Quem é o “dono” das séries?

Wharrysson Lacerda11/08/2019 02h40

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A noção de autoria acompanha o cinema desde que alguns teóricos o defenderam como uma arte. Nos anos 1920, sobretudo na França, essa noção serviu para o entendimento de que o verdadeiro dono criativo de um filme era seu diretor, não o ator ou o produtor.

Nos anos 1950, a ideia se tornou mais difundida a partir dos textos dos jovens turcos (críticos como François Truffaut e Jacques Rivette, que logo depois seriam diretores da Nouvelle Vague francesa) da prestigiada revista Cahiers du Cinéma. Para eles, um mau filme de um autor valia mais do que um bom filme de um não autor. Polêmico, mas tirando esse exagero, a ideia é bem válida. Ela chegou aos EUA nos anos 1960 e hoje é bem conhecida na cinefilia e no jornalismo cultural.

Mas no cinema existem autores como Alfred Hitchcock, Martin Scorsese, Quentin Tarantino ou Agnès Varda. E nas séries? Existe essa noção de autoria? Se existe, essa autoria deve ser atribuida ao criador ou dividida entre produtores, atores e diretores e roteiristas da maioria dos episódios?

Tomemos por exemplo Breaking Bad, série muito conhecida e cultuada desde sua primeira temporada, de 2008. O criador é Vince Gilligan, que depois assinaria a criação de Better Call Saul, o famoso spin off, com Peter Gould. Seria prudente atribuir a Gilligan a autoria de Breaking Bad, uma vez que ele também escreve e dirige os episódios mais importantes (geralmente o primeiro e o último de cada uma das cinco temporadas).

Mas como tirar de Bryan Cranston uma boa parcela dessa autoria? A série simplesmente não existiria com outro ator, ou seria totalmente diferente, tamanha a propriedade com a qual ele cria (palavra-chave aqui) o personagem do professor de química que se torna traficante após descobrir que tem câncer.

É certo que muitos filmes só se justificam com alguns atores que incorporam certos personagens a ponto de não conseguirmos imaginar outros atores em seus lugares. Mas em série esse fator é potencializado, sobretudo pelo efeito maratona, e assim pode-se configurar uma autoria. Somando os 62 episódios liderados por Cranston, temos mais ou menos a duração de 31 longas metragens com o mesmo protagonista. É muita coisa para que ele não seja considerado também um autor. Ainda mais porque a partir da terceira temporada ele começa a assinar também como produtor.

A noção de autoria, por tudo isso, sofre uma distorção, ou a necessidade de uma nova definição, a partir do momento em que as séries começam a ocupar uma boa fatia do que antes era dedicado quase que exclusivamente aos adultos: o entretenimento caseiro com forte ambição artística.

Sérgio Alpendre (a partir de um pensamento de Edilson Teixeira)

Editor(a) chefe

Wharrysson Lacerda é editor(a) chefe no Olhar Digital