Mistério cósmico de 16 anos pode revelar ‘elo perdido’ das estrelas

Desde sua descoberta, em 2004, essa nebulosa intriga os astrônomos pelas suas características incomuns, mas um novo estudo pode ter resolvido esse quebra-cabeças espacial
Renato Mota19/11/2020 18h29

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Descoberta há dezesseis anos, a estrela TYC 2597-735-1 apresentava um mistério para os astrônomos. Um incomum anel ultravioleta a cercava – o que nas imagens do telescópio Galaxy Evolution Explorer (Galex), aparecia em azul. De 2004 para cá, telescópios baseados na Terra e no espaço estudaram o objeto, mas um estudo recente pode trazer um novo de ponto de vista (literalmente!) para a questão.

Uma equipe de pesquisadores, vários dos quais participaram da descoberta original, argumentam que o anel é na verdade a base de uma nuvem de fragmentos em forma de cone, formada depois que uma estrela do tamanho do Sol colidiu e engoliu uma companheira estelar menor. Nós vemos a nuvem como um anel porque ele está virado para a Terra, a cerca de 6.300 anos-luz de distância, na constelação de Hércules.

Na verdade, são dois cones, um apontando na direção do nosso planeta e o outro na direção contrária, ambos disparados na colisão. Se o artigo, publicado na Nature, estiver correto, essa será a primeira observação feita pelos astrônomos de uma fase rara e nunca vista na evolução das fusões estelares.

“A fusão de duas estrelas é bastante comum, mas elas rapidamente ficam obscurecidas pela poeira conforme o material ejetado delas se expande e esfria no espaço, o que significa que não podemos ver o que realmente aconteceu”, explica a principal autora do estudo, Keri Hoadley. “Achamos que este objeto representa um estágio final desses eventos transitórios, quando a poeira finalmente baixa e temos uma boa visão”, completa.

Essa fase ocorre alguns milhares de anos depois da fusão, e estima-se que dure cerca de milhares a centenas de milhares de anos – um período relativamente curto na escala cósmica. “Captamos o processo antes que estivesse muito adiantado; com o tempo, a nebulosa se dissolverá no meio interestelar e não seríamos capazes de dizer o que aconteceu”, afirma Hoadley.

A solução desse quebra-cabeças começou em 2006, quando a equipe encontrou evidências de uma onda de choque ao redor da estrela, sugerindo que nuvem de gás foi ejetada para o espaço a partir daquele ponto. Por um tempo, os pesquisadores pensaram que a estrela poderia estar destruindo um planeta que não estaria visível, mas em 2017 novos dados confirmaram que não havia nenhum objeto compacto orbitando a estrela.

Novos estudos e observações ajudaram a estabelecer que a estrela foi circundada por um disco de poeira. Para chegar à nova conclusão, os cientistas contaram com a ajuda do astrofísico teórico Brian Metzger, da Universidade de Columbia. “Não era só que Brian pudesse explicar os dados que estávamos vendo; ele estava essencialmente prevendo o que observaríamos”, lembra Hoadley. “Ele dizia: ‘se esta é uma fusão estelar, então você deveria ver essas características’. E era como se disséssemos: ‘sim! Nós vemos isso!'”, completa.

NASA/JPL-Caltech/C. Martin (Caltech)/M. Seibert(OCIW)

A estrela Mira e sua cauda ultravioleta brilhante, como vista pelo Galex em 2007. O processo que cria a luz ultravioleta brilhante ao redor dela, no qual uma onda de choque aquece gás hidrogênio, é semelhante ao que está acontecendo na estrela TYC 2597-735-1. Imagem: NasaJPL-Caltech/C. Martin (Caltech)/M. Seibert(OCIW)

A partir daí, formou-se a linha do tempo da estrela, apelidada de Blue Ring Nebula. Há alguns milhares de anos, uma estrela com a massa do Sol e uma menor (com cerca de 100 vezes a massa de Júpiter) orbitavam uma a outra. Conforme a estrela maior envelhecia, ela se expandiu e suas camadas externas se aproximaram da companheira. A estrela menor extraiu material da estrela maior, que girou em torno da pequena estrela em um disco. No final das contas, a pequena estrela acabou consumida por sua parceira.

A colisão das duas estrelas lançou uma nuvem de detritos que foi cortada em duas pelo disco de gás. Isso criou as duas nuvens de detritos em forma de cone. A onda de choque aqueceu as moléculas de hidrogênio dos escombros, o que fez com que adquirissem fluorescência na luz ultravioleta capturada pelo Galex. Esse projeto, gerenciado pelo Laboratório de Propulsão a Jato da Nasa, foi criado para ajudar a estudar a história da formação de estrelas na maior parte do universo, fazendo um censo de populações de estrelas jovens em outras galáxias.

Nas observações do telescópio, a maioria dos objetos vistos irradiava luz ultravioleta próxima (representado como amarelo nas imagens) e ultravioleta distante (representado como azul). A Blue Ring Nebula se destacou porque emitia apenas luz ultravioleta distante. Seu tamanho era semelhante ao de um remanescente de supernova, mas TYC 2597-735-1 ainda tinha uma estrela viva em seu centro.

“Vemos muitos sistemas de duas estrelas que podem se fundir algum dia e achamos que identificamos estrelas que se fundiram há talvez milhões de anos. Mas quase não temos dados sobre o que acontece entre esses dois eventos”, afirma Metzger. “A Blue Ring Nebula pode nos mostrar como essas fases iniciais se parecem para que possamos identificar mais delas”, completa.

Via: Nasa/Space.com

Editor(a)

Renato Mota é editor(a) no Olhar Digital