A pandemia de coronavírus acelerou o declínio da liberdade na internet. A conclusão é do relatório global da organização de direitos humanos e digitais Freedom House. O estudo sugere que governos aproveitaram o cenário de instabilidade para expandir a vigilância e cercear a liberdade de expressão e na web. É o décimo ano consecutivo em que a organização detecta deteriorações nos direitos na web.
O diretor do setor de democracia e tecnologia da Freedom House, Adrian Shahbaz, afirmou que líderes políticos usaram a pandemia como um pretexto para atacar a liberdade de expressão e o acesso à informação. “Nós rastreamos três táticas comumente usadas. Primeiro, em ao menos 45 países, ativistas, jornalistas e outros membros do público foram presos ou acusados de ofensas criminais por declarações online relacionadas à pandemia.
Segundo, em pelo menos 20 países, governos citaram a emergência da pandemia para impor restrições vagas ou abrangentes demais à liberdade de expressão. Terceiro, governos de pelo menos 28 países censuraram websites e posts em redes sociais com estatísticas de saúde desfavoráveis, alegações de corrupção, e outros conteúdos relativos à Covid-19″, disse.
Tecnologias de vigilância
O relatório aponta que as autoridades usaram a Covid-19 como justificativa para expandir sua capacidade de vigilância, inclusive com o desenvolvimento de novas tecnologias invasivas. A crise na saúde pública teria aberto caminho para a coleta, digitalização e análise de dados pessoais íntimos sem a instituição de proteções adequadas contra abusos.
Aplicativos para manter contato com pacientes de Covid-19 foram implantados em pelo menos 54 países, mas nem sempre com boas práticas. Em locais como a Rússia, por exemplo, o app pode acessar não somente dados de GPS, como também outras informações, incluindo registros de ligações. A plataforma chega até a solicitar que os usuários enviem selfies para comprovar que estão em quarentena. No entanto, a iniciativa teria resultado em multas excessivas para os usuários. Além disso, teriam sido cometidos erros de identificação e punições para quem não atendeu ligações de checagem.
Organização avalia que cenário da pandemia foi usado como desculpa para imposição de medidas invasivas. Foto:Andry5/iStock
Pelo menos 30 países teriam desenvolvido iniciativas que vão ainda mais longe, normalmente com a ajuda de empresas de tecnologia e telecomunicações. Um dos exemplos apontados é o do Equador. As autoridades de saúde locais criaram uma plataforma que combina dados pessoais de um aplicativo sobre o coronavírus e imagens de câmeras de vigilância com outros dados de localização como satélites e celulares dos cidadãos.
Resultados alarmantes
O relatório abrange 65 países que, de acordo com a organização, representam 87% dos usuários de internet de todo o mundo. A análise é referente ao período de junho de 2019 até maio de 2020, englobando não somente a pandemia, mas também a disputa pela dominância digital entre Estados Unidos e China. O país asiático ficou em último lugar no ranking de liberdade na internet pelo sexto ano consecutivo.
Além de violações relacionadas à pandemia, como a instalação de webcams na casa de cidadãos para vigiar o cumprimento de quarentena, a China ainda teria acessado informações dos celulares de pessoas e reprimido ativistas pró-democracia em Hong Kong.
Avanços positivos também foram identificados
Apesar dos dados preocupantes, a organização verificou também que avanços foram verificados. Enquanto 26 países pioraram sua posição no ranking, em comparação com o ano passado, 22 obtiveram resultados melhores. O relatório cita avanços em nações como África do Sul, Alemanha e até mesmo o Brasil.
Nosso país foi considerado “parcialmente livre” com uma pontuação de 63. De acordo com a classificação do relatório, as nações podem ter nota de 100 (maior liberdade) a 0 (menos liberdade). Os considerados “livres” apresentaram pontuação entre 100 e 70, os “parcialmente livres” de 69 a 40 pontos e os “não livres” de 39 a 0 pontos.
A organização defende que a causa pela liberdade na internet demande mais do que simplesmente políticas que respeitam os direitos básicos. Para a Freedom House, é preciso que sejam criadas estruturas robustas para consagrar e garantir o cumprimento dessas proteções.
Fontes – Wired e Freedom House