Entre Facas e Segredos

Filme decepciona como thriller, mas se destaca como sátira a uma burguesia branca que defende a "América para os americanos"
Redação18/12/2019 14h32

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O diretor Rian Johnson passou pela franquia Star Wars. Portanto, é um diretor totalmente sintonizado com Hollywood. Star Wars é uma saga em que nações desérticas representadas por filósofos, místicos e guerreiros que lutam apenas para se defender, estão em constante duelo com forças imperialistas e expansionistas. Star Wars, como 90% da Hollywood dos últimos anos, deve ser vista como comunista por aqueles que acham que tudo que não é extrema direita é comunista. Poderiam boicotar Hollywood, já que Hollywood é comunista. Mas se boicotarem Hollywood, farão exatamente o que os comunistas querem. 

A brincadeira acima é só para mostrar que misturar ideologia com arte costuma dar enjoos. Mas o fato é que Entre Facas e Segredos, de Rian Johnson, se não é lá muito forte como thriller de assassinato e mistério, é muito forte como sátira a uma burguesia branca que defende a “América para os americanos” e outras idiotices que não tem nada a ver com a auto propalada “terra das oportunidades”.

O longa começa mal, muito mal. Dá toda a pinta que será um fiasco. Idas e vindas no tempo dão conta de um interrogatório. Elliott (LaKeith Stanfield) interroga os membros da família Thrombey, cujo patriarca, Harlan (Christopher Plummer) teria se suicidado na noite de seu aniversário. Um outro detetive, o famoso e pitoresco Benoit Blanc (Daniel Craig), é contratado anonimamente, e desconfia de assassinato. Com o interrogatório, os detetives percebem que vários familiares tinham seus motivos para matar o patriarca, tanto os filhos Linda (Jamie Lee Curtis), Walt (Michael Shannon) e Joni (Toni Collette), quanto os cônjuges Richard (Don Johnson), Donna (Riki Lindhome) e os netos Meg (Katherine Langford) e Ransom (Chris Evans).

Outra suspeita é Marta Cabrera (Ana de Armas), imigrante uruguaia contratada para ser enfermeira e cuidadora de Harlan. A mãe de Marta está ilegal no país, e por isso a investigação a preocupa. Ela sofre ainda de um distúrbio curioso que faz com que ela regurgite sempre que mente (uma espécie de detector de mentiras que os detetives usam com frequência.

A horas tantas, percebemos logo que mais importante que ver como o mistério será revelado é atentar para a ironia com que Johnson opera (com seu próprio roteiro) a decadência dessa família com a partida do patriarca e provedor. São todos vagabundos às custas do trabalho e da inteligência de Harlan, mas usam o discurso Wasp como maneira de esconder a própria mediocridade.

Filme de roteiro, então, já que a direção de Johnson beira a mediocridade no quesito enquadramentos e durações dos planos. E de atores, o que não chega a ser um mérito da direção, pois todos têm carisma e experiência o suficiente para saber até onde cada personagem pode ir. Daniel Craig, sobretudo, está excelente, ainda que possamos estranhar o seu sotaque no início (um britânico fazendo sotaque de Louisiana). E Ana de Armas, que ironicamente (e provavelmente de propósito, dado o caráter anti-Trump do filme) é cubana, está incrível num papel que só parece fácil, mas apresenta um monte de armadilhas.

A destacar a presença de Frank Oz, ator que interpreta o advogado que lê o testamento e que como diretor realizou alguns filmes interessantes em que roteiros engenhosos envolvendo crimes são materializados por grandes atores. A esta altura, não é difícil perceber que sua escalação não aconteceu por acaso. 

Colaboração para o Olhar Digital

Redação é colaboração para o olhar digital no Olhar Digital