Estudo conclui que imunidade ‘de rebanho’ natural contra Covid-19 é inviável

Pesquisa espanhola indica que esse tipo de abordagem não é possível sem aceitar um volume enorme de mortos e sobrecarga de sistemas de saúde
Renato Santino06/07/2020 20h54, atualizada em 06/07/2020 21h00

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Desde o início da pandemia de Covid-19, há grupos de pessoas que defendem a imunidade coletiva (ou “de rebanho”) como a melhor alternativa para lidar com doença, apostando que o vírus deixaria de se tornar uma ameaça quando um percentual grande o suficiente de uma população for contaminada e desenvolver anticorpos. No entanto, uma pesquisa publicada nesta segunda-feira (6) indica que este patamar é simplesmente inatingível sem causar um volume alto de mortes.

A pesquisa publicada na revista científica The Lancet, foi conduzida por cientistas espanhóis, que analisaram exames de anticorpos de 61 mil pessoas no país em uma das campanhas mais extensivas sobre o assunto no continente europeu.

O estudo ratifica dados divulgados em caráter preliminar que apenas 5% da população espanhola tem os anticorpos contra o Sars-Cov-2, o que equivale a cerca de 2,35 milhões de pessoas. Isso também pode significar que 95% da população ainda não desenvolveu imunidade contra o vírus.

Os dados mostram que, apesar da crise intensa vivida pela Espanha em março e abril, os danos poderiam ter sido muito maiores, já que a maioria ainda está vulnerável. Com tantas pessoas ainda suscetíveis ao vírus e mais de 28 mil mortes contabilizadas até o momento, os pesquisadores concluem que não é possível atingir a tal imunidade de rebanho naturalmente “sem aceitar o dano colateral de muitas mortes na população suscetível e a sobrecarga dos sistemas de saúde”.

Os resultados geraram comentários preocupados de Isabella Eckerle, diretora do Centro de Genebra para Doenças Virais Emergentes, e Benjamin Meyer, virologista na Universidade de Genebra, que publicaram suas opiniões sobre o estudo na The Lancet. “Diante dessas descobertas, qualquer abordagem para alcançar a imunidade de rebanho por infecção natural não é apenas antiética, mas também inalcançável”, diz o texto.

A Espanha tem cerca de 47 milhões de habitantes, e mais de 44 milhões deles ainda não foram contaminados. Com uma letalidade estimada em 1,2% graças ao estudo, seria possível extrapolar que, se 70% da população for contaminada, que é um percentual comum nas discussões de imunidade de rebanho, haveria cerca de 400 mil mortes no país. Reduzindo o patamar de imunidade para 50% da população, ainda são 280 mil óbitos.

O estudo também concluiu que, mesmo nas áreas mais afetadas pelo vírus, nos arredores da capital Madri, a maioria esmagadora da população não tem anticorpos e ainda está suscetível. Nas áreas mais afetadas, a seroprevalência não chega a 14%.

Paralelamente a isso, a pesquisa também permitiu entender outros fatos sobre a Covid-19. Segundo o estudo, um terço dos pacientes com anticorpos contra o coronavírus não demonstraram sintomas, o que é uma fatia bem maior do que os 9% relatados em um estudo brasileiro recente divulgado pela Universidade Federal de Pelotas.

Renato Santino é editor(a) no Olhar Digital