O Brasil tem um grande potencial para o empreendedorismo, embora este ainda não seja explorado em sua totalidade. Segundo a pesquisa Global Entrepreneurship Monitor Brasil 2018, possuir um negócio próprio é o quarto sonho mais recorrente entre os brasileiros, à frente do desejo de fazer carreira em uma empresa.
As mulheres respondem por 34% das pessoas pertencentes ao grupo de “donos de negócio” na média nacional, de acordo com dados do SEBRAE. Apesar de o Brasil ser uma nação empreendedora – estando à frente até mesmo de países-modelo, como Israel –, nós mulheres ainda praticamos um empreendedorismo de subsistência, sendo que, muitas vezes, as motivações são muito mais relacionadas a aspectos mais imediatos, como garantir o pagamento de despesas pessoais.
Por exemplo, 90% das famílias que participam de um projeto de microempreendedorismo do Banco da Providência, organização que desenvolve projetos de inclusão social, são chefiadas por mulheres. Os motivos para isso são diversos: impossibilidade de subsistência, separação e até gravidez precoce.
Além disso, ainda é muito comum que as mulheres empreendam em áreas tradicionalmente femininas como vestuário, beleza e alimentação. Apesar de haver avanços, a participação das mulheres nas áreas de ciência, tecnologia, engenharia, matemática e inovação ainda é mais baixa do que deveria. Há pouco incentivo para a inclusão feminina nesse setor, muito por conta de um contexto de desigualdade de gênero que estimula a percepção de que essas áreas de atuação são ligadas ao universo masculino.
Claro que se trata de uma percepção antiquada e incoerente com a realidade. Por meio do Programa de Aceleração do BrazilLAB, por exemplo, que apoia startups e as conecta com governos para incentivar a inovação no setor público, tive a oportunidade de conhecer e trabalhar ao lado de empreendedoras que criaram projetos notáveis no que diz respeito a soluções digitais. Um exemplo é a jovem Lívia Cunha, fundadora do Cuco Health, cujo aplicativo gratuito voltado ao engajamento, ampliação de conhecimento e aderência de pacientes aos tratamentos médicos que ajudou a reduzir filas em Unidades Básicas de Saúde de Juiz de Fora, em Minas Gerais.
A participação de mulheres no empreendedorismo e na inovação também pode trazer benefícios globalmente: de acordo com um estudo de 2015 da consultoria McKinsey, considerando projeções até 2025, a redução do gap de gênero entre homens e mulheres poderia incluir 240 milhões de trabalhadoras no mercado de trabalho, além de resultar em um crescimento econômico de 12 a 28 trilhões no PIB dos países anualmente. Em resumo, a igualdade de gênero, além de ser um direito humano, também traz benefícios econômicos e científicos para a sociedade.
Algumas formas de enfrentar esse desafio podem ocorrer a partir da criação de programas de financiamento e apoio às iniciativas lideradas por mulheres, a ampliação a compreensão sobre o tema e sobre como enfrentá-lo e a criação de leis, políticas e estruturas de regulação para incentivar meninas e mulheres. Sobretudo por ser uma questão geracional, é importante começar desde cedo, incluindo a educação básica, o ensino superior e o mundo do trabalho.
No Brasil e no mundo, já existem muitas iniciativas admiráveis de incentivo à participação de mulheres no empreendedorismo e na tecnologia. Alguns exemplos são: o Girls Who Code (organização americana tem como objetivo aumentar o número de mulheres programadoras), o Cloud Girls (meetup brasileiro de cloud e de tecnologia para mulheres), o Elas nas Exatas (fundo brasileiro voltado exclusivamente para o incentivo da participação de mulheres jovens nas áreas de STEM), o Mulheres na Ciência e Inovação (programa de formação brasileiro desenvolvido pelo Museu do Amanhã) e o Saga Project (projeto das Nações Unidas para reduzir as desigualdades de gênero nas ciências, tecnologia, engenharia e matemática).
Participei recentemente de um evento no Museu do Amanhã, na cidade do Rio de Janeiro, em que cerca de 40 mulheres debateram o ecossistema de inovação e empreendedorismo. Lá, foram apresentadas algumas iniciativas centrais para melhorar a eficiência do setor público, em áreas como saúde e agronegócio, provando que a ciência e a tecnologia podem alavancar o potencial que o Brasil já tem – e que as mulheres devem exercer um papel central para essa tão necessária transformação.
Há uma excelente perspectiva para a ampliação dos negócios, em especial para os de tecnologia e inovação geridos por mulheres. O desafio consiste em nos capacitar mais e empreender também em áreas até então dominadas pelos homens, apostando na disrupção tecnológica. Também é imprescindível que a sociedade se responsabilize pela ampliação da participação das mulheres nas iniciativas de empreendedorismo e inovação. É papel da iniciativa privada, do governo e da sociedade civil garantir a existência de oportunidades, incentivos e garantias para o pleno desenvolvimento de meninas e mulheres nessas áreas e negócios.O atual contexto de transformações globais nos apresenta a oportunidade única de implementar mudanças que, no futuro, trarão benefícios para as vidas de todas as pessoas no futuro.