Redes sociais podem afetar o bem-estar e a saúde mental

O ciberbullying está nas plataformas e pode levar ao sofrimento psicológico e ao isolamento. Por isso, é preciso estar atento a sinais de depressão e ansiedade
Roseli Andrion20/09/2019 22h44, atualizada em 20/09/2019 22h51

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Parece um ambiente seguro. Afinal, fica dentro de casa, onde pais e familiares podem se manter alertas sobre qualquer movimentação. Só que muitas vezes é um vale sombrio repleto de solidão. Uma solidão acompanhada de muito ciberbullying.

Este é o cenário da internet hoje para muitos. Em julho, houve um caso muito simbólico: a blogueira Alinne Araújo, que falava justamente sobre sua própria depressão nas redes, cometeu suicídio um dia após casar-se consigo mesma — ela decidiu seguir com o casamento mesmo depois da desistência do noivo, um dia antes da cerimônia.

Todos achavam que ela estava bem: os mais próximos interpretaram a atitude como um sinal de que ela havia superado a situação, mas os seguidores não perdoaram e o ciberbullying deu o tom no perfil de Alinne durante horas. Muitos diziam que a blogueira estava agindo daquela forma (casando-se consigo mesma) apenas para chamar a atenção. Ela, então, sucumbiu.

Crianças, adolescentes ou adultos, ninguém está livre de ter sua saúde mental abalada. Nas redes sociais, isso pode ser ainda mais perigoso: o contato com os haters pode levar ao sofrimento psicológico. Um estudo da Royal Society for Public Health, conduzido em 2017, aponta o Instagram como a pior plataforma para a saúde mental dos usuários — recentemente, a rede foi a primeira a ocultar as curtidas nas publicações, como forma de preservar os usuários.

Outras pesquisas sobre a relação entre as redes sociais e diferentes desordens mentais (principalmente depressão e ansiedade) têm sido cada vez mais frequentes. Os resultados apontam para o alto risco de incidência de distúrbios em associação com o uso dessas plataformas.

Outros dados parecem confirmar: a quantidade de crianças de 10 a 14 anos que morreram por suicídio aumentou 65% entre 2000 e 2015, segundo um estudo da Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais (Flacso Brasil) com base em dados do Ministério da Saúde. Entre adolescentes de 15 a 19 anos, o crescimento foi de 45% no mesmo período. Como esses casos são, em geral, subnotificados, os números podem ser, infelizmente, ainda maiores.

Contato humano

Todo ser humano busca ser aceito. É fácil ver isso nas redes sociais: as fotos são sempre maravilhosas, de refeições a viagens, passando por roupas, sapatos e piscinas. Com isso, a impressão que se tem é de que a vida alheia é sempre melhor que a própria — um desencadeante perigoso de sentimento de inferioridade e outros males.

Se a isso for acrescentada a rejeição, especialmente em um ambiente tóxico (as redes sociais muitas vezes têm esse viés, especialmente em comentários maldosos e pouco gentis), o indivíduo pode desenvolver baixa autoestima e passar a sofrer em silêncio. Esses contatos nocivos online, então, minam sua autoconfiança e o fazem se retrair e se isolar cada vez mais.

É um ciclo vicioso, especialmente porque uma das características da geração atual é o uso constante de gadgets. Muitos jovens não têm nem a habilidade de falar com pessoas, pois só se relacionam com eletrônicos. “Viver apenas o mundo digital é problemático. O indivíduo deixa de ter contatos reais: não conversa com amigos pessoalmente, não joga bola, não faz atividades em que há proximidade humana”, explica a psicóloga Priscila Gasparini Fernandes.

Ela conta o caso de uma criança que ficou impressionada ao ver uma galinha em um passeio de férias. Isso porque só tinha visto aquele animal de forma virtual e, ao se deparar com ele em um ambiente real, veio o choque. Fica claro, então, que os contatos reais estão em falta — o que pode ser problemático em diversas situações.

