Pichayada Promchertchoo, correspondente na indochina da CNA, investigou como as mídias sociais, em especial o Facebook, se tornaram ferramenta essencial para muitos dos envolvidos nos negócios lucrativos do tráfico de órgãos nas Filipinas.

Umas das histórias contadas por ela se passa em um hospital em Manila, capital das Filipinas. Um homem chamado Carlos pergunta como pagará pela conta do parto de sua mulher. A parteira havia cancelado de última hora e eles não tiveram outra opção, ao não ser ir ao hospital. Agora, estavam com uma conta de 14 mil pesos filipinos (R$1080), que não podiam pagar.

ReproduçãoCarlos em reportagem sobre tráfico de órgãos (Foto: CNA)

Então, uma possível solução surgiu na mente de Carlos. Anos vivendo em uma das comunidades mais pobres de Manila, ele foi ensinado onde encontrar dinheiro em um momento de desespero. Assim, Carlos entrou no Facebook em 27 de setembro de 2019 e postou uma mensagem curta. Ele esperava que isso lhe trouxesse dinheiro em pouco tempo.

“Vendo um dos meus rins, entre em contato comigo. Estou falando sério…Nenhuma transação falsa, por favor…”, escreveu Carlos no Facebook. Ele era um de 14 usuários naquela thread particular a anunciar seu rim para venda. Eles compartilharam seus números de contato, tipo sanguíneo e sua necessidade urgente de dinheiro.

A partir de uma rápida busca no Facebook por “doação de rim nas Filipinas”, podemos encontrar muitos filipinos oferecendo seus órgãos para vender. “Carreguei meu telefone e fiz uma busca no Facebook. Digitei “rim para venda” na barra de pesquisa e apareceram muitas opções. Alguns estão procurando doadores. Outros estão se oferecendo para comprar órgãos”.

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Foto: CNA

Por fim, Carlos conseguiu pegar algum dinheiro emprestado para pagar a conta do hospital e não precisou vender seu rim, mas essa não é a realidade para o resto das pessoas anunciando seus órgãos na plataforma. Inclusive, até mesmo o pai da recém nascida admitiu que pode voltar ao Facebook para vender seu rim se sua família precisar de dinheiro novamente no futuro. “Minha família é a coisa mais importante da minha vida”, disse ele. “Sempre será uma opção.”

Tráfico de órgãos nas Filipinas

O tráfico de órgãos não é novidade no país do Sudeste Asiático. Durante décadas, ele é conhecido mudialmente como um país de alto risco para turistas, por causa de suas grandes instalações médicas de transplante e pouca supervisão governamental.

O novo, neste caso, é a expansão para o mundo das redes sociais. As autoridades acreditam que isso dificulta ainda mais a supervisão governamental, pois os compradores podem se esconder atrás do animato da internet.

“Observou-se que todas as formas de tráfico de pessoas, seja por sexo ou por trabalho, estão sendo cometidas através do uso de plataformas on-line como as mídias sociais”, disse Yvette T Coronel, vice-executiva do Conselho Interagencial das Filipinas.

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Foto: CNA

“O rim é o órgão mais traficado devido à sua alta demanda no mercado negro e ao fato de que um doador pode sobreviver com apenas um rim”, explicou ela. O tráfico humano de órgãos é um crime grave, punível com pena de prisão de até 20 anos de acordo com a lei das Filipinas

Normas de conduta do Facebook

Em uma declaração à CNA, uma porta-voz do Facebook disse que existem regras claras que proíbem compra ou venda de alguns produtos na plataforma, entre eles, órgãos humanos. “Removemos esse conteúdo sempre que tomamos conhecimento e encorajamos nossa comunidade a denunciar conteúdo que eles acham que pode violar essas regras”, disse o porta-voz.

A rede social também disse que sua equipe trabalha em colaboração com agentes nas Filipinas para ajudá-los nestas situações. O Facebook também informou que é preciso diferenciar publicações benignas sobre doação de órgãos, como incentivos à doação, e anúncios de vendas ilegais.

Entretanto, ainda assim existem muitos posts claramente anunciando a venda ilegal e que continuam na plataforma. Coisas como: “Bom dia! Eu estou disposta a vender meu rim. Tipo A+ e disposta a passar por testes de qualquer comprador possível o mais rápido que puder. Eu tenho 28 anos. Necessidade financeira urgente. Apenas me mande mensagem no privado. Obrigada…”.

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Foto: CNA

Contudo, embora as comunicações online tenham seus prós, elas também permitem um monitoramento. Segundo Victor Lorenzo, chefe da Divisão de Cibercrime do Departamento Nacional de Investigação das Filipinas, os comerciantes precisam anunciar que querem órgãos publicamente para conseguir doadores. “Eles não podem entrar na dark web porque muitas pessoas não podem acessá-la. E essa é a nossa vantagem”.

Os possíveis casos de tráficos de órgãos são encaminhados às autoridades relavantes e informações são combinadas para criar um mapeamento geográfico. “Por trás de uma transação on-line há uma pessoa real”, disse o agente de crimes cibernéticos. “Mesmo sendo anônimos, pelo menos você tem uma certa vantagem sobre as pessoas por trás dessa transação, e isso seria suficiente para prosseguirmos em uma investigação.”

Doação de órgãos nas Filipinas

O país filipino possui muitos hospitais licenciados para realizar transplantes, para isso, um Comitê Nacional da Ética em Transplantes existe para supervisionar a atuação destes locais e garantir que nenhum comércio esteja acontecendo.

“Quando você diz ‘doação de órgãos’, espera-se que não seja monetário. Deve ser puramente voluntário, verdadeiramente altruísta e livre de tentações indevidas”, disse o Dr. Francisco Sarmiento, do programa filipino de doação e transplante de órgãos do Departamento de Saúde.

Fonte: CNA