Desenvolvedores chineses denunciam exploração trabalhista no fórum do GitHub

Reclamações focam na jornada excessiva de trabalho das 9h às 21h durante seis dias por semana; autores das denúncias acusam algumas das maiores e mais conhecidas empresa, como a Huawei
Redação02/04/2019 23h32, atualizada em 03/04/2019 11h30

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Trabalhadores de empresas de tecnologia na China viram no GitHub uma plataforma viável para protestar contra explorações de trabalho. Entre os fóruns mais populares do site nos últimos dias, há um repositório de mensagens, chamado 996.ICU, com uma série de denúncias às condições de trabalho no setor tecnológico chinês.

As reclamações focam na jornada excessiva que submete funcionários a trabalhar das 9h às 21h durante seis dias por semana. Os autores das denúncias acusam algumas das maiores e mais conhecidas empresas de tecnologia da China, incluindo Huawei, Alibaba, Bytedance e DJI.

Qualquer usuário do GitHub pode publicar no fórum, apesar de ele ser destinado a trabalhadores chineses. Para ter uma postagem aceita, as pessoas devem apresentar evidências, as quais são, muitas vezes, publicações em mídias sociais e reportagens. Porém, em algumas exceções, usuários divulgam declarações ou documentos internos da empresa para sustentar suas acusações.

Por outro lado, os administradores do repositório permitem que qualquer usuário do site corrija ou exclua dados de acusações que eles considerarem incorretas. Em razão da repentina popularidade do fórum, foram geradas, entre outros idiomas, versões em inglês, hindu, espanhol e russo das mensagens.

A empresa citada e conhecida mundialmente, a Huawei, por exemplo, está sendo acusada por alguns de seus funcionários chineses de incentivá-los a desistir voluntariamente de direitos como férias pagas, pagamento de horas extras e licença parental em troca de grandes bônus anuais.

Eles sustentaram suas afirmações em uma notícia da imprensa chinesa publicada em 2010. A matéria também relatou que um funcionário da companhia morreu, em 2006, devido ao cansaço causado pelo excesso de trabalho, e outros dois cometeram suicídio, dois anos depois, em razão a uma “pressão insuportável”. A Huawei ainda não se manifestou a respeito ou respondeu aos comentários até o momento.

As publicações de denúncia no GitHub oferecem um suporte considerável de privacidade e resistência de trabalhadores vulneráveis contra uma possível censura do governo chinês ou das empresas acusadas. Isso porque a plataforma é um recurso essencial para empresas de tecnologia hospedarem e desenvolverem códigos-fonte de softwares nos Estados Unidos e na China. Desse modo, qualquer tentativa de bloqueio do site pode prejudicar muito mais as companhias do que os funcionários.

Além disso, os usuários podem fazer cópias de backup do repositório com antecedência, para guardar as informações caso o fórum com as denúncias for apagado. E mesmo que o GitHub seja de alguma outra forma censurado, as pessoas podem recorrer a serviços semelhantes, como o GitLab.

Por outro lado, no entanto, os usuários têm contra eles o poder do governo chinês sobre as decisões empresariais. Assim, é provável que o GitHub atenda facilmente a qualquer solicitação da China de censura das reclamações publicadas no site. “O Github é de propriedade da Microsoft. Uma pequena reclamação do governo chinês e esse repositório desaparecerá muito rapidamente, pois a Microsoft fará de tudo para manter o bom relacionamento comercial [com o país]”, disse ao The Verge o pesquisador de iniciativas de segurança Victor Gevers. Exemplo disso é a censura dos resultados de pesquisa da ferramenta de busca Bing da Microsoft, que são limitados a fim de cumprir as leis locais.

As condições de trabalho na China

As leis trabalhistas da China especificam que os funcionários não podem trabalhar mais do que três horas extras por dia e 36 horas extras por mês. Os trabalhadores também devem receber 150% de seus salários por hora extra trabalhada, 200% de remuneração por trabalhar um dia de folga sem receber outro de compensação e 300% a mais por trabalhar em feriado nacional. Os desenvolvedores estão acusando as empresas de tecnologia chinesa de raramente cumprir com os pagamentos extras determinadas pelas leis do país.

Porém, há brechas em torno das regulamentações que permitem as irregularidades. De acordo com os regulamentos locais ou mesmo por digressão dos empregadores, funcionários podem ser classificados como parte do sistema padrão permitidos pela lei, como funcionários excluídos que trabalham ocasionalmente ou em empregos administrativos onde as horas extras não são calculadas

Além disso, os trabalhadores na China são desprotegidos pelos sindicatos trabalhistas. Isso acontece porque esses órgãos são supervisionados pelo Partido Comunista Chinês e, por isso, acabam desempenhando papel passivo na defesa dos direitos dos trabalhadores no país.

Os sindicatos também enfrentam dificuldades para atender às reivindicações dos funcionários de tecnologia, uma vez que a maior parte do trabalho de horas extras é, normalmente, realizada voluntariamente.

Mesmo depois de documentar e evidenciar violações e explorações trabalhistas, funcionários da área de tecnologia ainda podem enfrentar desafios significativos para alcançar as mudanças reivindicadas. Motivos para isso são os problemas econômicos da China e a indiferença geral da população quando se trata de reforma sociais.


Fonte: The Verge

Colaboração para o Olhar Digital

Redação é colaboração para o olhar digital no Olhar Digital