30 anos: a web faz aniversário!

Apesar dos progressos, ainda há muito a ser feito: é preciso incluir quem ainda não está online, garantir que as mulheres se tornem cada vez mais parte da população digital e combater as fake news
Roseli Andrion12/03/2019 17h29, atualizada em 12/03/2019 19h00

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Hoje é o aniversário daquela que é responsável por estarmos todos aqui (eu escrevendo e você lendo): a web. Lá se vão 30 anos e essa jovem passou por muitas evoluções nesse período, chegou a diversas plataformas e se reinventa a cada dia para ir ainda mais longe.

O que começou como uma ferramenta facilitar o acesso a documentos — quando Tim Berners-Lee a inventou em 1989, como um projeto da Organização Europeia para a Pesquisa Nuclear (CERN) —, hoje é a principal interface para conectar as pessoas com a internet. Aqui, você pode ver outros momentos pelos quais a web e a internet já passaram no Brasil e no mundo.

E a expectativa é de que a web cresça ainda mais, segundo Reinaldo Ferraz, especialista em Desenvolvimento Web do Ceweb.br e do W3C Brasil. “Ela ainda tem potencial para crescer muito, mas provavelmente essa expansão não será tão perceptível como foi até agora”, diz. “A web deve dominar a indústria automotiva e a internet das coisas, entre outras áreas.”

Adoção de padrões foi fundamental

Um dos momentos mais significativos da web ocorreu no fim dos anos 1990, quando havia uma verdadeira guerra entre os navegadores. À época, os mais populares eram o Explorer e o Netscape, mas não havia um padrão de desenvolvimento. “Alguns elementos não funcionavam em todos os browsers. Isso só foi resolvido com a adoção do HTML5: apesar de estar em teste desde 2010, a recomendação de uso pelo W3C veio apenas em 2014. A partir disso, os desenvolvedores passaram a trabalhar com base nesse padrão, não para atender a este ou àquele navegador”, lembra Ferraz.

O YouTube, por exemplo, é uma das grandes empresas que só começou a usar HTML5 depois que ele se tornou uma recomendação do W3C. Antes disso, a plataforma usava o Adobe Flash para garantir a reprodução de seus vídeos. “Em geral, as companhias esperam que o padrão se torne estável para adotá-lo.”

No Brasil, uma das maiores preocupações é com a acessibilidade na web. “Desde 1998, quando foi editada a primeira documentação oficial no país, desenvolvedores, gestores e tomadores de decisão se preocupam muito com isso”, conta Ferraz. “Isso porque, a depender de como é feito o desenvolvimento, ele pode ser uma barreira para as pessoas com deficiência. Por isso, a W3C Brasil reforça bastante esse aspecto.”

Ainda há muito a ser feito

Apesar de toda a evolução nesses 30 anos, apenas 50% da população do mundo tem acesso à web atualmente. Pior: há quem nem sequer a conheça. “Muitos não só não experimentaram a web, como nunca ouviram falar dela”, conta Sonia Jorge, diretora-executiva da Alliance for Affordable Internet (A4AI).

A A4AI trabalha para baixar o preço do acesso à internet em países em que a renda é baixa ou média, por meio de políticas públicas e reformas regulatórias. Sonia conta que a América Latina — e, notadamente, o Brasil — estão à frente de países da África e da Ásia quando o assunto é a universalização do acesso. “Apesar de ter havido progresso, ainda há muito a fazer para dinamizar as possibilidades trazidas pela web”, lembra ela. “É essencial que ela chegue a todos os ambientes, não só às áreas urbanas.”

Sonia conta que, em alguns países (como Nigéria, Moçambique e Bangladesh), 30% a 40% da população nunca tiveram qualquer contato com a tecnologia da web. “Todo o tipo de informação que experimentamos está online”, comenta. “Quem não tem acesso à web perde oportunidades, porque não pode se informar sobre seus direitos. Essa marginalização atinge mais fortemente as mulheres, os pobres e a população rural.”

Abismo digital entre homens e mulheres

É o caso, por exemplo, de parte da população de Bangladesh. Lá, apenas 18% dos cidadãos estão online. Quando se considera o alcance da banda larga móvel, 23% das pessoas estão incluídas — e a maioria delas são homens. “Em Bangladesh, há um abismo de 63% entre homens e mulheres quando se fala em acesso à web”, lamenta Sonia.

Embora haja aspectos culturais envolvidos nessa exclusão — boa parte deles relacionados a machismo —, outros fatores a influenciam: os preços, a infraestrutura e as políticas governamentais são elementos importantes nessa equação. “É preciso que haja metas para atrair apoios. Sem isso, não há investimentos e, em vez de atacar o problema, ele é alimentado.”

Em alguns países, as mulheres, os pobres e a população rural não têm acesso a educação de qualidade (qualquer semelhança com o Brasil não é coincidência). Com isso, os integrantes desses grupos não adquirem as habilidades necessárias e se sentem intimidados pela tecnologia — o que os afasta das oportunidades que ela oferece. Sonia explica que, por isso, é preciso que preços, infraestrutura, capacitação e políticas públicas sejam adequados.

Fake news são preocupação constante

As notícias falsas sempre existiram, mas encontraram na web a melhor forma, até agora, de se espalhar. Sonia diz que se trata de um problema que deve ser tratado de forma coletiva para que seja efetivamente combatido. “Todos os que têm responsabilidade por plataformas devem estar conscientes das consequências negativas das fake news. É necessário que haja união para atacá-las.”

Por isso, uma das principais formas de agir é a capacitação. A A4AI luta para que todos — mas, principalmente, meninas e mulheres — sejam ensinados não apenas a usar o equipamento, mas a fazê-lo de forma segura. “Todos têm de entender o que é ser um cidadão digital e quais são suas responsabilidades e seus direitos”, avalia. Só assim, eles vão ser capazes de proteger seus dados pessoais e compreender que sua privacidade deve ser respeitada.

De forma geral, não há uma resposta fácil ou linear à dificuldade de lidar com as notícias falsas. Esse problema deve ser tratado de forma coletiva para que se torne a fundação para transformar a sociedade. Preocupado com a dimensão que esse tipo de notícia tem tomado, Tim Berners-Lee lançou um manifesto em que demonstra sua preocupação com o risco que a web corre. Ele pede que haja mais transparência nos processos que a envolvem.

Neste aniversário de 30 anos da web, é inegável que há muito a comemorar. Muitas tarefas diárias foram facilitadas graças a ela! Mesmo assim, é preciso ficar preocupado com o futuro: não podem se passar outros 30 anos até que todos os cidadãos do mundo tenham acesso a essa tecnologia e muito menos para que o risco de controle de dados seja definitivamente extinto.

Colaboração para o Olhar Digital

Roseli Andrion é colaboração para o olhar digital no Olhar Digital