Decisão judicial pode entregar o DNA de milhões de pessoas à polícia

Juíza da Flórida dá à polícia acesso a 1,3 milhões de perfis genéticos armazenados no site GEDmatch. Especialistas temem que isso abra precedente para acesso a bancos de dados muito maiores
Rafael Rigues12/11/2019 14h11

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Nos EUA, serviços que analisam o perfil genético de uma pessoa não são incomuns. Os maiores do setor são o Ancestry, 23andMe e GEDmatch, com 15 milhões, 10 milhões e 1,3 milhões de usuários, respectivamente. Obviamente estes bancos de dados são de interesse da polícia, já que poderiam ser usados para encontrar suspeitos e elucidar crimes até agora sem solução. E uma decisão de uma juíza na Flórida pode ter dado à polícia acesso sem precedentes a todas estas informações, sem a necessidade de consentimento dos usuários.

Tudo começou em abril de 2018, quando a polícia da Califórnia usou dados do GEDmatch para encontrar um assassino em série conhecido como o “Golden State Killer”, autor de uma série de assassinatos e estupros que estavam sem solução desde 1974. Citando preocupação com a privacidade, em maio deste ano o site mudou suas políticas e tornou privados todos os registros de DNA em seu banco de dados, a não ser que os usuários dessem seu consentimento para compartilhar estes dados com a polícia.

O Detetive Michael Fields havia usado anteriormente informações do GEDMatch para resolver um caso, e esperava que o serviço pudesse ajudar novamente com um novo caso que estava investigando em julho. Para isso, pediu à Juíza Patricia Strowbridge, da Flórida, que lhe desse um mandato autorizando o acesso às informações, apesar da nova política do site. E foi atendido.

A questão é que em vez de autorizar o acesso a dados específicos no site, como perfis com características similares às do suspeito, a decisão da juíza dá à polícia acesso às informações de todos os usuários do site, mesmo os que não tem qualquer possibilidade de envolvimento no caso.

Segundo especialistas ouvidos pelo New York Times, esta é primeira vez em que um juiz aprovou um acesso tão amplo a informações de DNA. De acordo com Erin Murphy, professora de direito na Universidade de Nova York, “isso muda completamente o jogo”.

“A empresa tomou a decisão de se afastar das forças da lei, mas a corte passou por cima disso. É um sinal de que nenhuma informação genética está à salvo”.

Ao dar um mandato ao detetive, a juíza abriu um precedente que dá à polícia a chance de fazer buscas no DNA de dezenas de milhares de pessoas, quer elas dêem seu consentimento ou não.

“Não tenho dúvidas que se o público não se mostrar ultrajado com isto, as forças de segurança irão atrás do prato principal: a base de dados com 15 milhões de usuários da Ancestry”. Disse Murphy. “Porque se contentar com um aperitivo quando você pode acessar o banquete?”.

Por um lado, se o acesso aos bancos de dados tirar criminosos da rua, isso é obviamente uma coisa boa. Mas as informações nos bancos de dados de DNA nem sempre são precisas, o que significa que seu uso pela polícia pode resultar em prisões ou condenações injustas.

Depois, há os problemas de privacidade a serem considerados. Se houver evidências de que os dados de um único usuário em um site de DNA possam ajudar a resolver um crime, pode fazer sentido para um juiz conceder um mandado para esses dados. Mas um mandado que dá às autoridades policiais acesso a todos os dados em um site? Isso pode ser um pesadelo de privacidade.

Fonte: Futurism

Colunista

Rafael Rigues é colunista no Olhar Digital