Preocupação para milhões de brasileiros, franquias de dados na internet fixa já começaram a ser adotadas pelas principais operadoras de telecomunicações do país. Desde o início do ano, alguns planos da Vivo já impõem ao usuário um limite de navegação, seguindo tendência iniciada pela NET e pela Oi. Ao exceder esse limite, o cliente acaba com a velocidade reduzida ou cortada.
A “punição” depende de cada plano e contrato e não é a mesma para as três operadoras. No caso da Vivo, por exemplo, o limite só começará a valer para clientes antigos a partir de dezembro, ou para quem adquiriu o seu serviço de internet após fevereiro. De qualquer forma, testes como esse indicam que as franquias impostas pelas empresas não são suficientes para os hábitos de consumo de muitos usuários.
Mas o que pode ser feito a respeito disso? Há alguma maneira de barrar a adoção desse modelo de cobrança? Um dos caminhos seria pela Agência Nacional de Telecomunicações, a Anatel, que fiscaliza as empresas do setor em todo o Brasil e tem a responsabilidade de punir possíveis crimes contra o consumidor.
Para a agência, porém, não há nada de errado com a cobrança por franquia na internet fixa. Em entrevista ao site Convergência Digital, Carlos Baigorri, superintendente de Competição da Anatel, disse que a adoção de um limite pode até ser algo benéfico. “Não existe um único consumidor, então para quem está abaixo da média, consome menos, o limite é melhor”, disse.
A explicação da Anatel é de que esses limites – o mais alto da Vivo chega a 130GB por mês – são calculados com base em um consumo médio. “Conforme a seleção adversa, muitas vezes se faz o preço pela média do perfil de consumo. Isso significa que há aqueles que consomem acima da média e os que consomem abaixo da média. Ou seja, quem consome menos paga por quem consome mais”, disse Baigorri ao site TeleSíntese.
Este cálculo mostra, porém, que a base de cálculo usada não reflete os hábitos de muitos usuários. Alguém que costuma navegar durante 4 horas por dia, assiste a 1 hora de vídeos no YouTube, um episódio de série na Netflix e faz o download de até 40GB em filmes, músicas, jogos e outros arquivos mensalmente, pode chegar a consumir 157GB em 30 dias. É mais do que o plano mais caro oferecido pela Vivo.
Pela Justiça
Se a Anatel não vê problemas com esse modelo de cobrança, a Associação Brasileira de Defesa do Consumidor (Proteste) vê. A organização tem um processo em tramitação na Justiça que pretende barrar a adoção das franquia de dados na internet, tanto em conexões fixas quanto móveis. A ação civil pública se baseia na Lei 12.965/14, mais conhecida como o Marco Civil da Internet.
O texto, que determina os direitos e deveres do consumidor e das operadoras em relação ao acesso à internet no Brasil, não impede, explicitamente, que as empresas usem esse tipo de cobrança. O que a lei garante é que um usuário só pode ter sua navegação interrompida por conta de falta de pagamento, e apenas após a devida notificação.
Outros trechos do Marco Civil também podem ser usados para sustentar a tese de que o limite de dados é contra a lei. O artigo 9º, por exemplo, diz que o usuário deve receber “serviços em condições comerciais não discriminatórias”, e as operadoras só podem estabelecer “discriminação ou degradação do tráfego” mediante “requisitos técnicos indispensáveis à prestação adequada dos serviços e aplicações”.
O processo movido pela Proteste se encontra, neste momento, aguardando a apreciação da 5ª Vara Empresarial do Rio de Janeiro. A ação está parada lá desde dezembro de 2015, embora tenha sido iniciada em maio do ano passado. Inicialmente, a associação pediu a abertura de uma liminar contra as operadoras no Supremo Tribunal Federal, mas à pedido da Oi, o processo foi encaminhado para a instância mais baixa no TJ-RJ.
Por enquanto, porém, não há previsão para que a ação seja devidamente apreciada pela Justiça. Segundo Maria Inês Dolci, coordenadora institucional da Proteste, o trâmite sequer chegou à pauta do tribunal fluminense e não se sabe quando isso vai acontecer. “Já está demorando bastante”, ela diz, lembrando que a organização aguarda uma resposta há quase um ano.
A 1ª Promotoria de Justiça de Defesa do Consumidor (Prodecon) do Ministério Público do Distrito Federal também deu início a um processo que investigará essas ofertas da Vivo, Oi e NET. De acordo com o promotor Paulo Roberto Binicheski, a cobrança com limite de dados é desvantajosa para o consumidor.
“A proposta de alteração do sistema de cobrança reflete planos comerciais abusivos, com o propósito disfarçado de encarecer os custos de utilização da internet pelo usuário médio”, disse Binicheski em nota divulgada à imprensa. O Ministério Público exige que Anatel e operadoras encaminhem ao promotor os documentos referentes aos novos modelos de cobrança, incluindo cópias de contratos, comerciais exibidos na TV e um parecer técnico sobre a necessidade de instalação desses limites.
Procurada, a assessoria de imprensa do MP-DF não respondeu ao pedido da reportagem por novas informações. A ação da Proteste, por sua vez, tem valor de liminar, e, por isso, teria efeito imediato assim que aprovada. Sendo assim, resta ao consumidor esperar que um desses processos seja solucionado em tempo e que seus interesses não sejam prejudicados.
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