A democracia é uma instituição mais frágil do que parece. Bastaram alguns e-mails mal-intencionados disparados da Rússia para influenciar em algum nível o resultado da eleição dos Estados Unidos que resultou no bilionário Donald Trump sendo escolhido como o próximo presidente do país.
O contexto: em 2015, o Partido Democrata, representado por Hillary Clinton nas eleições, sofreu um ataque de phishing, com e-mails falsos disparados por hackers patrocinados pelo governo russo em ação realizada por grupos hackers identificados como Cozy Bear e Fancy Bear. Com isso, foi possível acessar dados sigilosos do partido, revelando vários escândalos que foram alegremente usados e citados pelos rivais republicanos durante a campanha eleitoral.
No entanto, recentemente foi descoberto que os republicanos também foram vítimas de um ataque similar, mas nenhum documento foi tornado público, blindando o partido e Trump de escândalos. Sabe-se que as políticas externas de Hillary seriam muito mais desfavoráveis à Rússia, o que ajuda a entender a parcialidade dos hackers. É difícil mensurar qual o impacto dessas informações no resultado das eleições, mas é certo que ao menos causou um desequilíbrio na balança.
O mais importante dessa história toda é perceber como a democracia pode ser frágil diante da ameaça das armas cibernéticas. Um ataque certeiro é barato, eficiente e pode moldar a política de um país adversário para algo que atenda os seus interesses; no caso da Rússia, é muito melhor do que recorrer ao seu vasto arsenal nuclear, que causaria uma crise global em proporções gigantescas, enquanto a ciberguerra é barata, difícil de perceber e localizar, como aponta o New York Times.
E é claro que isso é só um sinal de mudanças mais profundas no sistema democrático global. Afinal de contas, se funcionou uma vez, por que não tentar de novo? De fato, os russos já tentam repetir o feito com o resto da Europa, como advertiu Bruno Kahl, chefe de inteligência da Alemanha, que observa que a região ocidental do continente tem se tornado alvo de tentativas de deslegitimação do processo democrático, principalmente no que tange aos alemães, maiores líderes da União Europeia.
Mas o fato de visar outros alvos não quer dizer que a Rússia esqueceu os Estados Unidos. Inclusive, já foram encontradas cinco novas ondas de e-mails de phishing partindo do grupo hacker Cozy Bear. Os novos alvos são pensadores e entidades sem fins lucrativos do país, e um desses e-mails, direcionados à Universidade de Harvard, tinha anexo um falso artigo com o sugestivo título de “Por que as eleições americanas são imperfeitas”.