Os líderes empenhados em que as empresas sob seu comando sobrevivam nos próximos cinco anos precisarão assumir seu verdadeiro papel de comandantes de revolução. Terão que preparar-se para enfrentar a natural resistência a mudanças – por parte deles mesmos e de suas equipes. Além de assegurar produção e entregas de claro valor para os clientes, rentáveis e em volumes crescentes, terão que liderar a revolução digital de seus negócios. Serão obrigados a operar profundas transformações para fazer de suas empresas plataformas que jogam e vencem na nova arena da economia digital.

Há dois meses, entrevistamos uma amostra representativa desses líderes para uma pesquisa conduzida por nossa consultoria. Pois bem, pode parecer surpreendente, mas muitos não veem a competência em gestão de mudanças como uma arma estratégica. Há até mesmo uma certa confusão nos discursos desses dirigentes quando se referem à revolução e adotam os termos que vieram com ela: digitalização, transformação digital e inovação radical digital. Não custa voltar a esclarecer. Digitalizar significa converter informação analógica em digital ou transformar processos manuais em digitais. Em outras palavras, transformar páginas em bites. Substituir formulários manuais por eletrônicos que alimentem diretamente bancos de dados, por exemplo. E, sinceramente, não dá sequer para dizer que isso seja inovação.

Transformação digital é outra conversa; ocorre quando se consegue criar níveis notavelmente mais elevados de valor para o cliente por meio da aplicação de tecnologias digitais mais avançadas, utilizando informações digitais. No caso da transformação digital, há mudanças nos processos centrais e nas bases do negócio. Já a inovação radical digital baseia-se em reconceber do zero o negócio, com foco em uma proposta de valor superior e diferenciada, processando mudanças radicais (que modificam a raiz) do modelo; muitas vezes, isso se dá graças ao uso de tecnologias. É justamente essa a revolução que os CEOs terão que liderar pessoalmente. Sim, eles mesmos, já que, para que se avance nesse campo, será preciso assumir riscos, e as equipes nem sempre estão dispostas a colocar suas cabeças na guilhotina da inovação radical.

O verbo a conjugar nesse tipo de mudanças é transcender. Transcender as fronteiras da empresa realizando alianças; transcender os limites do setor pensando em propostas de valor híbridas que combinem ofertas de dentro e de fora dos segmentos; enfim, pular as cercas.

A experiência brasileira com o uso de táxis nos últimos anos é um exemplo clássico da diferença entre os três conceitos. Primeiro houve uma digitalização, com as cooperativas migrando para os celulares; na sequência, a transformação digital se deu com o surgimento da Uber e a criação de um novo modelo de negócio. Por fim, uma possível inovação radical digital poderia vir com a Uber gratuita, no qual o cliente possa viajar sem pagar; em troca, porém, teria que assistir o tempo todo a propagandas em uma grande tela à sua frente, ou mesmo descarregar bases de dados pessoais em um banco de big data por meio de um sistema de bordo, transcendendo do mundo da mobilidade para o da propaganda. Aliás, transcender era uma receita que já funcionava muito antes do digital. O sucesso do Cirque du Soleil foi atribuído ao fato de não ser circo, não ser musical, não ser teatro e ser tudo isso ao mesmo tempo.

Outra preocupação foi constatar nos CEOs a falta de clareza em torno do que, de fato, precisa ser feito para levar a empresa a uma realidade de inovação radical digital. Por onde começar? Como alavancar exponencialmente a performance, a produtividade e, em especial, a geração de valor percebida pelos clientes? A revolução exigirá deles conhecimentos de novas tecnologias, design centrado na experiência do cliente, identificação rápida de tendências e técnicas ágeis de gestão, entre outras competências. Acreditamos na construção de três pilares para alcançar a inovação radical digital:

1) Deslocar o foco do produto e dos serviços para a experiência que o cliente vivenciará ao longo de toda a jornada, de modo a criar real valor para ele.

2) Identificar parceiros estratégicos e estar realmente disposto a construir sólidas conexões com quem tiver as competências necessárias para permitir à sua empresa conjugar o verbo transcender.

3) Trabalhar para valer a cultura organizacional. Nada acontecerá se a revolução não se estender aos valores organizacionais e às atitudes a eles alinhadas. Como disse o CEO da Microsoft, Satya Nadella: “Mudança de cultura não é uma abstração. É realmente avançar no caminho”.

Será preciso, portanto, ter coragem para romper com o status quo. Um de nossos clientes criou o termo “vacatons”, uma paródia do conceito de hackatons para designar ciclos em determinado período do mês em que se dedicarão a selecionar e matar “vacas sagradas” (nome que deram às crenças anti-inovadoras) e, assim, trabalhar as atitudes que devem ser substituídas ou incentivadas. A boa notícia é que temos tido sucesso com nossos programas MCAV, sigla para Mudança Cultural em Alta Velocidade. Cultura muda, sim! Basta querer e trabalhar com esse foco. Bom trabalho!