Poucas categorias de produtos eletrônicos conseguem ser tão confusas quanto a dos relógios inteligentes – ou smartwatches. Os primeiros bons modelos dessa linha começaram a aparecer em 2014, liderados pelo Apple Watch e pelos dispositivos rodando o Android Wear, do Google.
A Samsung também começou usando Android Wear, mas logo expandiu-se para uma solução proprietária de software e apresentou ao mundo o Gear S. Hoje em sua terceira geração, o Gear S3, a marca coreana demonstra que aprendeu muito com os erros do passado e continua melhorando.
Anunciado no Brasil em dezembro do ano passado, o Gear S3 custa R$ 2.200 (preço sugerido pela Samsung) e foi enviado ao Olhar Digital para alguns dias de teste. Será que o aparelho supera os antecessores e a concorrência? Será que ele vale o alto preço? Será que algum smartwatch nesse mundo vale tanto dinheiro? É o que você vai descobrir nos parágrafos abaixo.
Design
Para você que não sabe o que é um smartwatch, segue um rápido resumo: trata-se de um wearable (um dispositivo vestível), que você coloca no pulso e sincroniza com seu smartphone. A partir dele, é possível ter acesso rápido a notificações e algumas funções básicas do celular, como responder mensagens e até atender ligações, dependendo do modelo.
O que acontece é que, visualmente, não há quase nada que diferencie um smartwatch de um relógio comum. O Gear S3 é um bom exemplo desse caso. O design aplicado pela Samsung é simples, porém muito arrojado. Parece um relógio “normal”, mas possui diversas características de um produto de luxo, voltado ao público executivo.
A versão que testamos do aparelho é a Classic, com pulseira de couro (em dois tamanhos para os diferentes pulsos dos usuários). Há uma outra versão, chamada Frontier, com uma pulseira de borracha e uma textura mais “esportiva”, voltada para um outro público. O relógio em si, em ambas as versões, é feito em aço.
Não há como ir muito mais a fundo do que isso. O Gear S3 é um relógio bonito e discreto, sem qualquer extravagância. Não chega a ser tão minimalista como o Moto 360, da Motorola, mas também não tenta se passar por um computador de pulso. A melhor descrição para o Gear S3 talvez seja a palavra “elegante”.
Experiência de uso
Carregar um smartphone miniaturizado no pulso significa ter um contato ainda mais íntimo com a tecnologia do que o que temos com o celular ou com o PC. Isso também quer dizer que a experiência de uso precisa ser a mais natural e intuitiva possível, de modo que o usuário não se sinta um ciborgue ao mexer no relógio no braço.
Embora todo smartwatch seja um pesadelo nesse sentido, até que a Samsung consegue colocar no Gear S3 algumas ideias bem interessantes. A principal delas é a do volante em torno da tela, que permite ao usuário interagir com seus recursos além da touchscreen. É o mesmo mecanismo de interação usado no Gear S2, e que volta aqui com a mesma delicadeza e precisão.
Faz muito sentido que um smartwatch use seu próprio formato redondo como forma de navegação. Trata-se da interação mais intuitiva e natural que se pode imaginar ter com o relógio. Causa certo desconforto ter que usar os pinos laterais como cursores, como faz o Apple Watch, pois não parece um movimento tão “orgânico”.
Há botões na lateral do dispositivo da Samsung que, vez ou outra, precisam ser utilizados para realizar certas tarefas. Em alguns momentos, o uso desses botões pode parecer confuso, e leva algum tempo até o usuário decorar qual deles faz o que. Mas este é apenas um contratempo numa interface de usuário muito bem construída.
Outro recurso que torna a experiência intuitiva é a tela Super AMOLED “always-on” (sempre ligada), que fica em um estado de baixa luminosidade quando o usuário não está olhando e se acende quando detecta o movimento do braço de levar o relógio à altura dos olhos. No entanto, o recurso não funciona da forma mais precisa possível.
Por mais de uma vez, tive que erguer o braço, abaixar de novo e erguer novamente, às vezes até sacudir o pulso, para que a tela se acendesse e eu pudesse ver as horas. Sinal de que os sensores de movimento dentro do relógio não são exatamente perfeitos, o que pode tornar a experiência um tanto frustrante no dia a dia.
A tela, aliás, tem boa resolução e, como o seu antecessor, o Gear S3 também consegue manter o conteúdo da tela legível mesmo sob forte luz natural – pelo menos quando a tela está ativa. No modo de baixa luminosidade, é bem difícil discernir os ponteiros e os números digitais.
