As pessoas têm formas e tamanhos diferentes. Alguns são mais altos, outros mais baixos, uns mais gordos, outros mais magros. Braços, pernas, dedos têm cumprimentos diferentes em cada ser humano. Entretanto, todos conseguimos reproduzir movimentos semelhantes, como segurar uma caneta ou chutar uma bola (com mais ou menos habilidade). Mas se você transplantasse seu cérebro para outro corpo, conseguiria fazer os mesmos movimentos?
Cientistas trocaram o cérebro de peixes virtuais para tentar responder essa pergunta. Parece uma coisa louca, mas tem explicação. Em um estudo apresentado na revista eLife, os pesquisadores modelaram computacionalmente os vários cérebros e corpos de uma espécie de peixe elétrico, o ituí transparente, ou sarapó barrigudinho (Eigenmannia virescens), para simular com sucesso um “transplante de cérebro” e investigar.
Esses peixes, naturais da América do Sul, buscam refúgio no capim que fica no leito dos rios. Eles nadam para trás e para a frente para permanecer ocultos, apesar das constantes mudanças nas correntes. Para isso, eles movem uma longa barbatana em forma de fita na parte inferior do corpo.
Os pesquisadores usaram câmeras para gravar grandes quantidades de dados sensoriais sobre os micro-movimentos sutis de três sarapós barrigudinhos. Depois de registrar quase 40 mil movimentos, os cientistas criaram modelos de computador do cérebro e do corpo de cada peixe, bastante distintos entre si. Em seguida, incorporando o Dr. Frankenstein da literatura, “transplantaram” o cérebro de cada modelo de computador para o corpo de diferentes modelos de peixes.
Essas trocas quase não tiveram efeito no comportamento de natação simulado dos peixes virtuais. Isso acontecia porque cada sarapó barrigudinho (adorei esse nome) usava o feedback sensorial para compensar incompatibilidades entre o cérebro e o corpo atual.
Com isso, o estudo sugere que – para alguns comportamentos – o cérebro de um animal não precisa ser ajustado com precisão às características específicas de seu corpo. Em vez disso, o controle do movimento depende mais dos sistemas que fornecem feedback sensorial.
“O que este estudo mostra é o profundo papel do feedback sensorial em tudo o que fazemos”, afirmou o principal autor do estudo, Eric Fortune, em um comunicado. “Trocar cérebros desses peixes é uma ótima maneira de abordar essa questão fundamental e entender melhor como podemos controlar nosso corpo”, completou.
Isso tem implicações para o campo da robótica, e podem ajudar engenheiros no desenvolvimento de sensores. Estudos adicionais podem melhorar o entendimento de como funciona a fisiologia muscular e as relações estatísticas complexas entre ativações musculares que permitem que os humanos superem os robôs quando trata-se de controlar o movimento do corpo.
“Os robôs são muito melhores que os humanos em termos de velocidades e força, mas você prefere apertar a mão de um humano ou robô? Qual é mais seguro?”, questiona Eric Fortune, professor do Departamento de Ciências Biológicas do Instituto de Tecnologia de Nova Jersey e autor do estudo. “O problema é de controle. Queremos ser capazes de criar robôs com desempenho tão bom quanto os humanos, mas precisamos de algoritmos de controle melhores, e é isso que estamos conseguindo nesses estudos”.