Covid-19 pode induzir anticorpo que ataca o paciente em vez do vírus, diz estudo

Pesquisa aponta que, em alguns pacientes, a infecção viral pode despertar uma resposta autoimune que pode agravar a doença e gerar complicações de longo prazo
Renato Santino27/10/2020 22h30

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A cada dia de pandemia, a ciência descobre novas informações que podem auxiliar no tratamento dos doentes de Covid-19. Agora, pesquisadores relataram uma condição autoimune que pode ser causada pela infecção, com a produção de anticorpos que atacam o próprio organismo em vez de protegê-lo do vírus.

O preprint divulgado na última semana, ainda sem revisão da comunidade científica, por pesquisadores da Universidade Emory, nos Estados Unidos, acompanhou 52 pacientes com Covid-19 em estado grave, que precisaram receber tratamento na UTI. Nenhum deles tinha um histórico de doenças autoimunes, mas em mais da metade deles foi detectado a presença de autoanticorpos, que atacam o próprio corpo.

Os pesquisadores acreditam que essa constatação indica que essa reação do organismo pode estar ligada às formas mais graves da doença, além de explicar por que algumas pessoas apresentam complicações por muito tempo, em vez de se curarem rapidamente. O estudo defende que alguns dos pacientes podem se beneficiar de tratamentos contra outras doenças autoimunes, como lúpus e artrite reumatoide.

Como explica o New York Times, esse tipo de reação causada por uma infecção viral não é tão incomum. Os vírus fazem as células morrerem, mas ocasionalmente elas acabam deixando um pedaço do DNA exposto. Enquanto isso, anticorpos funcionam reconhecendo o RNA viral e ligando-se ao vírus para impedir que ele invada as células. Só que, em algumas situações, em vez de o sistema imunológico reconhecer o RNA, ele encontra o DNA do próprio corpo exposto e produz uma resposta contra ele, fazendo com que anticorpos comecem a atacar o organismo. Essa é a causa de doenças como a lúpus, e parece estar acontecendo com alguns pacientes de Covid-19.

Como relatam alguns dos cientistas consultados pelo NYT, alguns dos autoanticorpos identificados no estudo podem estar ligados com a alteração no fluxo sanguíneo. Ann Marshak-Rothstein, imunologista e especialista em lúpus da Universidade de Massachusetts em Worchester, explica que, por causa desse detalhe, é possível que a reação imune do corpo esteja ligada aos coágulos que costumam atingir alguns dos pacientes de Covid-19.

Também existe uma possibilidade de que esses autoanticorpos tenham vida longa no organismo, causando transtornos prolongados para o paciente, ou até mesmo permanentes aos sobreviventes, como acontece com a própria lúpus, que não tem cura, apesar de ser tratável.

Agora ficará a cargo da comunidade científica investigar essa possibilidade mais a fundo para validá-la ou reprová-la. Não é difícil realizar testes para detectar autoanticorpos, então não deve demorar para que outras equipes constatem se eles realmente são uma ameaça de alteração no sistema imunológico ou se trata de uma anomalia do estudo que não é a realidade dos pacientes.

Renato Santino é editor(a) no Olhar Digital