As Golpistas, de Lorene Scafaria, tem sido comparado aos filmes de gangsters de Scorsese, principalmente a O Irlandês, comparação catalisada pelo estilo adotado na direção, scorseseano, em muitos momentos.
Longe de deixar o filme com o aspecto derivativo, contudo, Scafaria é bem habilidosa ao assumir essa filiação de estilo onde muitos outros falharam (Joe Carnahan em A Última Cartada e David O’Russell em Trapaça, por exemplo) e joga com a ideia de que as dançarinas respondem de seu modo a um mundo dominado pela objetificação da mulher e pela dominação do homem por meio do dinheiro, conquistado, muitas vezes, ás custas da miséria dos mortais que não participam das farras do mercado financeiro.
As personagens principais são Destiny (Constance Wu) e Ramona (Jennifer Lopes), mas são também importantes as outras duas que completam o quarteto que aparece com destaque no cartaz do filme: Annabelle (Lili Reinhart) e Mercedes (Keke Palmer). Elas contam com a cumplicidade de uma anfitriã chamada de Mãe (Mercedes Ruehl, que demoramos para reconhecer).
Entre as quatro, temos não só a questão da representatividade, mas também uma ideia sedutora para mentes masculina – quatro mulheres diferentes: a loira, a negra, a latina e a oriental. E os homens caem como patos no poder de sedução dessas golpistas, que se apropriam de parte do dinheiro acumulado por eles em transações milionárias e se vingam, assim, dessa gente inescrupulosa do mercado.
Acompanhamos a história conforme Destiny a conta para a jornalista Elizabeth (Julia Stiles), lembrando que o próprio filme é baseado num artigo jornalístico escrito por Jessica Presler, que Scafaria roteirizou.
Disso resulta um filme mais leve, sem a violência scorseseana, mas que cresce justamente nos momentos em que a direção utiliza o estilo do diretor de Cassino: câmeras se movimentando ligeiras pelos cenários, construção em planos-sequências, narração de uma personagem, alternância entre os tempos da narrativa, montagem que une duas situações diferentes num único plano, uso de câmera lenta com boa seleção musical (nesse sentido, a sequência com “Next”, cantada por Scott Walker, é sensacional).
Em outros aspectos, o filme cai. A festa de natal, por exemplo, com a troca de presentes, é muito longa. A maneira como Destiny cai no jogo da jornalista me pareceu muito fácil também, sem maiores dúvidas na hora de abrir o jogo. Por fim, o filme tudo talvez sofra de um olhar um tanto pudico, que enfraquece a trama por se contrapor ao ambiente de promiscuidade que elas pretendem criar para melhor roubar.
As Golpistas revela-se um filme sempre agradável, embora raramente alcance a densidade dos filmes de Scorsese. O que no fundo revela que a comparação não é lá muito justa, ou é pelo menos reducionista. Scafaria se utiliza do estilo de Scorsese, mas busca suas próprias questões dentro de um mundo globalizado e capitalista, em que a sede pelo poder, principalmente o poder de dominação das mulheres pelos homens, pode causar rombos nas faturas dos cartões destes últimos, que ainda se sentem envergonhados por terem sido enganados por mulheres.