Produtos que esgotam quase instantaneamente nas vendas online. Lançamentos que, num piscar de olhos, já não existem mais. Já tentou comprar algo muito tentador em uma Black Friday pela internet?! Ou ingressos… logo que são anunciados e, curiosamente, desaparecem como num passe de mágica? Como assim? Esgotado?! Acredite, nem sempre são pessoas mais rápidas que você que fizeram essas compras. Robôs altamente treinados e inteligentes que executam tarefas específicas e repetitivas em milésimos de segundo se tornaram a principal arma dos chamados cambistas digitais. Usando bots, eles compram online antes de todo mundo para revender com preços inflacionados – e um dos principais alvos são ingressos.
O caso mais popular é o desse cara aí do outro lado da telinha. A gente conversou com Ken Lowson, acusado de comprar e revender 2 milhões e meio de ingressos entre 2001 e 2010 e lucrar nada menos que 25 milhões de dólares. Quando os agentes do FBI invadiram seu escritório no Arizona ele simplesmente se tornou o cambista digital mais famoso do mundo! Lowson foi acusado de hackear e fraudar o site da Ticketmaster, uma das maiores empresas de ingressos do planeta, usando um dos primeiros “bots de ingressos” da história.
O bot criado por Lowson ia além de preencher formulários em milésimos de segundo e encontrar ingressos no instante que entravam à venda. Os programas do ex-rockstar eram capazes de abrir milhares de pedidos nos servidores da empresa de ingressos a partir de diferentes máquinas. No auge da empresa, Lowson conta que tinha 30 servidores espalhados pelos Estados Unidos. Segundo ele, era possível comprar até 20 mil ingressos em poucos minutos. Ele afirma que, durante um bom tempo, reconhece que dominou 90% do mercado de venda de ingressos na América. Definitivamente, não estamos falando de bots simples…
Quando Lowson foi preso, os bots de ingressos ainda não eram ilegais nos Estados Unidos. Mas os agentes federais o acusaram de outros 42 tipos de fraudes eletrônicas com sentença máxima de 20 anos de prisão para cada condenação. A maior discussão girou em torno de como Lowson burlou o CAPTCHA – aquela imagem aleatória com números e caracteres desfigurados que deve ser identificado e digitado supostamente por um humano para dar andamento à transação – a única forma de proteção da Ticketmaster na época. Lowson então convenceu o júri que não havia burlado o sistema uma vez que conhecia os códigos. Em sua alegação, seus bots passaram pelo mesmo processo de compra de bilhetes como um ser humano, apenas muito mais rápido. Ele não havia pirateado o site! Por fim, em um acordo, Lowson foi somente condenado por conspiração para cometer fraude eletrônica e conseguiu liberdade condicional. Aquele lucro de 25 milhões de dólares foi quase todo usado para se defender no tribunal.
Recentemente, os Estados Unidos promulgaram uma lei nacional contra bots em processos de compra. No mês passado, pela primeira vez desde a proibição, duas empresas de ingressos com sede em Massachusetts foram condenadas a pagar 60 mil dólares em multas pelo uso dos softwares. O Reino Unido e o senado australiano debatem e defendem uma legislação similar para coibir o uso de bots em compras também.
“É preciso separar as duas coisas. Bots e leis. Uma coisa não tem nada a ver com a outra. É fácil vencer os bots. Minha filha de 10 anos poderia parar qualquer bot se ela tivesse, por exemplo, os registros de compras. Quem vende os ingressos originalmente, não quem revende (o cambista)…se eles não decidirem parar os bots, eles vão continuar lá!”, explica Ken Lowson, CEO da Tixfan.
É o que acontece. E Lowson ri quando comenta que uma empresa avaliada em 7 bilhões de dólares ainda não seja capaz de inibir esse tipo de “ataque” – se assim podemos chamar. Quase oito anos depois da prisão de Lowson, governos e empresas de ingressos afirmam continuar lutando para vencer a espécie de bot criado por ele. Pelo menos é o que dizem. No ano passado, a Ticketmaster anunciou o bloqueio de seis milhões de tentativas de usos de bots em seu site – uma taxa de mais de 11 mil acessos por minuto.
No maior buscador da internet, ao pesquisar sobre esse tipo de bot, o primeiro site que aparece é este: um canal de venda de bots exclusivo para atuar em compras de ingressos. Isso mesmo! Pagou, levou! E como eles se hospedam foram das jurisdições dos Estados Unidos, as leis simplesmente não pegam esses serviços, que normalmente estão em países pequenos sem muito controle do governo. Os bots são oferecidos de forma aberta, para qualquer um, por valores que variam entre 300 e mil dólares.
Hoje, Lowson mudou de lado. Não se considera um Robbin’ Hood, mas diz que sua atual empresa é a primeira companhia que está realmente tirando dinheiro das mãos dos cambistas e usando inteligência para devolver a oportunidade para que os verdadeiros fãs de times ou artistas tenham acesso às entradas em primeira mão. Sobre tecnologia? Ele garante que não usa mais bots…