a pasta afirmou ter investido R$ 1,6 bilhão para conceder 11.353 leitos de UTI exclusivos para a Covid-19.

Via: Folha de S. Paulo