O que muda com a lei de proteção de dados brasileira aprovada por Temer

Redação11/07/2018 15h23, atualizada em 14/08/2018 19h30

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Foi aprovada por Michel Temer, nesta terça-feira, o PLC 53/2018 que estabelece a lei geral de proteção de dados (LGPD) brasileira. Com a assinatura do presidente, as empresas que processam dados no Brasil terão 18 meses para se adaptar à lei. Mas você sabe o que muda com ela?

De forma resumida, a legislação nacional vai exigir que as companhias mudem a forma como lidam com as informações de seus usuários. “A LGPD estabelece três figuras principais durante o tratamento de dados: o titular, o controlar e o operador”, explicou Vanessa Lerner, advogado especialista em direito digital da Dias Carneiro Advogados. “Em sua essência, a lei não é nada mais do que um conjunto de direitos e obrigações dessas três partes em diferentes momentos, que gera uma rede capaz de proteger a privacidade e a autodeterminação dos titulares de dados pessoas no Brasil.”

Patrícia Peck, também advogada especialista em direito digital, resumiu as mudanças: as companhias precisarão de consentimento das pessoas antes de poderem mexer com seus dados, terão que fazer de forma transparente e serão obrigadas a garantir a segurança de tudo que armazenam e processam.

Quer saber mais? Reunimos abaixo alguns dos pontos principais tratados pela lei para você entender melhor o que ela significa.

Veja vídeo com as mudanças da lei de dados na prática:

Definição de dados pessoais: O texto define como dado pessoal “qualquer informação relacionada à pessoa natural identificada ou identificável”. Sobre dados sensíveis, no entanto, a lei é bem mais específica, e inclui na conta origem racial ou étnica, convicções religiosas, opiniões políticas, informações genéticas ou biométricas, entre outros pontos.

Consentimento dos usuários: A legislação também é precisa aqui. Consentimento é a “manifestação livre, informada e inequívoca pela qual o titular concorda com o tratamento de seus dados pessoais para uma finalidade determinada”. As empresas também precisam deixar clara a finalidade (“realização do tratamento para propósitos legítimos, específicos, explícitos e informados”) do uso dos dados e limitar o uso das informações a esse fim.

Transparência: O consentimento citado acima deverá vir por meio daqueles já conhecidos termos de uso, é claro. Mas a lei obriga que as empresas sejam claras em seus textos e específicas na hora de definir a finalidade do uso. “O consentimento deverá referir-se a finalidades determinadas e serão nulas as autorizações genéricas para o tratamento de dados pessoais”, diz a legislação.

O texto também visa garantir que o titular dos dados possa acessar facilmente as informações que as empresas têm sobre ele — e que possa revogar sem dificuldades o consentimento sobre o uso das informações. A medida pode afetar bastante empresas que lidam com muitos dados, como as de big data. Samanta Oliveira, Legal Counsel da Neoway, disse ao Olhar Digital que, em situações assim, os pedidos deverão analisados “caso a caso” pelas companhias.

Responsabilidade sobre os dados: O “titular” dos dados mencionado acima é a pessoa a que os dados se referem, como especifica a legislação. Já os responsáveis são, como explica Peck, “a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privada que realizada decisões sobre o tratamento de dados” — basicamente, as empresas. Mas há uma divisão: o “responsável” propriamente dito decide como vai ser feito o tratamento, enquanto o “operador” realiza o tratamento dos dados. Ambos, no entanto, são responsáveis pela segurança das informações.

Segurança: Falando no tema, o artigo 46 da lei é categórico (e um pouco longo): “os agentes de tratamento devem adotar medidas de segurança, técnicas e administrativas aptas a proteger os dados pessoais de acessos não autorizados e de situações acidentais ou ilícitas de destruição, perda, alteração, comunicação ou qualquer forma de tratamento inadequado”. É algo que muitas das marcas que lidam com dados já precisam fazer graças à implantação do GDPR europeu — caso da Neoway mencionada acima, do Google e do Facebook, por exemplo.

Ainda assim, isso vale para qualquer empresas que entrar no meio do tratamento e também obriga as companhias a informar abertamente (e rápido) quando houver um problema. É algo que muitas já precisam fazer pelo bem dos consumidores, mas que nem todas fazem direito. Com a lei de proteção de dados, isso deverá ser mais facilmente punível.

Alteração e exclusão: Além do cenário mencionado no tópico “Transparência” acima, o PLC também destaca que os usuários têm todo o direito de alterar e excluir os dados que as empresas têm sobre eles. Quer dizer, exceto em casos, como destaca Peck, como quando as informações têm fins fiscais ou é usada por estudos de órgãos de pesquisa (desde que seja garantida a anonimização, claro). O tratamento de dados pessoas também será terminado caso a finalidade seja alcançada, o período de tratamento chegue ao fim, as informações deixem ser necessárias ou o órgão regulador solicite.

Sanções: Quatro artigos definem as punições às empresas que descumprirem as regras, que vão de um advertência a multas diárias de até 2% do faturamento da companhia (com limite de 50 milhões de reais no total por infração).

E a Autoridade Nacional?

O órgão regulador que ficaria responsável pela aplicação da legislação, a ANPD, acabou ficando de fora do texto aprovado por Michel Temer. O governo o considerou inconstitucional, por ser uma despesa para o poder executivo criada pelo poder legislativo. Um novo projeto de lei, separado, deve entrar em tramitação para resolver essa questão.

O veto já era previsto, mas não deixa de gerar uma lacuna na nova lei. “É fundamental ter uma autoridade nacional independente, com meios de alcançar a eficiência e sustentabilidade”, disse a advogada Peck, em comunicado.

Para a advogada Lerner, a remoção do órgão regulador gera incerteza na aplicação de uma série de artigos da lei que fazem referência ou dependem de regulações. “Em suma, a remoção da ANPD da lei, se não for suprida, pode implicar no desequilíbrio das relações instituídas, tendo o potencial de gerar dificuldades em relação ao cumprimento e fiscalização da lei”, disse Lerner ao Olhar Digital.

O Comitê Gestor da Internet do Brasil (CGI.br) também ressaltou, em carta aberta, a importância da ANPD, considerando a fundação da autoridade um “requisito sine qua non [indispensável] de eficácia da legislação recém-adotada”.

A sanção sem a criação da Autoridade Nacional ainda afeta a criação de um Conselho Nacional que também era previsto no projeto original. O órgão, que ficaria sob a tutela do ANPD, também era muito importante na visão do CGI.br, pois seria uma “composição multissetorial” deliberando as “diretrizes estratégias para orientar a Política Nacional de Proteção de Dados Pessoas e da Privacidade no país”.

Colaboração para o Olhar Digital

Redação é colaboração para o olhar digital no Olhar Digital