Entenda a história e as polêmicas da tomada de três pinos

O governo federal estuda acabar com a obrigatoriedade da tomada de três pinos no Brasil. Entenda a história da padronização das tomadas brasileiras.
Daniel Junqueira24/06/2019 20h46, atualizada em 24/06/2019 20h55

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O presidente Jair Bolsonaro quer mudar novamente as tomadas brasileiras: na semana passada, uma reportagem do jornal Valor Econômico afirmou que o Governo Federal estuda emitir uma norma que acabe com a obrigatoriedade da tomada de três pinos, que é a única permitida no país desde 2011.

A história do novo padrão brasileiro de tomadas é longa e polêmica. Ela começou nos anos 80, com as primeiras discussões sobre a padronização dos plugues e das tomadas, até que, em meados dos anos 2000, o novo formato passou a ser obrigatório em novas construções e, em 2011, em produtos vendidos para consumidores.

Para entender toda essa história, vamos voltar no tempo e relembrar como o padrão foi definido para saber se ele é realmente seguro e quais os impactos dele no país.

As origens da tomada de três pinos

Nunca existiu um padrão internacional para tomadas. Cada país instalou sua rede elétrica própria e definiu os modelos de plugues de acordo com suas necessidades. Isso criou um problema em um mundo globalizado: cada país tem uma tomada de um jeito, produtos de lugares diferentes contam com plugues diferentes. Isso criou a necessidade do uso de adaptadores – que não são completamente seguros, embora bastante úteis.

Durante os anos 80, o Brasil tinha 12 tipos diferentes de plugues e 8 de tomadas espalhadas pelas diferentes construções do país. Casas de uma mesma rua podiam ter entradas diferentes, já que não havia nenhum tipo de definição sobre qual plugue e tomada usar. Nessa época, o Inmetro decidiu certificar a segurança dos plugues de tomada no Brasil.

Nos anos 90, a ABNT, um órgão privado, começou a escutar indústria, especialistas e consumidores com o objetivo de criar um padrão único para as nossas tomadas. Ficou definido o uso do modelo com três pinos: o central serviria para aterramento, uma medida que aumenta a segurança das instalações elétricas, mas não é implementada em todo o país.

Algumas tomadas antigas eram perigosas, defende o Inmetro, até pela falta de qualidade dos conectores

Em 1998, durante o governo Fernando Henrique Cardoso, a norma NBR 14.136 foi divulgada com as definições dos novos plugues brasileiros. Em 2000, o Inmetro definiu que, a partir de 2006, o uso do novo padrão seria obrigatório para a emissão do Habite-se, um certificado da prefeitura que indica que a obra está finalizada. Ou seja, desde meados da década passada o Brasil vem passando pelo processo de troca das tomadas.

Os diversos padrões continuaram sendo comercializados no Brasil até 2011, quando a venda de qualquer um que não fosse o novo – a tomada de três pinos, e o plugue de dois ou três pinos – foi proibida.

Por que os três pinos?

O Inmetro defende que as tomadas de três pinos garantem mais segurança aos usuários. Não só pela tomada em si – que, de fato, foi criada com o objetivo de minimizar as chances de acidentes para usuários – mas também pelo fato de um padrão ser usado. Como dissemos antes, o uso de diversos adaptadores para os diferentes tipos de plugues não é exatamente seguro e pode gerar acidentes e até mesmo incêndios.

Uma das características das tomadas é um recuo interno, o que faz com que a entrada dos pinos fique “afundada”. Isso visa especificamente a segurança: o plugue precisa ter um formato hexagonal para ser encaixado na tomada. Em modelos antigos, isso não era necessário, permitindo que usuários desavisados ligassem apenas um dos plugues na tomada, ou até mesmo que um objeto ficasse entre o plugue e a tomada e causasse algum tipo de acidente.

O terceiro pino serve para aterramento e é importante para eletrodomésticos como geladeiras e máquinas de lavar roupa. Mas para isso funcionar é preciso que o prédio ou casa em questão tenha o aterramento – o que não ocorre em parte do país. Assim, para muita gente, o terceiro pino não tem utilidade alguma.

É difícil dizer se, de fato, as novas tomadas aumentaram a segurança. Dados do Ministério da Saúde indicam que o Brasil tem 1,3 mil mortes por choque elétrico anualmente; em São Paulo, entre 2000 e 2010, foram 35 mil incêndios causados por falhas elétricas. Desde que o novo padrão entrou em vigor, a quantidade de atendimentos por exposição à corrente elétrica saltou de 857 em 2011 para 1,3 mil em 2017 – embora não esteja claro quantos desses atendimentos foram causados por problemas em tomadas.

A Associação Brasileira da Indústria Elétrica Eletrônica (Abinee), por sua vez, é contra a alteração no padrão e diz que isso causará insegurança para usuários – a associação diz que a média anual de acidentes fatais provocados por choques elétricos caiu de 1,5 mil, entre 2000 e 2010, para 600 ocorrências por ano.

Vale a pena mudar de novo?

Mudanças de padrão trazem transtornos, e é bastante provável que uma nova alteração – dependendo de como for feita – cause apenas mais custos para os brasileiros. É bom ressaltar que todo o processo de substituição das tomadas custou, segundo número divulgado pela Revista Época, R$ 1,4 bilhão até 2018.

Mas pode ser que uma nova norma não exija tantos custos: o governo pode apenas flexibilizar a regulamentação atual e permitir algumas tomadas estrangeiras, permitindo que consumidores escolham qual modelo usar.

Ex-editor(a)

Daniel Junqueira é ex-editor(a) no Olhar Digital