Vacina contra Covid-19: como os diferentes projetos querem imunizar humanos?

Entenda os diferentes métodos para produzir uma vacina e os prós e contras de cada uma dessas técnicas
Renato Santino22/05/2020 23h48, atualizada em 23/05/2020 00h30

20200522092410-1920x1080

Compartilhe esta matéria

Ícone Whatsapp Ícone Whatsapp Ícone X (Tweeter) Ícone Facebook Ícone Linkedin Ícone Telegram Ícone Email

Neste momento, cientistas no mundo inteiro correm para desenvolver uma vacina funcional contra Covid-19. Tradicionalmente, a criação de um composto do tipo é um processo demorado, que pode demorar mais de uma década. No entanto, com tanto dinheiro sendo investido no desenvolvimento de uma solução, é possível que a vacina contra o coronavírus Sars-Cov-2 seja a mais rápida da história.

Há mais de uma centena de vacinas em processo de testes neste momento, embora algumas delas já estejam em fases mais avançadas de testes. No entanto, ainda que o objetivo seja o mesmo, o de induzir o organismo a criar imunidade contra a Covid-19, laboratórios estão apostando em métodos diferentes para chegar até esse resultado.

Algumas dessas técnicas são velhas conhecidas; outras, no entanto, são uma novidade, que não foi aplicada em nenhuma outra vacina disponível no momento.

Conheça e entenda as principais técnicas em uso para o desenvolvimento da vacina a seguir:

Vacina genética

Nesta semana, a farmacêutica Moderna, dos Estados Unidos, anunciou resultados positivos na primeira etapa de testes clínicos com seu projeto de vacina, mostrando-se segura e desenvolvendo resposta imunológica em alguns dos pacientes que fizeram parte do grupo de 45 participantes.

A Moderna, assim como a americana Pfizer, que também está na corrida por uma vacina, utiliza uma técnica nova, baseada em genes. Aqui, o objetivo não é injetar pedaços do vírus ou o vírus inativado no organismo para deixar que ele desenvolva os anticorpos. Na verdade, o que acontece é uma etapa anterior: injeta-se material genético no corpo para que a própria célula crie as proteínas do Sars-Cov-2, que podem gerar a resposta do sistema imunológica.

Quando o vírus invade o organismo, ele utiliza uma proteína chama de “spike” para injetar seu material genético nas células, permitindo utilizá-la para se reproduzir livremente. Essa proteína, em forma de espinho (daí o nome “spike”) é o que dá ao coronavírus seu formato. A ideia é fazer com que o próprio organismo humano produza essa proteína, sem risco de infecção pelo Sars-Cov-2, e desenvolva os anticorpos para ela. Se o vírus entrar no organismo, não deve conseguir usar a proteína para atacar as células.

Ao fazer isso, na prática, é o corpo humano que está produzindo a própria vacina.

Essa técnica tem uma vantagem grande: ela é fácil e rápida de se produzir, o que explica a velocidade com que a Moderna está avançando em suas pesquisas e permitiria a produção rápida das doses em caso de aprovação. No entanto, historicamente não há uma vacina desenvolvida e aprovada para humanos utilizando este método até hoje, sinal de que os experimentos com pessoas até hoje não se mostraram satisfatórios.

Reprodução

Os “espinhos” do coronavírus são uma proteína importantíssima para infectar o corpo humano

Vacinas com vetores virais

O maior exemplo aqui é a vacina desenvolvida pela universidade de Oxford. A pesquisa da instituição britânica, que já chegou a prometer conclusão para setembro, não utiliza o Sars-Cov-2 para desenvolver a imunidade contra Covid-19.

O que os pesquisadores fazem é utilizar um outro vírus modificado. No caso da vacina de Oxford, utiliza-se um adenovírus geneticamente alterado para ser incapaz de produzir doenças no organismo humano. Ele também recebe a parte do código genético do Sars-Cov-2 responsável pela produção da proteína “spike”.

