As opiniões de quase 100 milhões de usuários do Facebook em 37 países foram analisadas e transformadas em um mapa, codificado por cores. O tema dos comentários: vacinas. O resultado mostra as relações entre os defensores de vacinas, seus opositores e aqueles que se encontram em algum lugar no meio da discussão. E, segundo o mapa, as coisas não estão bem.

Na medicina, é comum o uso de metáforas de guerra. Algumas vezes, nenhuma outra metáfora se encaixa tão bem. Estamos enfrentando uma batalha real, com vidas em jogo, e se tem algo que esse mapa mostra é que pagaremos um preço alto.

Pesquisadores dos Estados Unidos aplicaram técnicas de análise de dados usadas geralmente na física teórica para criar a visualização, com o objetivo de apresentar de forma virtual o panorama das opiniões sobre vacinas nas mídias sociais. O resultado, publicado na revista Nature, é preocupante.

“Há uma nova guerra mundial online sobre confiança no conhecimento e na ciência da saúde, particularmente com desinformação sobre a Covid-19, mas também desconfiança em grandes produtos farmacêuticos e governos”, diz Neil Johnson, pesquisador da teoria da complexidade da Universidade George Washington, nos EUA. “Ninguém sabia como era o campo de batalha, então decidimos descobrir”.

Os emaranhados resultantes da pesquisa parecem complicados à primeira vista, mas a imagem representa apenas os limites entre as forças concorrentes e suas interações ao longo do ano de 2019.

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Gráfico mostrando os “campos de batalha” sobre vacinação nas redes sociais. Imagem: Neil Johnson

As comunidades online que representam grupos antivacina são exibidas no mapa como pontos vermelhos, dimensionados proporcionalmente de acordo com o número total de seguidores. Os defensores, por sua vez, são representados como pontos azuis, enquanto aqueles sem uma posição definida são os círculos verdes na imagem.

Com alguns momentos de análise do mapa, é fácil perceber um padrão. “Os azuis estão lutando no lugar errado, eles estão de lado e a atividade principal é em torno dos vermelhos, que estão absolutamente enredados em toda essa enorme quantidade de comunidades verdes”, explica Johnson.

Os pesquisadores usaram informações disponíveis publicamente em mais de mil páginas do Facebook para montar o mapa, entre fevereiro e outubro de 2019, com cada página representando um grupo de indivíduos que supostamente valorizam amplamente uma posição.

Observando a fundo a rede de nós, percebe-se que os vermelhos estão espalhados por todo o coração da área verde, formando mais conexões com os indecisos do que os azuis flutuando nas bordas.

Como forma de reforçar a crescente dessas comunidades contra a vacinação, as páginas antivacina no Facebook deram saltos durante o surto de sarampo do ano passado, algumas crescendo até 500%.

Porém, se algo serve de consolo para os defensores das vacinas, é que seu número relativamente menor de grupos compreende mais indivíduos, com 6,9 milhões de apoiadores, contra 4,2 milhões do lado contrário.

Mesmo assim, a diversidade de locais antivacinação e a atividade daqueles que avaliam suas opiniões são um alerta preocupante para a sociedade. O que parece um campo neutro passivo (em verde) é uma população dinâmica de pessoas buscando informações. Isso seria bom se não houvesse uma grande quantidade de vozes perigosas, esperando para fornecer uma resposta personalizada (com sua própria visão) para essa questão.

O projeto começou como uma maneira de entender melhor as interações online sobre vacinas quando a volta do sarampo era nossa maior preocupação. Porém, um ano depois, o mundo mudou e agora é abalado pela pandemia de Covid-19.

Convencer o número suficiente de pessoas de que o melhor para todos é a vacinação parece ser um desafio maior do que de fato encontrar a vacina contra o novo coronavírus. É uma meta que até a Organização Mundial da Saúde (OMS) vê com ressalvas. Embora as empresas por trás das redes sociais possam ser mais ativas na limitação do alcance dos grupos antivacinas, está ficando claro que mais atitudes precisam ser tomadas.

“Em vez de brincar com uma rede global de comunidades que consomem e produzem (des)informações, agências de saúde pública, plataformas de mídia social e governos podem usar um mapa como o nosso e um conjunto de estratégias totalmente novo”, afirma Johnson.

Chamar a luta contra a desinformação das vacinas de “uma batalha difícil” chega a ser um eufemismo. Trata-se de uma guerra pela saúde pública, e não estamos bem equipados para vencer. No entanto, considerando o que está em jogo, perder não é uma opção.

Via: ScienceAlert