A IBM anunciou nesta quinta-feira que vai estender uma parceria com a associação de veteranos de guerra dos EUA para uso do Watson no tratamento de câncer. A inteligência artificial da empresa já é utilizada há dois anos como suporte à chamada oncologia de precisão, que adapta o tratamento às diferenças genéticas das pessoas. A extensão do acordo vai permitir que o sistema continue em uso até pelo menos junho de 2019. Mas ela não é a única solução de IA aplicada nesse ramo da medicina. Há algumas outras iniciativas, inclusive no Brasil, que também ajudam no combate ao câncer.
No caso do trabalho feito pela IBM nos EUA, o Watson é usado basicamente para interpretar dados referente ao tratamento. Um grupo de oncologistas e patologistas que atendem a associação de veteranos sequenciam o “DNA” do tumor a partir de amostras, submetendo as informações para análise da IA. O sistema, então, “interpreta os dados do genoma, identificando mutações relevantes e opções de terapia em potencial para atacá-las”, segundo a IBM.
Opções mais específicas
O grupo é responsável pelo tratamento de 3,5% dos pacientes com câncer no país, e não usa o Watson com foco em algum tipo específico da doença. Outras tecnologias, porém, são mais específicas e focadas no diagnóstico rápido.
No começo do ano passado, uma equipe de pesquisadores da Universidade de Stanford conseguiu treinar uma IA para detectar câncer de pele. Versão adaptada de um ferramenta do Google capaz de diferenciar cães e gatos, o sistema foi apresentado a algumas centenas de milhares de imagens de pele em diferentes condições de saúde. A partir disso, aprendeu a diferenciar o órgão saudável do doente — tão bem que, quando colocada frente a frente com 21 dermatologistas, teve um desempenho equiparável ao dos médicos na hora de identificar o problema de saúde.
A solução, é claro, não substitui os especialistas, já que não faz o diagnóstico completo. Mas, para a associação Cancer Research UK, do Reino Unido, a inteligência artificial pode se tornar uma ferramenta bastante útil para os médicos. Um dos doutores envolvidos no teste, Andre Esteva, contou à BBC na ocasião que acredita inclusive que o sistema pode futuramente ser usado como um aplicativo para smartphones, tornando o diagnóstico ainda mais fácil.
Aprendizado de máquina é chave
Essa é a expectativa também do Dr. Elliot Fishman, radiologista no Hospital John Hopkins, referência no tratamento de câncer nos Estados Unidos. Em maio deste ano, Fishman falou sobre um trabalho desenvolvido em conjunto com a Nvidia para agilizar a identificação da doença no pâncreas. Esse tipo de câncer é raro, mas também é um dos que, hoje, dá aos pacientes algumas das menores chances de sobrevivência. Segundo a American Cancer Society, nos estágios iniciais, ao menos nos Estados Unidos, o número fica entre 12 e 14%. O Instituto Nacional de Câncer, no Brasil, explica que esse número baixo é provocado especialmente pela dificuldade na detecção.
O modelo segue o mesmo princípio da IA desenvolvida na Universidade de Stanford. Fishman, junto com uma equipe de cientistas da computação, oncologistas e patologistas, tem treinado algoritmos de aprendizado profundo com tomografias de pacientes saudáveis e também de diagnosticados com câncer no pâncreas. As imagens são identificadas pelos médicos antes de serem passadas para o sistema, para que assim ele aprenda a diferenciar os dois casos. A análise de cada imagem, segundo a Nvidia, leva quatro horas.
Os resultados, porém, são notáveis. No primeiro ano do projeto, o algoritmo conseguiu “reconhecer o pâncreas e os órgãos em volta, atingindo 70% de precisão”. Já em testes neste ano, o sistema foi capaz de detectar câncer pancreático em nove de cada 10 tentativas. O resultado ainda deve melhorar, já que os médicos agora estão analisando os casos em que o sistema não conseguiu detectar a doença para corrigi-lo.
Projetos similares também estão em desenvolvimento no Japão — uma IA oriental conseguiu detectar o câncer colorretal com 86% de precisão — e no Imperial College, na Inglaterra, que está trabalhando em um sistema focado no câncer de mama.
E no Brasil?
Por aqui, a Microsoft anunciou no meio do ano passado uma parceria com o Grupo Oncoclínicas, especializado em câncer. O objetivo era usar soluções de aprendizado profundo e inteligência artificial tanto na radioterapia quanto na quimioterapia. É similar ao que os outros projetos mencionados acima propõe: contar com uma IA para agilizar e tornar mais precisos tanto o diagnóstico quanto o tratamento contra o câncer.
As duas empresas ainda passaram a contar com apoio de pesquisadores do Centro de Estudos Sociedade e Tecnologia (CEST) da USP. Eles ficaram responsáveis por criar um algoritmo que fosse capaz de “analisar e estabelecer correlações entre diagnósticos de diferentes pacientes” a partir de bases de dados públicas e também da Oncoclínicas — que tem parceria com diferentes hospitais pelo Brasil. Segundo comunicado da Microsoft publicado no anúncio da parceria, a expectativa era atender pelo menos 16 mil pacientes com a iniciativa.
Há ainda iniciativas do Hospital Sírio-Libânes, em São Paulo, e do laboratório Fleury. O primeiro conta com um banco de dados com 36 mil pacientes registrados, usado como referência para tratamentos, e até maio deste ano estudava a possibilidade de integrar o Watson à sua plataforma. Já o segundo desenvolveu o teste Oncofoco, uma solução que se aproveita da computação cognitiva do Watson (o da IBM mesmo) para analisar material genético dos pacientes e definir o tratamento contra o câncer.