Quando injetado no organismo, o vírus não causa doença, mas produz a proteína que deve ser bloqueada pelo sistema imunológico. Assim, os pesquisadores esperam que o corpo possa se proteger em caso de infecção real de Covid-19.

A vantagem desse método é que a resposta imunológica a um vírus ativo, ainda que alterado e incapaz de se multiplicar e provar uma doença, tende a ser mais forte. Isso é importante porque uma dose pode ser o suficiente, o que é chave durante a pandemia, em um momento em que já é difícil produzir e distribuir uma dose para cada pessoa.

No entanto, essa técnica também é experimental e nunca foi aprovada para uso em humanos antes. Também há o risco de que algumas das pessoas já tenham contraído o adenovírus utilizado no desenvolvimento da vacina, o que faria com que seu organismo não desenvolva uma nova resposta imunológica, tornando sua aplicação ineficaz.

Vírus enfraquecido

Esse é um método mais tradicional de vacina, que consiste em usar o próprio Sars-Cov-2 enfraquecido ou inativado. É o modo mais conhecido que inclusive costuma ser ensinado nas escolas quando se fala sobre o assunto. A chinesa Sinovac já demonstrou que o método é capaz de imunizar macacos contra a doença.

A ideia é simples: colocar o vírus, já enfraquecido previamente com calor ou radiação, dentro do organismo, deixando-o produzir a resposta imunológica como se estivesse enfrentando o vírus real. Como o vírus foi previamente danificado, ele não deve desenvolver a doença quando injetado no corpo humano.

Essa técnica pode envolver o vírus em um estado inativo, totalmente incapaz de se reproduzir dentro do corpo, ou enfraquecido, no qual ele ainda está levemente ativo, mas com menos capacidade de desenvolvimento de doença, que tende a produzir uma resposta imunológica mais forte. A segunda opção, no entanto, pode acarretar riscos em pessoas que já têm problemas de imunidade. Como se lida com o vírus real, testes de segurança são cruciais para garantir que as pessoas vacinadas não acabarão contraindo a doença contra a qual estão testando ser imunizadas.

O ponto forte desse método é o fato de que ele já é amplamente conhecido, testado e aprovado, e existem várias vacinas que utilizam essa ferramenta para gerar imunidade contra, por exemplo, gripe, varíola, poliomielite, catapora, sarampo, febre amarela e tantas outras. No entanto, ela é muito mais difícil de ser produzida em massa, porque os pesquisadores precisam produzir quantidades colossais do vírus para depois enfraquecê-los ou inativá-los. Em uma situação normal, essa dificuldade não é um fator tão importante, mas quando se fala em uma pandemia global que precisa ser sanada com agilidade, isso se torna um grande obstáculo.

Vacina baseados em proteínas

Como já falamos acima, o que faz o coronavírus ser capaz de infectar as células é a proteína “spike”, em formato de espinhos. Neste tipo de vacina, os pesquisadores buscam injetar essa proteína diretamente no organismo, sem o restante do vírus, para que o corpo desenvolva a resposta.

Podem ser utilizadas subunidades proteicas, que são apenas as proteínas, acompanhadas de outras moléculas que estimulem a resposta biológicas, ou partículas similares ao vírus. Neste caso, o que se cria é um invólucro do Sars-Cov-2, com todo o seu exterior, mas sem a capacidade de reprodução, já que não conta com material genético, tornando-o incapaz de desenvolver a doença no corpo humano.

Essa técnica não é inédita. Ela já é usada, por exemplo, na vacina contra o HPV. Pesquisadores sabem exatamente o que fazer para desenvolvê-la. No entanto, há alguns pontos negativos. Por não conter um vírus ativo, a imunidade gerada por ela pode ser frágil, requerendo mais de uma dose, o que pode forçar a produção a ser dobrada, o que não é simples de fazer quando se fala em bilhões de aplicações.

Fontes: Nature e The Verge

Renato Santino é editor(a) no Olhar Digital