Câmeras infravermelhas indicam febre, mas não impedem avanço da Covid-19

Tecnologia pode ser uma ferramenta útil no diagnóstico da doença, no entanto, não deve ser usada como solução para detectar ou descartar um caso
Rafael Rigues12/05/2020 13h18

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Com a pandemia de Covid-19, a demanda por câmeras e termômetros infravermelhos capazes de detectar pessoas com febre, um dos sintomas da doença, disparou. A fabricante de câmeras térmicas FLIR, por exemplo, viu suas vendas decolarem em meio à pandemia.

Nossos corpos emitem radiação infravermelha, que percebemos como calor. Em vez de registrar luz visível, como uma câmera comum, as câmeras térmicas registram a radiação infravermelha emitida por objetos à sua frente, criando um “mapa de calor” que mostra o quão quente, ou frio, está um objeto ou pessoa.

A ideia por trás das câmeras e termômetros é detectar pessoas com uma temperatura corporal acima de 37,8 °C, o que é considerado uma febre. Esses indivíduos seriam então encaminhados para um teste secundário de modo a detectar a Covid-19.

Entretanto, uma febre, ou ausência dela, não são garantia da presença ou ausência da Covid-19. Uma pessoa pode ter febre devido a outros motivos, como uma gripe comum, e outra pessoa infectada com a Covid-19 pode não apresentar sintoma algum, o chamado “paciente assintomático”, mas ainda assim disseminar a doença.

Segundo Hildegarde Schell-Chaple, professora de enfermagem na Universidade da Califórnia em San Francisco (UCSF), “as pessoas se sentem melhores se veem a checagem de temperatura acontecendo, mas é uma falsa sensação de segurança”, diz ela. “Não é nada que deveríamos estar fazendo”.

Falsa segurança

Uma análise dos últimos 15 anos de estudos sobre triagem em fronteiras internacionais, publicada no ano passado, mostrou que a busca por pessoas com sintomas como febre ou tosse foi ineficaz na detecção de casos em epidemias passadas, como a SARS, gripe suína e Ebola.

Jamie Lloyd-Smith, professor da Universidade da Califórnia em Los Angeles (UCLA) que estuda a disseminação de doenças infecciosas, afirma: “não dá pra esperar que uma triagem por febre ou sintomas seja uma medida à prova de falhas. A Covid-19 é capaz de se espalhar de forma bastante eficiente por pessoas que são difíceis de detectar desta forma”.

Lloyd-Smith publicou em fevereiro deste ano um estudo que analisa a eficácia da triagem por sintomas e fatores de risco ou contato, tendo como modelo a epidemia de Ebola no oeste da África entre 2014 e 2016. E concluiu que no caso da Covid-19, na melhor das hipóteses, este método deixaria de detectar metade dos infectados.

Reprodução

Câmeras térmicas mostram a temperatura dos objetos à sua frente

Um motivo é o período de incubação da doença, de 14 dias, durante o qual uma pessoa pode não apresentar sintomas, mas ainda assim transmitir o vírus. Há evidência de que até metade dos pacientes não mostra sintomas detectáveis por métodos de triagem, embora mais estudos sejam necessários. Além disso, uma febre pode ser “mascarada” com medicamentos comuns, como ibuprofeno.

Por fim, há a questão da precisão da tecnologia. Chris Bainter, Diretor de Desenvolvimento Global de Negócios na FLIR, afirma que sua tecnologia pode medir a temperatura de uma pessoa em 10 segundos, mas que sua implementação correta exige cuidado e calibração precisa.

Há uma possibilidade para erro mesmo em hospitais, que pode ser ainda maior em um restaurante, depósito ou igreja, locais que enfrentam a pressão de funcionar “como antes” e ainda assim mostrar que estão tomando medidas para evitar a disseminação de uma doença altamente contagiosa, contra a qual ninguém tem imunidade.

Fonte: Wired

Colunista

Rafael Rigues é colunista no Olhar Digital