O WhatsApp recentemente anunciou uma marca histórica: 2 bilhões de usuários. Trata-se do aplicativo de mensagens mais popular do mundo com folga, mas isso não assusta os fundadores do Signal, app que aposta em segurança e privacidade no máximo e que agora começou a buscar o público comum, indo além dos entusiastas da criptografia e ativistas.
Os números ainda são tímidos. Em entrevista à Wired, Matthew Rosenfeld, criador do aplicativo identificado principalmente pelo seu codinome de Moxie Marlinspike, não revela os números de usuários, mas é fato que o Signal já teve mais de 10 milhões de downloads, segundo os números do Google Play; também se sabe que cerca de 40% dos usuários estão no iOS. Em 2016, ele se limitava a dizer que o número de usuários estava acima de 2 milhões, o que seria 1.000 vezes menos usuários do que o WhatsApp, mas os números atuais são um mistério.
No entanto, há outros fatores que levam a indicar um crescimento rápido. O número de funcionários da fundação que estão trabalhando para fazer o app crescer subiu de apenas 3 pessoas para 20 em quase dois anos. Muito disso se deve à injeção de US$ 50 milhões que os desenvolvedores receberam de uma fonte inusitada: Brian Acton, um dos fundadores do WhatsApp, que hoje ocupa uma cadeira como executivo na fundação.
Não é muito difícil entender seus motivos, no entanto. Acton, junto de seu ex-parceiro Jan Koum, liderou a introdução de criptografia de ponta a ponta no WhatsApp (usando tecnologia do Signal) e se mostrou profundamente contrariado com as intervenções do Facebook no aplicativo, que feriria a privacidade dos usuários. Quando ele decidiu deixar a empresa, não poupou críticas e chegou a manifestar-se a favor de um boicote contra a companhia de Zuckerberg.
Os resultados do investimento são fáceis de ser percebidos. Se o Signal até alguns anos atrás era um aplicativo extremamente simples, restrito a receber e enviar mensagens, apelando apenas para um público que valoriza a criptografia e a privacidade, hoje ela já tem muitos outros recursos que apelam para um público mais convencional e que podem fazer toda a diferença na hora de aumentar o número de usuários, ampliando também a quantidade de pessoas que têm acesso aos recursos de segurança no trânsito da informação, que ainda é o núcleo do aplicativo.
O desafio do Signal com estes recursos foi implementá-lo dentro das limitações propositais do aplicativo, que não coleta nenhum dado de conversas dos usuários, nem mesmo os metadados (informações como quem envia mensagem para quem, por exemplo). Então, se para um aplicativo convencional seria algo simples implementar stickers como os do WhatsApp e do Telegram, o Signal precisou criar alternativas mais complexas. Isso envolveu por exemplo, fazer com que cada pacote de figurinhas fosse criptografado com uma chave específica, que é criptografada e compartilhada entre os usuários quando alguém quer instalar novos stickers no seu celular. Sem essa chave, ninguém pode ver o conteúdo do pacote, incluindo o Signal, que é incapaz de saber qual usuário é o seu autor ou quem está distribuindo o pacote entre seus contatos.
Da mesma forma, os desenvolvedores precisaram quebrar a cabeça para criar um sistema de conversas em grupos que permitisse algum tipo de moderação, já que os servidores da fundação sequer conseguem saber quem são as pessoas que fazem parte do grupo. Neste caso, houve uma parceria com a Microsoft Research, braço de pesquisa da Microsoft, que deu origem a uma tecnologia de “credenciais anônimas”, que dá autorização para que uma pessoa participe do grupo sem que sua identidade seja conhecida. E, no fim das contas, tudo funciona como um grupo normal do WhatsApp, do Messenger ou do Telegram, que é o grande objetivo do Signal: oferecer a conveniência dos grandes apps sem comprometer em nada a privacidade e a criptografia.
Agora a questão é saber até onde o Signal tem capacidade para conquistar o público comum. A participação de Brian Acton pode ser uma vantagem, já que ele tem experiência na construção de um aplicativo de mais de 1 bilhão de usuários, mas essa é uma tarefa mais difícil hoje do que era em 2009, quando o WhatsApp foi lançado. Hoje em dia, é mais difícil convencer alguém a instalar um novo app de mensagens no qual ele só terá contato com poucos amigos e conhecidos, enquanto o app concorrente conta com todas as pessoas com quem ele quer falar.