O Google liberou nesta segunda-feira, 6, mais uma atualização do Android. O sistema operacional para smartphones e tablets mais usado no mundo chegou à sua nona iteração, chamada Android 9 Pie, e deve chegar ao seu aparelho nos próximos meses.

Mas, afinal, o que o Google ganha distribuindo o Android? Ao contrário da Microsoft, que vende a licença do Windows para fabricantes de PCs, empresas e usuários comuns, o Google libera o Android totalmente de graça para qualquer um.

Se engana, porém, quem pensa que o Google não recebe qualquer tipo de retorno ao investir no desenvolvimento do Android. Ao divulgar seu balanço fiscal trimestral, a empresa não cita a receita proveniente do Android, mas há quem faça suas contas.

Em 2016, a Oracle abriu um processo contra o Google acusando a empresa de infringir patentes do Java na criação do Android. Nos autos, a Oracle estimava que, de 2008 a 2016, o Google teria faturado US$ 31 bilhões graças ao Android.

Mas, se este número é real, de onde ele vem? Para entendermos como o Android se encaixa na estratégia do Google, primeiro precisamos entender como é a relação da empresa com as fabricantes de smartphones e tablets que usam o sistema.

AOSP

O nome completo do Android, como registrado em sua “certidão de nascimento”, é Android Open Source Project (AOSP), ou Projeto de Fonte Aberta. Trata-se de um conjunto de códigos, APIs e frameworks criados pelo Google e disponibilizados de graça.

Qualquer um pode baixar o código do Android, disponível aqui, e mexer o quanto quiser nele. É totalmente gratuito, sem pegadinhas. Mas até que a Samsung ou a LG possam colocar este código todo dentro do seu celular, o caminho é mais longo.

No meio da caminho existe uma outra sigla ligada ao Android que é GMS – Google Mobile Services, ou Serviços do Google Mobile. Trata-se de um conjunto de aplicativos e APIs do Google que tornam a experiência com o Android mais uniformizada.

O Android disponível pelo AOSP é apenas um conjunto “pelado” de códigos que podem ser customizados e usados para qualquer finalidade. Já o GMS é um pacote que inclui, entre outras coisas, os apps do Google, do Chrome e até o Google Play.

O sistema operacional de um smartphone da Samsung, por exemplo, vem não só com o código do AOSP customizado, mas também com o pacote GMS, que permite acesso ao Google Play. É só a partir daí que você pode baixar o Facebook e o Whatsapp, por exemplo.

O segredo do GMS

Para muitas fabricantes, não adianta muita coisa ter o AOSP sem ter o GMS. Você pode colocar o sistema Android num celular, mas se este celular não tem o Google Play, o usuário não poderá instalar o WhatsApp ou o Instagram, tornando-o quase obsoleto.

É por isso que a grande maioria das fabricantes adotam, também, o GMS, além do AOSP. O GMS também é gratuito: ninguém precisa pagar nada para ter acesso aos apps do Google. Mas as empresas precisam provar que seus dispositivos estão aptos para tê-los.

Para provar, muitas empresas buscam laboratórios que possam produzir um certificado atestando que aquele celular atende às exigências do Google para rodar o GMS. Uma reportagem do The Guardian de 2014 apurou que um certificado pode custar de US$ 40 mil a US$ 75 mil.

O Google, porém, não tem relação alguma com o valor cobrado por estes certificados. Mas o GMS é, sim, a maior fonte de renda do Google em relação ao Android. Qual é o segredo? Os dados que você entrega à empresa por meio deste pacote de apps.

O produto é você

O Google é uma das três empresas mais valiosas do mundo, mas quase todos os seus serviços são de graça. Não só o Android. O Buscador é gratuito, assim como o YouTube, o Gmail e o Chrome. Todo o dinheiro do Google vem, na verdade, de anúncios.

Quando você usa um dos serviços da empresa, ela coleta dados a seu respeito e te mostra, nos resultados de Busca, no Gmail, no YouTube e no Chrome, anúncios que combinem com o seu perfil de usuário. Um nível tão alto de segmentação, é claro, também custa caro. E é daí que o vem a maior parte da receita do Google.

O seu smartphone Android com todos os apps do pacote GMS não é nada mais do que mais uma fonte de informação a seu respeito. Pelo Google Maps, a empresa sabe onde você mora. Pelo YouTube, sabe a que filmes você assiste. Pelo Chrome, sabe quais sites você acessa. E por aí vai.

Em 2017, o Google anunciou que já existem mais de 2 bilhões de pessoas usando um dispositivo Android no mundo. É, de longe, o sistema operacional móvel mais usado no planeta. O concorrente mais próximo, o iOS, tem 1,3 bilhão de usuários.

Segundo o Google, os apps que compõem o GMS já têm, cada um, mais de 1 bilhão de usuários. Ou seja, são 1 bilhão de pessoas entregando dados ao Google que, com base neles, vende espaços publicitários para clientes corporativos.

Este domínio sobre o mercado já até rendeu uma multa bilionária para a empresa pela acusação de monopólio. A Comissão Europeia cobra mais de 4 bilhões de euros por supostamente “empurrar” o pacote GMS às fabricantes. É por isso que o Google chegou a dizer que, se esta medida for adiante, o Android pode até deixar de ser gratuito.

O Olhar Digital entrou em contato com a assessoria de imprensa do Google para saber como a empresa justifica o investimento no Android e o que ela ganha com ele. Em resposta, recebemos um link para um artigo assinado por Sundar Pichai, CEO, sobre a decisão da Comissão Europeia de multar a companhia.

No texto, o CEO do Google admite que “há custos envolvidos na construção do Android” e que a empresa investiu “milhões” nos últimos ano. O retorno, segundo ele, está justamente no pacote de aplicativos GMS.

“Os fabricantes de telefones não precisam incluir nossos serviços e eles também são livres para pré-instalar aplicativos concorrentes ao lado dos nossos. Isso significa que só geramos receita se nossos aplicativos estiverem instalados e as pessoas optarem por usar eles em vez dos aplicativos concorrentes”, diz Pichai.

Google Play

Outra fonte de renda para o Google com o Android é a Google Play, a loja de aplicativos do sistema. A cada transação feita pela loja, seja na venda de um app ou na venda de recursos extras para o app, o Google fica com 30%. Sem falar no aluguel e na venda de livros, músicas e filmes.

A empresa não diz quanto dinheiro ganha como intermediária destas transações, mas há empresas que, de fora, calculam estimativas. Um estudo da Sensor Tower publicado em julho indica que o Google Play movimentou US$ 11,8 bilhões no mundo todo no primeiro semestre.

Se o Google ficou com 30% deste valor, são mais de US$ 3,5 bilhões na conta da empresa graças ao Google Play. É ainda menos do que o que a Apple ganha com a App Store do iOS, que, segundo o mesmo estudo, movimentou US$ 22,6 bilhões.

Agora você já sabe como o Google ganha dinheiro com Android: acumulando os dados que você gera a partir dos apps do sistema e pelas vendas e transações dentro do Google Play.