Conheça o laboratório de onde saem as ideias mais malucas da Samsung

C-Lab abriga projetos considerados inovadores e promissores de funcionários e dá origem a produtos pouco convencionais
Renato Santino24/07/2019 23h44, atualizada em 25/07/2019 11h00

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Suwon, Coreia do Sul* – Inovação é uma palavra-chave da indústria de tecnologia e, para fazer jus a essa missão, algumas empresas estão dispostas a criar projetos internos para estimular a criatividade de seus funcionários. Afinal de contas, se algum deles tiver uma ideia genial, a companhia pode aplica-la a seus produtos e conquistar mais espaço em mercados disputadíssimos, como é o dos smartphones.

Desde 2012, a Samsung mantém um projeto que visa exatamente isso: dar liberdade aos funcionários para criarem produtos que fujam completamente do convencional. É o C-Lab, o laboratório de inovação da empresa que de lá para cá já deu origem a produtos um pouco diferentes do que se espera normalmente da Samsung. O Olhar Digital teve a oportunidade de conhecer de perto o colorido espaço na sede da gigante em Suwon, na Coreia do Sul, onde fica localizada a “Digital City”, como é conhecido o campus da Samsung que abriga cerca de 30 mil funcionários.

O C-Lab não é restrito à sede coreana da Samsung. Unidades do C-Lab já podem ser encontradas também na Índia, na Ucrânia e também na China, de modo a estimular e abrigar projetos inovadores e pouco convencionais de várias partes do mundo.

Na CES 2018, por exemplo, a empresa revelou ao mundo o S-Ray, uma linha de produtos de áudio direcional portátil, o que significa que apenas as pessoas que estão diretamente em frente à saída de som podem escutá-lo; na prática, isso cria sistemas de som individuais que podem substituir os fones de ouvido. Já em 2019, o evento teve a apresentação de produtos com a Alight, uma luminária de mesa equipada com inteligência artificial, que ajusta a iluminação de acordo com a tarefa e que pode reconhecer se o usuário estiver dormindo ou usando o celular em vez de se concentrar no que deveria estar fazendo.

São apenas dois dos exemplos entre vários projetos que saíram do chão por meio do C-Lab. São ideias incomuns e muitas delas jamais acabam chegando ao mercado, parando na fase de protótipo justamente por serem altamente experimentais. E é justamente isso que a Samsung espera com o projeto: a maioria dos planos pode até não decolar, mas alguns deles vão, e a gigante coreana pode tirar proveito desse momento.

Como nasce um projeto do C-Lab

Reprodução

Os funcionários interessados em dar ideias para o C-Lab podem fazer isso durante todos os dias do ano. No entanto, não é qualquer ideia que é imediatamente aprovada: a empresa conta com um sistema no qual outros funcionários podem votar nos projetos mais interessantes com dinheiro virtual. Além disso, anualmente é realizado um dia no qual os funcionários podem apresentar suas propostas em um auditório, com transmissão para outros empregados da Samsung no mundo inteiro, e as melhores ideias acabam selecionadas.

A partir do momento em que um projeto é selecionado para se integrar ao programa, o funcionário responsável ganha o direito de se afastar do seu cargo para cuidar do seu projeto. A partir daqui, ele entra na fase de construção de uma equipe para ajudar no desenvolvimento da ideia, que também é acompanhado de uma mentoria para que o andamento seja o melhor possível.

Durante o período em que o funcionário deixa o seu cargo convencional para cuidar do projeto do C-Lab, ele também passa a ser avaliado de forma diferente pela companhia. Tradicionalmente, a Samsung faz uma avaliação anual de desempenho de seus empregados, que pode ser revertida em aumento salarial e promoções, utilizando um sistema de pontos. Isso é deixado de lado no período do C-Lab, no qual a métrica são bons resultados alcançados no projeto.

E depois?

Depois que a equipe responsável pelo projeto é montada, é hora de construir o protótipo do produto. Para isso, o time tem acesso aos recursos da Samsung para conseguir tirar seu plano do papel e validar suas ideias. A empresa também promove uma feira do C-Lab para demonstração dos projetos e uma plataforma para que projetos nessa etapa de validação sejam apresentados a outros funcionários e a consumidores que podem dar sua opinião que ajudará a moldar o produto final.

É por isso que os projetos do C-Lab costumam dar as caras durante a CES, que é a maior feira de tecnologia do planeta. A empresa não está apenas querendo demonstrar as ideias de seus funcionários para o mundo, também é parte importante do processo ver o que o mundo externo fala sobre os projetos para saber como melhorá-los.

Meu projeto foi validado. E agora?

Ao final do período de incubação, a equipe tem uma escolha: pode voltar para o seu posto de trabalho ou continuar com seu projeto. No entanto, a Samsung Electronics é uma empresa gigantesca, com mais de 300 mil funcionários espalhados pelo mundo. Isso porque a empresa lida com quase todos os tipos de dispositivos eletrônicos: áudio, vídeo, telefonia, computadores, tablets… mesmo assim, boa parte dos projetos do C-Lab não se encaixa dentro dos planos de mercado da Samsung.

Isso não quer dizer que o projeto é abandonado só por não fazer parte de um plano de marketing da Samsung. Justamente por isso, um projeto bem-sucedido no C-Lab pode passar por um “spin-off”: isso significa que o projeto pode ser separado da gigante coreana e começar a operar como uma empresa independente.

No entanto, isso não quer dizer que a Samsung lava completamente as mãos com as novas startups nascidas a partir do spin-off do C-Lab. A partir do momento em que um projeto obtém a “graduação” para se separar da Samsung e virar uma empresa à parte, a coreana continua a apoiar o projeto com investimento em dinheiro e consultoria. A companhia também pode oferecer apoio na divulgação dos projetos por meio de seus canais de relações públicas e marketing.

Reprodução

Mas por que a Samsung gostaria de fazer isso?

Bom, a Samsung não faz isso só por ser boazinha. Quando uma startup surge a partir da C-Lab, a companhia mantém um percentual de participação de 20% na companhia, que pode virar uma fortuna se o projeto for adiante.

Vamos usar o exemplo recente da Uber. A empresa concluiu recentemente seu IPO e colocou suas ações para negociação na bolsa de valores e, na abertura das negociações, a empresa era estimada em nada menos do que US$ 82,4 bilhões. Agora imagine se a Uber tivesse nascido como parte do C-Lab: 20% desse valor, ou cerca de US$ 16,5 bilhões, pertenceria à Samsung se a empresa decidisse se desfazer de sua participação. A empresa também teria a opção de segurar essas ações esperando uma valorização futura. Tudo isso graças a um pequeno investimento feito em um projeto de um funcionário.

E se o projeto não der certo?

O mundo das startups é cruel: a maioria das empresas não consegue se sustentar no longo prazo, o que é natural. A cultura do Vale do Silício indica que 90% delas não acaba obtendo sucesso e fecha as portas. Não há como garantir que os spin-offs do C-Lab tenham um destino similar.

Neste caso, a Samsung oferece uma rede de proteção para seus ex-funcionários que graduaram projetos do C-Lab ao nível de empresas independentes. Mesmo que seus planos naufraguem, eles ainda têm a oportunidade de voltar para a Samsung e continuar em seu antigo posto de trabalho.

* O jornalista viajou a Suwon a convite da Samsung

Renato Santino é editor(a) no Olhar Digital