Parte 4: O cinéfilo
O Allen cinéfilo é o Allen que fala do mundo do cinema, ou remete a ele via alusão. Memórias, por exemplo, é ao mesmo tempo um belo filme de crise criativa e uma homenagem explícita ao Oito e Meio de Fellini. Assim como A Era do Rádio é ao mesmo tempo uma homenagem ao rádio como elemento de união familiar e uma homenagem ao Amarcord de Fellini. Ou seja, o Allen cinéfilo é predominantemente felliniano.
Memórias (1980)
Sharon Stone aparece numa breve cena de sonho, e o diretor interpretado por Woody Allen promove algumas ótimas piadas (a de Narciso/Zeus é a melhor). Allen repete o preto e branco de Manhattan, mas faz um filme menos palatável e nem sempre compreendido por críticos e mesmo por seus admiradores.
A Era do Rádio (1987)
Filme de memórias, à maneira do Amarcord de Fellini, com uma recriação de época brilhante e um ritmo que parece se espelhar na música dos anos 1940. É um dos longas mais “gostáveis” do diretor, ainda que raramente apareça entre os seus melhores (e talvez não seja mesmo, apesar de ser delicioso).
Neblina e Sombras (1991)
Um filme um tanto difícil, mas a que devemos voltar com maior atenção. Ele surge logo após o pior filme de Allen, Simplesmente Alice (1990), após uma fase extremamente irregular, que deu tanto uma outra bomba como Setembro (1987) quanto uma obra-prima como A Outra (1988). É sobretudo uma homenagem de Allen ao expressionismo alemão, com piscadelas para Bergman e Fellini.
Dirigindo no Escuro (2002)
Aqui trata-se de um cineasta em decadência que, após uma chance com um produtor inescrupuloso, é tomado de uma anomalia que o deixa temporariamente cego. Com medo de perder a oportunidade, ele dirige o filme com alguns poucos cúmplices, e nos diverte à beça com um tipo de humor físico que parecia enterrado em sua carreira.
Café Society (2016)
Um triângulo amoroso entre um perigoso agente de talentos (Steve Carell), uma secretária que originalmente queria ser atriz (Kristen Stewart) e um aspirante a um lugar ao sol (Jesse Eisenberg) transitam numa Hollywood dos anos 1930 (ou seja, em meio à era de ouro dos estúdios, com uma breve pausa poucos anos depois da quebra da bolsa). Acima de tudo um filme muito charmoso, fotografado brilhantemente por Vittorio Storaro.