Segundo Priscila, o isolamento voluntário deprime o indivíduo e pode levá-lo a ter uma fobia social. “Antes, a depressão era associada ao quarto escuro, em que o paciente se trancava. Hoje, o doente busca a internet para evitar contatos reais”, destaca. “Ali, ele se sente mais confortável e, como não há censura, pode chegar a espaços pouco saudáveis e encontrar incentivo para o suicídio. Por isso, é importante que amigos e familiares estejam atentos.”

A psicóloga faz um alerta: é importante que as pessoas se interessem umas pelas outras. Em casa, por exemplo, o diálogo deve ser prioridade. É fundamental que os pais saibam por onde seus filhos andam online. “A conversa é o mais importante. Impor limites e regras é parte do processo, mas conhecer o filho é essencial.” Só assim, ela pontua, os pais vão saber se seus filhos são tímidos ou se estão sofrendo.

Campanhas de prevenção

A importância da prevenção é cada vez mais clara e a informação é essencial nesse contexto. Neste setembro (amarelo), duas iniciativas do Instituto Vita Alere, com apoio da SaferNet Brasil, do Google e da Unicef, pretendem servir de auxílio para pais, mães, educadores e adolescentes: a ideia é falar abertamente sobre sofrimento mental, suicídio e uso seguro e responsável da internet.

Intitulada #éprecisofalar, a campanha tem cartilhas informativas sobre esses temas. Os materiais, disponíveis para download gratuito, têm dicas sobre fatores de risco, prevenção e formas de denunciar conteúdos impróprios nas redes sociais. Em 2018, o Vita Alere fez a campanha #euestou, sobre prevenção de suicídio para jovens, que alcançou 15 milhões de pessoas. Agora, mais uma série de vídeos do instituto aborda o assunto.

O YouTube, por sua vez, criou uma websérie para discutir bem-estar e saúde mental no contexto da internet. Composta por seis episódios, chama-se “Depressão não é frescura” e busca, em linguagem simples, informar e conscientizar sobre as causas e os efeitos da depressão a partir de um melhor entendimento sobre a doença.

Dieta digital

Todos devem se policiar a respeito do uso excessivo das redes sociais. Uma das opções para avaliar a qualidade do relacionamento com a tecnologia — e, mais notadamente, com essas plataformas — é calcular o Índice de Massa Virtual.

O conceito, criado pelo jornalista canadense Daniel Sieberg, autor de “Dieta Digital”, pode ajudar a descobrir quando se está passando dos limites. Para saber o seu, responda às perguntas a seguir e multiplique a quantidade pelo valor indicado em cada item.

  • Quantos smartphones você tem? x 3
  • De quantas redes sociais você faz parte? x 4
  • Quantos laptops você tem? x 1
  • Quantos dispositivos tipos tablet você possui? x 2
  • Quantos endereços de e-mail você tem? x 2
  • Quantos serviços de mensagem de texto e/ou chat você usa? x 5
  • De quantos jogos do tipo RPG (jogo de interpretação de personagem) você participa? x 7
  • Quantos computadores de mesa você tem? x 1
  • Quantas câmeras digitais você possui? x 1
  • Quantos outros eletrônicos que precisam de um carregador você usa? x 1
  • Em quantos blogs você escreve ou comenta com frequência? x 2

Agora, some todos os resultados e compare com as opções a seguir:

24 pontos ou menos

Você está dentro da média considerada adequada. O uso que você faz da internet e das redes sociais é saudável.

De 25 a 35 pontos

Fique atento! Ser mais comedido no uso das ferramentas virtuais pode ajudá-lo a viver melhor.

36 pontos ou mais

Você precisa de uma dieta virtual. Controlar o uso da internet e das redes sociais vai lhe trazer benefícios.

Colaboração para o Olhar Digital

Roseli Andrion é colaboração para o olhar digital no Olhar Digital