Nesta longa quarentena que está apenas no começo, é necessário nos ocuparmos com aquilo que nos distrai e nos mantém apaixonados. Em nosso caso, o cinema. Por isso iniciarei aqui uma série de indicações de filmes nas diversas plataformas de streaming, uma a uma.

Começando por aquela que, até dia 15 de abril, coloca todo o seu catálogo em gratuidade. Basta apenas se inscrever rapidamente para curtir as obras-primas que estão por lá. Talvez seja o melhor catálogo de filmes disponíveis em streaming no Brasil.

Por isso, aproveite, sem preconceito contra filmes antigos, por favor, que quem perde é você.

Os 10 escolhidos (entre dezenas de opções maravilhosas)

01. Aurora (F.W. Murnau, 1927)

Primeiro filme americano do alemão Murnau (de “Nosferatu”, 1922), sobre um caso de adultério que quase termina em tragédia. Uma obra-prima para quem tem coragem de ver filmes sem cores e sem diálogos. Hollywood, comprovadamente, não seria a mesma sem “Aurora”.

Gostou? Experimente “Metropolis” (Fritz Lang, 1927), do outro grande do expressionismo alemão.

02. A Regra do Jogo (Jean Renoir, 1939)

Diretor fundamental para o cinema moderno, realiza aqui um jogo em que a hipocrisia da burguesia (a qual pertencia) é desnudado violentamente.

Gostou? Experimente O Anjo Exterminador (Luís Buñuel, 1962), obra-prima já indicada aqui: dev.olhardigital.com.br/cinema-e-streaming/noticia/o-anjo-exterminador/99028

03. Ser ou Não Ser (Ernst Lubitsch, 1942)

Trama de espionagem e aventura em que um ator se envolve em uma trama na Polônia ocupada pelos nazistas. Só Lubitsch mesmo para tratar um tema desses com leveza e respeito.

Gostou? Experimente os vários filmes de Éric Rohmer que estão no catálogo.

04. Contos da Lua Vaga Depois da Chuva (Kenji Mizoguchi, 1953)

Uma história de fantasmas em um dos dramas históricos mais pungentes da história do cinema. Mizoguchi, mestre do movimento, em contraposição a Ozu, mestre da câmera estática.

Gostou? Experimente “Era Uma Vez em Tóquio” (1953), feito no mesmo ano pelo outro gigante do cinema japonês, Yasujiro Ozu (de certo modo um adversário de Mizoguchi).

05. Rocco e Seus Irmãos (Luchino Visconti, 1960)

As obsessões realistas e operísticas de Visconti encontram neste filme a mais perfeita equação. Sobre uma família de sulistas que migra para o norte da Itália e inicia um dolorido processo de desintegração.

Gostou? Experimente o outro de Visconti que há no catálogo: “Morte em Veneza” (1971).

06. A Morte de um Burocrata (Tomás Gutierrez Alea, 1966)

As dificuldades de uma família para enterrar o patriarca falecido rendem uma crítica à burocracia cubana e um dos filmes mais engraçados de todos os tempos.

Gostou? Experimente os filmes do ótimo René Clair, os franceses “Sob os Tetos de Paris” (1930) e “Por Ternura Também se Mata” (1957), e o americano “Casei-me com uma Feiticeira” (1942).

07. Andrei Rublev (Andrei Tarkovski, 1967)

O cinema moderno soviético tem sua afirmação com este longo e delirante painel da Idade Média russa disfarçado de biografia do pintor de ícones que dá título ao filme.

Gostou, experimente “Solaris” (1972) e “Stalker” (1979), outras obras-primas de Tarkovski, ou, por sua conta e risco, “Vá e Veja” (Elem Klimov, 1985), sub-Rublev, mas com fãs ardorosos.

08. Dersu Uzala (Akira Kurosawa, 1975)

O filme de exílio de Kurosawa, após sua tentativa de suicídio. Feito na Rússia, fala de uma amizade improvável no tom épico e grandioso do diretor.

Gostou? Experimente o outro de Kurosawa, “Trono Manchado de Sangue” (1957), sua particular leitura do “Macbeth” de Shakespeare.

09. O Fundo do Coração (Francis Ford Coppola, 1982)

O filme que causou a ruína de Coppola, que preferiu reconstruir Las Vegas em estúdio. Mas também uma pérola musical capaz de fazer rir e chorar até quem tem coração de pedra. O maneirismo dos anos 1980 encontra aqui sua mais evidente representação.

Gostou? Experimente “Uma Mulher é uma Mulher” (1961), musical que é uma porta de entrada para o cinema de Jean-Luc Godard.

10. Winter Sleep (Nuri Bilge Ceylan, 2014)

O melhor filme do irregular cineasta turco Ceylan, sobre uma esposa que luta para ter independência do marido de tendências tirânicas. Diálogos bergmanianos e a bela paisagem da Anatólia.

Gostou? Experimente “Face a Face” (1975), um dos filmes mais fortes do sueco Ingmar Bergman, inspiração evidente para Ceylan, além de Tarkovski.

* Sérgio Alpendre é crítico e professor de cinema