Desde o dia 16 de agosto, está liberada em todo o Brasil a propaganda eleitoral pela internet. Neste ano, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) definiu novas regras para as ações, mas tudo indica que já existem partidos e agências quebrando estas novas regras.

Perfis com milhares de seguidores no Twitter, entre eles @exuliane, @delucca e @pppholanda, admitiram ter concordado em receber dinheiro para fazer publicações exaltando políticos e pautas ligadas ao Partido dos Trabalhadores (PT), em especial ao candidato a governador do Piauí pela legenda, Wellington Dias.

De acordo com o jornal O Globo, o PT contratou a empresa BeConnect para fazer “diagnóstico, monitoramento e análises de ambiente de redes sociais”. A BeConnect, por sua vez, subcontratou a agência LaJoy, que interage com influenciadores e perfis populares nas redes sociais para organizar ações de marketing.

A jornalista Paula Holanda disse no Twitter que foi convidada pela LaJoy para compartilhar conteúdo, vídeos e links que exaltassem assuntos “de esquerda” em troca de dinheiro. “O que nos foi passado é que seria uma campanha de esquerda, e não uma campanha partidária”, ela disse num tweet que agora está restrito a seguidores aprovados.

Um grupo de conversa no WhatsApp foi criado entre os influenciadores que faziam parte da ação. Nele, todos os dias os participantes recebiam um “briefing”, um resumo da pauta que deveria ser abordada nas redes sociais. Primeiro, Paula foi instruída a compartilhar um tweet sobre Gleisi Hoffman, presidente do PT, e depois sobre Luiz Marinho, candidato ao governo de São Paulo pelo mesmo partido.

Ela desistiu da ação quando pediram para que ela falasse sobre Wellington Dias – “não tenho nenhuma ligação com o Piauí e não o conheço”, ela afirmou. Relato semelhante foi o do perfil @exuliane, que possui 45,3 mil seguidores e também fez uma postagem sobre o Wellington Dias. Ela se disse arrependida de participar da campanha e confirmou o contato com a agência LaJoy.

Por aplicativo

Além disso, havia um segundo processo de recrutamento que não envolvia lista de convidados. Uma mensagem-corrente que circulou por grupos de WhatsApp sugeria que qualquer um poderia entrar no projeto baixando um aplicativo chamado “Follow”, que serve para organizar estratégias de “ativistas digitais”.

Na caixa de comentários do app no Google Play há pessoas dizendo, desde o começo de agosto, que chegaram a ele por meio de um “anúncio de divulgação de notícias em troca de remuneração”, e, em pelo menos um caso, de que o pagamento pela ação não havia sido efetuado.

O aplicativo Follow é desenvolvido por um perfil identificado apenas como Pavarotti. O site oficial do desenvolvedor não tem informação direta de contato. Mas sua página no Facebook diz que a sede da empresa é em Belo Horizonte (MG). De acordo com a Junta Comercial de Minas Gerais e com a Receita Federal, há uma empresa chamada Follow Análises Estratégicas no estado cujo sócio é Miguel Correa da Silva Junior.

O nome é o mesmo de um candidato ao Senado na chapa com Dilma Rousseff pelo PT. Além disso, Rodrigo Queles Teixeira Cardoso, suposto dono da BeConnect, também consta como secretário parlamentar de Corrêa Júnior, que ainda cumpre mandato de deputado federal pelo mesmo partido.

Há relatos não confirmados de que o pagamento poderia variar de R$ 500 a R$ 2.000 pelo trabalho de cada influenciador na campanha, o que é contra as regras da propaganda eleitoral de 2018 definidas no ano passado pelo TSE. A prática pode ser considerada crime eleitoral.

O que dizem os citados

Gleisi Hoffmann, presidente do PT e candidata a deputada federal, negou a história. “O PT nunca utilizou esse tipo de prática. Nossa relação com as redes sociais sempre foi de engajamento político. Nunca precisamos disso, até porque temos muita presença nas redes sociais. Estamos averiguando o que aconteceu para tomar as medidas que forem necessárias”, disse ela no Twitter.

Ao jornal O Globo, a empresa contratada pelo PT para cuidar de redes sociais, a BeConnect, disse que “não foi contratada para fazer campanha eleitoral e que é contratada pelo PT, desde junho, para fazer o monitoramento de redes sociais”. Além disso, a companhia negou que influenciadores tenham sido pagos por ela.

Já a LaJoy, empresa contratada pela BeConnect e acusada de pagar influenciadores, disse em nota que seu trabalho é de “dar consultoria sobre quais jovens profissionais tecnológicos e digitais de esquerda eram aptos a construir e sugerir a melhor tática (conteúdo: posts, memes e GIFs) de apresentar a proposta para quando chegasse o período eleitoral”.

A LaJoy também afirma que não contratou e não pagou influenciadores pela ação, reiterando que seu trabalho foi o de indicar perfis famosos nas redes sociais que “discutem e fortalecem as causas progressistas de esquerda”. Já Wellington Dias, o candidato ao governo do Piauí citado na história, disse que a ação não partiu da sua campanha.

“Eu fui surpreendido. Não tem nada a ver com a nossa campanha. Eu perguntei para a minha equipe e me garantiram que nada disso partiu daqui”, disse o petista ao O Globo. “O que sei é que teve uma estratégia de uma moçada lá da direção nacional [do partido] que passou para umas pessoas e essas pessoas foram repassando para outras. […] A compra de impulsionamento é contra a lei, mas nada disso foi feito por aqui, não tem nenhum contrato nosso.”

O que diz a lei

No artigo 24º da Resolução 23.55 do TSE, que dita as regras para as eleições de 2018, se diz que “é vedada a veiculação de qualquer tipo de propaganda eleitoral paga na internet, excetuado o impulsionamento de conteúdos, desde que identificado de forma inequívoca como tal e contratado exclusivamente por partidos políticos, coligações e candidatos e seus representantes”.

Só é permitido fazer propaganda eleitoral na internet se for de graça ou se estiver explícito que se trata de uma peça paga. No caso dos influenciadores no Twitter, não estava claro que se tratava de uma ação remunerada. Além disso, o Twitter informou em maio que iria proibir a veiculação de propaganda eleitoral para não ter problemas com o TSE.

O Facebook, por sua vez, permite a exibição de propaganda política, mas com ressalvas. Os partidos e candidatos tiveram que se cadastrar com a empresa e todo post patrocinado por eles no feed de notícias aparece com a informação de que se trata de uma publicidade, além do nome e CNPJ de quem pagou.

Carlos Yuri, advogado do PSDB no Piauí, protocolou no Tribunal Regional Eleitoral (TRE-PI) representação por propaganda irregular feita pela coligação do candidato do PT, Wellington Dias. “O que precisa ser apurado é se o PT nacional está usando a estratégia de usar influência digital paga, o que é proibido por lei”, disse ele ao O Globo.