Estudo realizado em 11 astronautas da ISS (Estação Espacial Internacional) revela que um fluido presente no crânio se redistribui durante o voo espacial, mas retorna à configuração normal após o retorno. A constatação é parte de pesquisa liderada por Steven Jillings, doutorando no Lab for Equilibrium Investigations and Aerospace (LEIA) da Universidade da Antuérpia, na Bélgica.

Os participantes do estudo, que na verdade eram cosmonautas do programa russo, foram examinados em ocasiões diferentes: antes de seus voos espaciais, nove dias depois do pouso e, posteriormente, de seis a sete meses após o retorno à Terra.

Como Jillings participou de trabalhos anteriores sobre cérebros de astronautas com o uso de um tipo padrão de ressonância magnética (RMN), neste novo trabalho foi utilizada uma tecnologia que envolveu uma série de imagens de ressonância magnética de difusão (dMRI). Isso permitiu um olhar mais aprofundado sobre a paisagem cerebral para ver os efeitos do voo espacial. 

 Steven Jillings/Ben Jeurissen/MRtrix3

Ilustração do cérebro cosmonauta que mostra maior concentração do fluido cefalorraquidiano na região inferior do cérebro. Imagem: Steven Jillings/Ben Jeurissen/MRtrix3

O cérebro na superfície terrestre

Na superfície da Terra, o material líquido é semelhante a um gel e responde à gravidade de maneiras que são importantes para o nosso funcionamento diário. Um lugar onde isso acontece é nos órgãos otolíticos (sáculo e o utrículo), uma parte do sistema vestibular.

Os otolíticos, encontrados dentro do ouvido interno, ajudam o cérebro a receber informações que lhe dizem como a cabeça é orientada. São feitos de estruturas minúsculas e cristalinas chamadas otoconia, que ficam planas em cima de um gel dentro da cavidade auditiva interna. 

Quando a cabeça faz um movimento como inclinar-se para baixo, a gravidade puxa os cristais de otoconia nessa direção através dos filamentos (cílios) dentro do ouvido interno, enviando um sinal ao cérebro que a cabeça inclinou.

O ambiente de uma estação espacial

Na microgravidade de uma estação espacial, não há atração gravitacional suficiente para dizer ao cérebro que a cabeça mudou de posição. Assim, os primeiros dias no espaço são desorientadores para os membros da tripulação espacial e a exposição prolongada a esse ambiente significa que eles precisarão de um período de reajuste à gravidade quando voltarem à Terra.

Jillings e sua equipe descobriram que, durante o voo espacial, o fluido ao redor do cérebro e da coluna não se move do jeito que se move na Terra. A pesquisa descobriu que os cosmonautas que haviam cumprido missões de seis meses na ISS experienciaram mudanças em seus cérebros e o fluido encontrado ao redor do cérebro e da coluna vertebral foi distribuído como resultado de estar em microgravidade. 

O fluido cefalorraquidiano é encontrado ao redor do cérebro e da medula espinhal. Além de amortecimento do cérebro, ele também ajuda a limpar os resíduos do órgão da mente. Nos cosmonautas monitorados durante o estudo, o líquido parecia ter se acumular perto da parte inferior do cérebro após um período no espaço. Mas os estudos mostraram que isso é temporário: exames de acompanhamento mostraram que os cérebros tinham voltado quase que totalmente para o estado natural.

 Reprodução / Nasa

A microgravidade redistribui os fluidos que envolvem cérebro e coluna vertical. Imagem: Reprodução / Nasa

O estudo confirmou as informações detectadas em estudos anteriores sobre a dilatação dos ventrículos, que são os responsáveis pela produção do fluido cefalorraquidiano. Outra constatação foi que, embora os ventrículos tenham encolhido entre os exames antes do voo e as avaliações de acompanhamento de sete meses, ainda havia mais fluido cefalorraquidiano dentro dos ventrículos de cosmonautas do que antes de irem para o espaço. 

Os pesquisadores viram que há, de fato, um dificultador da circulação normal desse fluido. E, embora não pareça afetar a pressão dentro do crânio, essa interrupção na circulação normal do fluido cefalorraquidiano pode ser porque, geralmente, alguns tripulantes experimentam visão embaçada durante e após o voo espacial. 

O uso de diferentes técnicas de ressonância magnética em pesquisas sobre o cérebro poderia ajudar os cientistas a obterem ainda mais informações a respeito do efeito do espaço e se o voo espacial causa ou não alguma mudança estrutural no órgão. 

O estudo de Jillings foi financiado pela Agência Espacial Europeia e é uma colaboração com o Instituto de Pesquisas Biomédicas da Academia Russa de Ciências. 

Fonte: Space.com