Por fim, o Gear S3 possui certificação IP68, o que garante que é um dispositivo quase totalmente à prova de água. Dizemos “quase totalmente” porque a Samsung não recomenda que você o use para nadar ou mergulhar, especialmente não em água salgada. De todo modo, o relógio promete aguentar até 1,5 metro de água por até 30 minutos, o que conseguimos conprovar nos nossos testes.
Recursos e desempenho
Vamos aos números oferecidos por aplicativos de análise desempenho. O Gear S3 tem um processador dual-core de 1,0 GHz, 768 MB de RAM e incríveis 4 GB de armazenamento interno. O salto em relação ao S2 é nítido e muito bem-vindo, fazendo com que o S3 funcione bem melhor de forma independente do que apenas repercutindo o conteúdo do celular.
Esses 4 GB de espaço interno podem ser usados para instalar novos aplicativos, mas não há muitas opções na loja da Samsung. O grande problema do Gear S3, nesse sentido, é seu sistema operacional. O software, baseado em Tizen (da própria Samsung), é bem mais fechado e burocrático do que o Android Wear, usado por alguns concorrentes.
Parear o relógio com um celular Android que não seja um top de linha recente da Samsung é uma tarefa um tanto ingrata. É preciso instalar nada menos do que três aplicativos da coreana só para que os dois dispositivos possam conversar com mais clareza. Num Galaxy S7, por exemplo, dois desses apps já vêm instalados de fábrica.
Dito isso, o Gear S3 até que facilita o “grande” trabalho que é tirar o celular do bolso para conferir uma notificação (falaremos mais dessa “tortura” logo abaixo). Há pouco atraso entre a chegada do alerta no celular e no relógio, e erguer o braço para ativar a tela dá acesso imediato ao conteúdo de mensagens do WhatsApp, Messenger ou SMS.
O que o Gear S3 não faz bem é oferecer um mecanismo de resposta a essas mensagens que seja minimamente satisfatório. Como qualquer outro smartwatch, o relógio inteligente da Samsung tem um teclado quase incompreensível. O sistema de detecção de áudio também traduz muito mal nossas respostas em voz alta, e nem atender ligações – fazendo aquela famosa pose de agente secreto levando o pulso para perto da boca – é a melhor das experiências.
Apenas as respostas curtas (“sim”, “não”, “talvez”) é que são de fácil acesso. Esse problema não é exclusivo do Gear S3, é claro, mas pouco empenho se vê da parte da Samsung para tentar consertá-lo. O lado bom é que o smartwatch aposta muitas de suas fichas no uso independente do celular, especialmente no monitoramento de atividades físicas, quando se destaca.
Além dos tradicionais contadores de passos, calorias, horas dormidas e registros de batimentos cardíacos (que funcionam bem, aliás), o Gear S3 vem com suporte a redes Wi-Fi. Isso significa que muitas de suas funções básicas, como consultar o mapa ou dar uma olhada na previsão do tempo, funcionam mesmo longe do smartphone.
Ainda que não seja completamente independente do smartphone, trata-se de um leve grau de autonomia bem-vindo. Ajuda o fato de que a bateria do aparelho (que possui 380 mAh de potência) tenha uma duração razoável: de três a quatro dias longe da tomada. O carregamento sem fio pelo dock que acompanha o smartwatch, porém, é lento como se espera que seja: como se fosse um celular de três anos atrás, o Gear S3 leva quase duas horas para ir de 0% a 100%.
Conclusão
O Gear S3 é, nitidamente, um dos melhores – senão o melhor – smartwatch do mercado brasileiro. O que não quer dizer muito, na verdade. Por melhor, mais completo, dinâmico e inteligente que seja, o dispositivo é só um relógio com as mesmas funções de um smartphone.
Até hoje, a indústria de tecnologia não parece ter encontrado uma justificativa clara para os smartwatches. Como dissemos antes, sua principal função é encurtar a viagem das mãos do usuário: não precisa tirar o celular do bolso para ver quem está te chamando no WhatsApp, basta erguer o braço.
Há quem argumente que fazer isso é mais seguro do que deixar o smartphone à mostra, mas as chances de alguém roubar um celular da sua mão são quase as mesmas que a de um ladrão pedir seu relógio quando perceber que ele acende a tela sozinho e tem controles sensíveis ao toque.
Tudo isso ainda por R$ 2.199, o preço de um ótimo smartphone intermediário. Ainda que não pareça compensar, os smartwatches conseguiram conquistar uma fatia (bem pequena) do público consumidor. Se mesmo sabendo de tudo isso e tendo uma opinião diferente você quiser comprar um relógio inteligente, o Gear S3 é uma opção que não deixa a desejar.