Um estudo publicado recentemente no periódico Scientific Reports revelou que um ingrediente usado comumente em uma série de produtos, desde sabonetes e pastas de dente até móveis e roupas, pode curar pessoas infectadas com malária. Embora o ingrediente já fosse conhecido, a descoberta de que ele poderia combater a doença só foi feita graças à ajuda de uma inteligência artificial.
O composto em questão é um agente chamado triclosan, encontrado com frequência em produtos de higiene e cosméticos. A robô que participou do estudo – chamada de “robô cientista Eve”, visível na imagem acima – foi orientada a testar uma grande variedade de produtos aprovados pela FDA (o órgão regulador de alimentos e drogas dos EUA) quanto à sua eficácia no combate à malária. Foi assim que ela descobriu que o triclosan podia ser usado para essa finalidade.
Aniquilando a resistência
A malária causa cerca de 500 mil mortes por ano no mundo; cerca de 90% delas são causadas pelo Plasmodium falciparum, o parasita que causa a doença. As outros 10% são causadas pelo Plasmodium vivax, que é o causador de malária com maior distribuição global – cerca de 2,5 bilhões de pessoas estão expostas a ele. E o Plasmodium vivax ainda é capaz de passar bastante tempo dormente no fígado dos pacientes antes de se manifestar, o que o torna mais resistente.
Normalmente, para tratar pessoas infectadas com malária, os médicos usam um remédio chamado pirimetamina. A pirimetamina, segundo o Independent, impede que os parasitas produzam uma enzima importante para seu desenvolvimento, chamada de DHFR. Incapazes de produzir a DHFR, os parasitas morrem, e a pessoa fica curada.
Mas como a pirimetamina já é usada para combater a malária há bastante tempo, já existem parasitas que são resistentes a ela, e por isso os cientistas usaram a robô cientista Eve para buscar por outros compostos que inibissem a produção da enzima DHFR. E a robô, testando uma série de compostos, percebeu que o triclosan tem esse efeito mesmo em parasitas resistentes à pirimetamina.
A robô que foi além
Já faz algum tempo que os médicos sabem que o triclosan é eficaz para combater parasitas, de acordo com o Eureka Alert. Afinal, ele é usado em produtos de higiene por um motivo: ele inibe a produção da enzima ENR, que é essencial para o crescimento de algumas bactérias. Por isso, imaginava-se que ele conseguiria combater os parasitas causadores da malária inibindo essa mesma enzima.
Porém, a robô cientista Eve descobriu que não é bem isso que acontece. Além de inibir a ENR, o triclosan também inibe a DHFR dos parasitas que causam malária. Isso significa que ela não funciona apenas quando o parasita está no sangue dos pacientes, mas também quando ele está dormente no fígado deles. Por isso, ele é um remédio ainda mais eficaz, e poderia ser usado para lançar um “ataque em duas fases” contra o parasita.
Daqui para frente
Elisabeth Bilsland, a principal autora do estudo, é professora assistente da Unicamp. Segundo ela, “a descoberta feita pela nossa ‘colega’ robô (…) traz esperança de que nós possamos usar o triclosan para desenvolver um novo remédio. Sabemos tratar-se de um composto seguro, e a habilidade dele de atacar dois pontos no ciclo de vida do parasita causador da malária significa que ele dificilmente conseguirá resistir”.
Como o Engadget aponta, essa não é a primeira vez que a robô cientista Eve faz uma descoberta desse tipo. Em 2015, ela já estava em busca de drogas que pudessem combater a malária, e acabou descobrindo que um remédio que é usado no combate a determinados tipos de câncer também pode ser usado no tratamento de malária. Abaixo, é possível ver um breve vídeo da Eve trabalhando: