Assim como o corpo dos astronautas que voltam da Estação Espacial Internacional depois de uma temporada apresentam diversas mudanças, a fauna de microrganismos que habita dentro dele também sofrem alterações bem específicas. Novos estudos mostram, por exemplo, que é possível determinar quando um membro da tripulação chegou e partiu, apenas analisando os micróbios deixados para trás na ISS.
Essas pesquisas analisam como as viagens espaciais afetam o microbioma humano – desde as bactérias intestinais até os microrganismos da pele – e como esses seres microscópicos, por sua vez, afetam a espaçonave. Tripulantes que permaneceram na ISS entre seis e 12 meses, por exemplo, possuem microbiomas intestinais mais diversos no espaço do que teriam na Terra.
“Existe uma interação entre a comunidade microbiana da estação espacial e sua tripulação, e o entendimento dos detalhes dessa relação é importante para evitar complicações para a saúde ou para naves espaciais em missões mais longas”, explica a bióloga do Laboratório Nacional Lawrence Livermore, Crystal Jaing, principal autora do estudo.
O astronauta Jack Fischer coleta uma amostra do teto da Estação Espacial Internacional para o estudo. Imagem: Nasa
Um astronauta participou dessa pesquisa fornecendo amostras de antes, durante e depois do voo espacial. Também foram coletadas (após a partida do astronauta) amostras de oito locais diferentes a bordo da ISS, como a mesa de jantar, o banheiro e os quartos da tripulação.
As populações microbianas coletadas na pele do astronauta se assemelham mais às encontradas nas superfícies da ISS, e apareceram – em menor grau – nas amostras colhidas quatro meses depois que ele deixou a estação espacial. ” Estamos acostumados a medir a passagem do tempo com calendários, mas as transições de microbiomas contam essencialmente a mesma história”, explica David J. Smith, coautor do estudo.
As amostras de saliva do astronauta apresentaram outros resultados interessantes. A diversidade de espécies encontradas lá diminuiu no espaço e se recuperou após o retorno à Terra. Por outro lado, os microbiomas intestinais se tornaram mais diversos no espaço – apesar da exposição limitada a novas bactérias. Esse resultado é importante porque uma maior diversidade indica uma boa saúde no organismo.
“Como a estação é um ambiente muito limpo, esperávamos menor diversidade de microrganismos em comparação com a coleta prévia, porque os astronautas estão menos expostos a bactérias ambientais. Embora a comida que eles comem não seja estéril, ela possui uma carga bacteriana muito baixa”, afirma pesquisador do Departamento de Doenças Infecciosas do Instituto J. Craig Venter, Hernan Lorenzi.
“Geralmente, quando alguém tem uma doença como a doença inflamatória intestinal, você vê uma redução na diversidade do microbioma intestinal. Maior diversidade geralmente indica maior resistência a doenças”, completa o pesquisador.
O kit de coleta dobrável contendo amostras de microbiomas antes de ser armazenado na ISS. Imagem: Nasa
Esse aumento da diversidade no microbioma intestinal pode ser resultado da grande variedade de alimentos disponíveis na estação. A Nasa fornece mais de 200 opções de refeições para garantir que os membros da tripulação tenham a oportunidade de consumir diversos alimentos, talvez até mais do que muitas pessoas normalmente comem na Terra.
Os estudos podem ajudar a entender como espaços internos e a saúde humana se sobrepõem. O isolamento da Estação Espacial propicia um ambiente ideal para estudar a chegada, circulação e transmissão de microrganismos. Portanto, entender melhor as interações entre astronautas e micróbios pode beneficiar pessoas em habitats relativamente fechados na Terra – seja em nossas casas ou hospitais, ou a bordo de aeronaves, metrôs ou até submarinos.