Não era poeira: cientistas descobrem o que ‘escureceu’ Betelgeuse

Estrela vermelha gigante (mil vezes maior do que o Sol) na constelação de Órion perdeu 40% do brilho no fim do ano passado - deixando astrônomos na expectativa por uma explosão de supernova
Renato Mota01/07/2020 17h41

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Lembra que Betelgeuse ia explodir? No final do ano passado, astrônomos do mundo inteiro acompanharam a diminuição no brilho da estrela vermelha gigante na expectativa de que ela finalmente se tornasse uma supernova – até que no fim de fevereiro Betelgeuse recuperou seu brilho e voltou ao normal. Inicialmente, a mudança foi atribuída a uma nuvem de poeira que poderia ter encoberto a estrela.

Mas dados obtidos usando o James Clerk Maxwell Telescope (JCMT), no Havaí, por uma equipe de pesquisadores do Instituto Max Planck de Astronomia revelaram que enormes manchas magnéticas podem ter causado o escurecimento da estrela. A pesquisa foi publicada esta semana no Astrophysical Journal Letters.

Betelgeuse é a estrela mais brilhante na constelação de Orion (mais precisamente, no “sovaco” do caçador mitológico, por assim dizer…), e fica a cerca de 500 anos-luz de distância da Terra. Como é uma estrela muito grande (com cerca de 10 a 25 vezes a massa do Sol e mil vezes maior) a sua expectativa de vida é baixa, e quando a intensidade do seu brilho começou a baixar rapidamente (chegou a 40% do seu valor normal) muitos pesquisadores acharam que poderíamos conferir um dos eventos mais incríveis do universo: a explosão de uma supernova.

Um estudo independente, liderado pela pesquisadora do Instituto Max Planck de Astronomia, Thavisha Dharmawardena, e pelo cientista sênior do JCMT, Steve Mairs, demonstrou que as variações de temperatura na fotosfera, ou seja, a superfície luminosa da estrela, causaram a queda do brilho. A fonte mais plausível para essas mudanças de temperatura são gigantescas manchas frias, semelhantes às manchas solares, que, no entanto, cobriram 50 a 70% da superfície de Betelgeuse.

ESO / M. Montargès et al.

Imagens de alta resolução de Betelgeuse mostram a distribuição do brilho na luz visível em sua superfície antes e durante o escurecimento. Imagem: ESO / M. Montargès et al.

“No final de suas vidas, as estrelas se tornam gigantes vermelhas”, explica Dharmawardena. “À medida que o suprimento de combustível acaba, os processos pelos quais as estrelas liberam energia mudam. Como resultado, eles incham, tornam-se instáveis ​​e pulsam com períodos de centenas ou mesmo milhares de dias, o que vemos como uma flutuação no brilho”, completa.

Devido ao seu tamanho (se colocada no centro do Sistema Solar, Betelgeuse quase alcançaria a órbita de Júpiter), a atração gravitacional na superfície da estrela é menor do que em uma estrela da mesma massa, mas com um raio menor. Portanto, as pulsações podem ejetar as camadas externas da estrela com relativa facilidade. O gás liberado esfria e se transforma em compostos que os astrônomos chamam de “poeira”.

Por essa característica, estrelas gigantes vermelhas são uma das principais fontes de elementos pesados ​​no universo – e por isso a poeira foi apontada inicialmente como a causa mais provável do declínio acentuado no seu brilho. Para testar essa hipótese, Dharmawardena e sua equipe avaliaram dados novos e arquivados do Atacama Pathfinder Experiment (APEX) e do JCMT em ondas submilimétricas (cujo comprimento de onda é mil vezes maior que o da luz visível) ideais para observar a poeira interestelar.

“O que nos surpreendeu foi que Betelgeuse ficou 20% mais escura, mesmo na faixa de ondas submilimétricas”, conta Steve Mairs. Então não era poeira –  o escurecimento simultâneo da luz visível e submilimétrica é evidência de uma redução na temperatura média da superfície de Betelgeuse em 200°C. “No entanto, uma distribuição de temperatura assimétrica é mais provável”, explica Dharmawardena. “Juntamente com nosso resultado, esta é uma indicação clara da presença de enormes manchas estelares, cobrindo entre 50 e 70% da superfície visível, cada uma com uma temperatura mais baixa que o resto da superfície”.

As manchas estelares, semelhantes às manchas solares, são comuns em estrelas gigantes, mas não nessa escala. Sabemos pelo Sol que a quantidade de manchas aumenta e diminui em um ciclo de 11 anos. Se as estrelas gigantes têm um mecanismo semelhante é incerto.

A equipe continuará acompanhando o brilho do Betelgeuse ao longo do próximo ano para descobrir mais detalhes sobre como a estrela está mudando fisicamente em diferentes escalas de tempo. “Embora não possamos prever quando a estrela explodirá, rastrear seu brilho nos permitirá não apenas entender melhor a evolução de uma classe interessante de estrelas, mas também ajuda a escrever uma página em nossa própria história cósmica”, acredita Mairs.

Via: Max Planck Institute for Astronomy/East Asian Observatory

Editor(a)

Renato Mota é editor(a) no Olhar Digital