No início da semana, o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) anunciou o resultado de um estudo com a nitazoxanida, conhecida também pelo nome comercial Annita, que teria “comprovado a eficácia” do medicamento contra Covid-19, mas sem divulgar nenhum dado. Agora, as informações foram publicadas em forma de preprint, ainda não publicado em nenhuma revista científica, e os resultados mostram que não é bem assim.
O estudo, com 392 participantes, foi pensado para acompanhar casos leves de Covid-19, com o tratamento para aplicado até 3 dias dos primeiros sintomas. O resultado principal esperado era a redução dos sintomas febre, tosse e fadiga após um tratamento de 5 dias com o medicamento, mas não houve uma diferença significativa na melhora dos pacientes tratados com nitazoxanida e os que receberam apenas um placebo.
A pesquisa concluiu, sim, uma redução da carga viral no organismo, o que pode ser um sinal positivo. No entanto, não foi observado um benefício clínico resultante desta redução. O fato de o estudo ser direcionado para casos leves da doença também não ajuda a traçar vantagens da redução. Como explica ao G1 o virologista Anderson Brito, pesquisador da Universidade de Yale, nos EUA, estudos já traçaram um paralelo entre casos graves e a altas cargas virais, mas não foi nesse cenário em que o medicamento foi testado e o medicamento não demonstrou capacidade de evitar que a doença evolua para quadros mais sérios.
Além de o estudo chegar a uma conclusão desfavorável ao uso da nitazoxanida para o uso contra Covid-19, especialistas têm criticado a metodologia dos testes, que parece frouxa. O experimento deveria seguir o que se chama de “duplo-cego”, em que nem participantes nem pesquisadores sabem se está sendo aplicado o medicamento ou um placebo, mas a droga tem um efeito colateral de alteração da cor da urina do paciente, que pode ficar verde. Assim, não foi difícil para os envolvidos saber a qual grupo cada voluntário pertencia, o que pode criar vieses indesejados e afetar os resultados. Também é criticada uma troca de critérios com os estudos em andamento, o que também pode criar vieses.
No entanto, um possível efeito positivo dessa redução da carga viral pode estar ligado à transmissibilidade do vírus, o que seria um benefício epidemiológico, e não clínico, potencialmente reduzindo os riscos de passar a Covid-19 adiante. No entanto, o estudo não investigou essa possibilidade. Como explica ao G1 o infectologista Alberto Chebab, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (URFJ), “não dá para afirmar que diminuiu risco de contágio somente por diminuir carga viral e que não precisa mais fazer isolamento”.
Resultado contraria anúncio do governo
Na segunda-feira (19), o governo fez questão de ressaltar que o medicamento tinha “eficácia cientificamente comprovada”. No entanto, o estudo mostra o resultado exatamente contrário, sem demonstrar um efeito positivo claro no tratamento da Covid-19.
Na ocasião, foi apresentado um gráfico com uma animação comprada no banco de imagens Shutterstock que tentava indicar uma redução de algo (supostamente da carga viral). No entanto, como descrito acima, a redução foi apenas um resultado secundário, que não demonstrou vantagens no tratamento dos pacientes.