Para cada vídeo do tiroteio em massa na Nova Zelândia que o YouTube e o Facebook bloqueiam, outros dois ou três aparecem. O país foi palco, hoje (15), de uma agressão terrorista: um atirador atacou muçulmanos em uma mesquita e transmitiu as cenas ao vivo pelo Facebook. A rede social removeu o vídeo e excluiu a conta do criminoso, mas isso não impediu que o conteúdo se espalhasse.
Depois de retirado do Facebook, o vídeo de aproximadamente 17 minutos foi enviado para o YouTube várias vezes, com poucos minutos de intervalo. A plataforma incentiva os usuários a sinalizarem os vídeos do ataque e alega estar removendo milhares de gravações relacionadas nas últimas horas.
“Conteúdo chocante, violento e gráfico não tem lugar em nossas plataformas. Empregamos nossa tecnologia e nossos recursos humanos para revisar e remover rapidamente todo e qualquer conteúdo violento do YouTube”, disse um porta-voz do Google em um comunicado. “Como em qualquer grande tragédia, trabalhamos em cooperação com as autoridades.”
O serviço usa algoritmos, como Content ID, que detectam automaticamente quando materiais com direitos autorais, como músicas e filmes, são carregados em sua plataforma. Quando o uso indevido do conteúdo é identificado, ele é removido imediatamente. O Google não especificou se usou essas ferramentas para controlar a disseminação do vídeo da Nova Zelândia.
A empresa diz que usou tecnologia de detecção inteligente para remover os clipes, mas não dá detalhes. A busca por vídeos violentos ressalta a dificuldade das empresas de mídia social para detectá-los e removê-los. A prática virou rotina: vídeos de tragédias se espalham pela web, mesmo que especialistas e detentores de tecnologia tentem expurgá-los.
Críticos apontam que o atirador da Nova Zelândia conseguiu transmitir a violência por mais de 15 minutos antes que o Facebook desativasse sua live. “Isso é totalmente inaceitável”, diz Farhana Khera, diretora da Muslim Advocates. “As empresas de tecnologia devem tomar todas as medidas possíveis para evitar que isso aconteça novamente.”
Denúncias ajudam nas buscas
O Facebook diz que continua a procurar por postagens do vídeo na rede social, com base em denúncias e com o uso de ferramentas de tecnologia. “A Polícia da Nova Zelândia nos alertou sobre o vídeo logo após o início da transmissão e removemos rapidamente as contas do Facebook e do Instagram, e o vídeo”, informa Mia Garlick, porta-voz do Facebook Nova Zelândia. “Também estamos removendo qualquer elogio ou apoio ao crime e aos atiradores assim que temos conhecimento.”
Gigantes da tecnologia, como Facebook e Google, têm autonomia para remover vídeos extremistas. As ações foram muito efetivas no passado. Em 2016, o The Guardian informou que as companhias de Mark Zuckerberg usaram algoritmos semelhantes ao Content ID para retirar vídeos vinculados ao ISIS automaticamente. A tecnologia procura por vídeos que foram sinalizados como violações e, depois, os bloqueia sem exigir revisão humana — ou seja, é um processo rápido.
O atirador da Nova Zelândia, além de fazer a transmissão ao vivo, publicou um manifesto em sua conta na rede social e no 8Chan (fórum de mensagens). A intenção foi justamente viralizar o assassinato em massa. No texto, ele fez referência a itens da cultura pop, como os jogos “Fortnite” e “Spyro the Dragon”, e o popular YouTuber PewDiePie. Como esses termos são extremamente populares na internet, usá-los aumenta o potencial de viralização.
Enquanto vídeos do tiroteio continuam a surgir, os especialistas temem que eles sirvam de inspiração. “Esse é um dos lados obscuros da mídia social: algo quase impossível para as empresas controlarem. Elas não são capazes de bloquear esse material em tempo real”, diz Paul Barrett, vice-diretor do NYU Stern Center for Business e Human Rights. “É um verdadeiro dilema sobre os perigos que as mídias sociais podem facilitar.”
Tom Watson, vice-líder do Partido Trabalhista da Nova Zelândia, convocou plataformas de tecnologia para a luta contra a disseminação do vídeo. Em comunicado, Watson disse que escreveria para as plataformas de mídia social para perguntar por que não conseguiam remover as imagens. Em um tuíte, Watson disse que o YouTube deveria ter suspendido todos os novos envios até que pudesse impedir que o vídeo da Nova Zelândia se espalhasse.
“O fracasso em lidar com isso rápida e decisivamente representa uma completa abdicação de responsabilidade pelas empresas de mídia social”, comenta. “Isso aconteceu muitas vezes. Deixar de baixar os vídeos imediatamente e impedir que outros sejam enviados é uma falha de decência.”