Robert Pattinson e Willem Dafoe estrelam ‘O Farol’, segundo longa-metragem de Robert Eggers, que havia nos encantado com ‘A Bruxa’, há mais de três anos. Eles interpretam dois homens que devem cuidar de um farol, numa ilha rochosa e deserta (se não contarmos as sereias) próxima a Maine, EUA, no final do século 19.
Em 1959, o italiano Ermanno Olmi estreava em longa com ‘O Tempo Parou’, sobre dois homens isolados numa montanha, cuidando de uma barragem no lado italiano dos alpes. Não é um filme de horror, como ‘O Farol’, e sua história vai para um lado totalmente diferente. Mas se beneficia muito mais de uma atmosfera de solidão e loucura do que este novo filme.
Eggers até que começa bem. Impõe respeito de cara com imagens fortes em preto e branco, com enquadramento verticalizado pelo formato pouco usual (1.19:1, como nos filmes dos anos 1910), remetendo ao cinema mudo. Mais adiante, começa a usar uma câmera móvel, mas criteriosa, com movimentos verticais para dar conta da altura do farol (que divide o protagonismo com os dois homens).
O personagem de Dafoe, por ser mais velho e já ter trabalhado por muitos anos na guarda do farol, tem ascendência sobre o personagem de Pattinson, mas não é o tipo de pessoa que busca a justiça do alto de seu poder. Isto vai gerar algum incômodo já de início, principalmente porque Dafoe não consegue deixar de implicar por pequenas coisas (a embriaguez do poder).
E por falar em embriaguez, é após a primeira bebedeira que cai a relação patrão-empregado entre os dois e acentua-se uma briga pela luz do farol. E já que estamos falando de um farol, é óbviamente uma briga entre dois homens que precisam constantemente medir o tamanho de seus falos para ver qual é o maior (as cenas de masturbação de Pattinson beiram o constrangedor).
E é a partir dessa bebedeira que ‘O Farol’ começa a cair até virar um farolete com defeito. A câmera deixa de ser criteriosa para ser movida muito mais por uma afetação de diretor badalado do que por uma adequação narrativa. Os atores deixam a contenção de lado e partem desavergonhadamente para o overacting (já na bebedeira, com a sucessão constrangedora de Whats que já víamos no trailer) – e tornou-se comum no cinema contemporâneo termos um diretor que não controla (pela pouca experiência ou pela limitação estética) os exageros de seus atores, vide Coringa.
A ideia do farol como um símbolo fálico é evidente e manjada, e não me espantaria se Robert Eggers tivesse visto o excelente filme português Que Farei Eu Com Esta Espada? (1975), de João César Monteiro, que também dialoga com o ‘Nosferatu’ de Murnau e com símbolos fálicos (lá, principalmente, canhões apontados para o Tejo).
Mas Eggers não sabe muito bem o que fazer com o material que tem nas mãos e acaba caindo num horror francamente adolescente, com imagens e delírios para impressionar os impressionáveis (ideia do crítico Inácio Araujo a respeito de outro filme) e perdendo o controle da narrativa. Em ‘A Bruxa’, Eggers foi hábil o suficiente para construir uma atmosfera que permitisse um clímax potente e delirante. Desta vez, foi ansioso, e permitiu que o delírio tomasse conta cedo demais, desequilibrando todo o filme.
* Sérgio Alpendre é crítico e professor de cinema