Como pensa Jeff Bezos, o homem de US$ 150 bilhões

Renato Santino20/07/2018 21h54, atualizada em 21/07/2018 17h00

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Jeff Bezos talvez não seja o nome mais conhecido do mundo da tecnologia. Todo mundo conhece nomes como Bill Gates e Steve Jobs, mas o nome de Bezos, especialmente entre os entusiastas brasileiros não é tão popular, ainda que ele tenha criado um império global que o tornou o maior bilionário dos tempos recentes, superando até mesmo a fortuna de Gates em seu auge.

Para quem ainda não sabe, estamos falando do fundador da Amazon, a empresa que, no momento em que este texto é escrito, compete com a Apple para chegar primeiro à marca inédita de mais de US$ 1 trilhão em valor de mercado. O sucesso da companhia também garantiu a Bezos um patrimônio estimado na casa de US$ 150 bilhões, colocando-o no topo do ranking da Bloomberg, atualizado diariamente.

Sob a liderança de Jeff Bezos, a Amazon nasceu como uma livraria online, surfando no início da “bolha .com”, no final da década de 1990, mas que se tornou um conglomerado gigante de tecnologia, enfrentando de frente basicamente todas as outras grandes do setor em vários aspectos. Em mais de 20 anos, a empresa passou a produzir hardware com o Kindle, se tornou um nome importante no setor de streaming, tanto em música quando em filmes e séries, enfrenta e supera nomes como Microsoft e Google com sua plataforma de computação em nuvem AWS e ainda é disparado a maior companhia de comércio eletrônico do planeta.

Mas como foi essa trajetória? O Olhar Digital analisou todas as cartas anuais escritas por Jeff Bezos aos acionistas da Amazon desde que a empresa teve seu capital aberto em 1997 para observar como pensa o bilionário e como isso se traduziu no sucesso dessa megacorporação.

O que fica bastante evidente por meio de todas as cartas é a preocupação com o longo prazo, e não com oscilação de curto prazo. Isso fica evidente no fato de que desde 1998, quando foi publicada a segunda carta de Bezos, a carta de 1997 é incluída no rodapé do texto, mostrando que mesmo depois de 20 anos a visão da companhia não mudou.

Neste sentido, um conceito parece persistente por toda o pensamento de Bezos: a ideia de “Dia 1”. Na ocasião da primeira carta escrita por ele afirmou que era o “dia 1 para a Amazon e para a Internet”; vinte anos depois, ele ainda afirma que estamos no dia 1. Fica evidente que ele não está falando literalmente em tempo, mas em uma proposta de gestão.

Para ele, “dia 1” é uma forma de encarar as atividades do cotidiano, como se ainda estivesse em seu primeiro dia de operação. É uma forma de manter a empresa sempre fresca em suas atividades, sempre procurando inovação, sempre procurando se reinventar, mantendo os olhos abertos para novas possibilidades e oportunidades. Uma empresa que entra no “dia 2” pode se manter com sucesso por muitos anos, mas o fato é que ela já entrou na fase conhecida como “início do fim”.

“O dia 2 é a estase, seguida da irrelevância, seguida pelo declínio doloroso, seguido pela morte. É por isso que sempre estamos no dia 1”, ele afirma em sua última carta pública. Para evitar esse fim lento, ele propõe algumas ideias, e é aí que entra a segunda tecla na qual Bezos bate durante toda sua carreira: foco no consumidor. Por quê?

“Existem muitas vantagens na abordagem com foco no consumidor, mas aqui está a maior delas: os consumidores são maravilhosamente insatisfeitos, mesmo quando eles dizem estar felizes e que os negócios estão ótimos. Mesmo quando eles não sabem, os consumidores querem algo melhor, e o seu desejo de agradar os clientes vai leva-lo a inventar por eles. Nenhum consumidor jamais pediu para a Amazon criar o programa Prime, mas acontece que eles queriam e eu poderia dar muitos exemplos”, afirma o executivo.

Esse processo de reinvenção em nome do consumidor é o que mantém uma empresa longe do “dia 2”, mas existem também outros fatores internos, como a capacidade de tomar decisões rápidas, que segundo eles devem ser feitas com no máximo 70% das informações desejáveis para chegar a uma conclusão. Se você esperar até 90%, você provavelmente foi lento demais. Grandes empresas no “dia 2” podem tomar boas decisões, mas o farão devagar, enquanto empresas no “dia 1” precisam ser capazes de tomá-las rapidamente, como uma startup.

Para que isso seja feito de forma mais ágil, ele divide as decisões em dois tipos. “Algumas decisões têm consequências e são irreversíveis ou praticamente irreversíveis, como portas de um único sentido, e essas decisões devem ser feitas metodicamente, cuidadosamente e lentamente, com muita consulta e deliberação. Se você passar pela porta e não gostar do que viu, não pode voltar para onde estava antes. Chamamos elas de decisões tipo 1. A maioria das decisões, no entanto, não são assim. Elas são reversíveis, como portas de dois sentidos. Se você fez uma decisão tipo 2 sub-ótima, você não precisa viver com as consequências por tanto tempo. Você pode reabrir a porta e voltar. As decisões tipo 2 podem e devem ser feitas rapidamente por indivíduos ou grupos pequenos”, ele conta.

Essa política de reversibilidade permeia a visão da Amazon sobre inovação e invenção. “O fracasso vem junto com a invenção. Não é opcional. Entendemos e acreditamos em falhar rápido e melhorar até acertar. Quando o processo funciona, significa que nossos erros são relativamente pequenos (a maioria dos experimentos podem começar pequenos), e quando acertamos algo que está realmente funcionando bem para os consumidores, podemos dobrar a aposta com a esperança de que aquilo se torne um grande sucesso. No entanto, nem sempre é tão simples assim. Inventar é uma bagunça e, com o tempo, com certeza falharemos em grandes apostas também”, ele conta.

Dentro da visão de sempre focar no consumidor, a invenção pode até mesmo vir a ser algo contraintuitivo no curto prazo, mas se beneficiarem o cliente, o resultado virá no longo prazo. Bezos dá o exemplo de quando a Amazon implementou os reviews de produtos publicados pelos próprios consumidores. “Quando lançamos a Amazon.com em 1995, nós empoderamos os consumidores a escrever análises de produtos. Apesar de isso ser rotineiro na Amazon atualmente, na época nós recebemos críticas de vários vendedores, basicamente questionando se nós entendíamos do negócio: ‘Você ganha dinheiro quando vende coisas – por quê você permitiria análises negativas em seu site?’. Falando como um grupo de testes de uma pessoa, eu já mudei de ideia antes de fazer compras na Amazon como resultado de análises negativas ou mornas. Apesar de avaliações negativas poderem nos custar vendas no curto prazo, ajudar o consumidor a tomar decisões de compra melhores recompensa a empresa no fim das contas”, ele explica em carta escrita em 2003.

Por fim, o sucesso da Amazon também passa pelo reconhecimento dos pequenos sucessos. “Eu me lembro do quão empolgados nós ficamos quando passamos dos US$ 10 milhões em vendas de livros em 1996. Não era difícil ficar empolgado: nós saímos do zero para US$ 10 milhões. Hoje, quando um novo negócio dentro da Amazon chega a US$ 10 milhões, a empresa cresce de US$ 10 bilhões para US$ 10,01 bilhões. Seria fácil para executivos que comandam nossos negócios bilionários desprezar isso. No entanto, eles olham o crescimento dos negócios emergentes e enviam emails de parabéns. É algo bem legal, e eu fico orgulhoso de que isso seja parte de nossa cultura”.

Renato Santino é editor(a) no Olhar Digital

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