Testamos o FlexPai: o primeiro celular dobrável é tão estranho quanto parece

Renato Santino10/01/2019 08h37, atualizada em 10/01/2019 10h00

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No mundo da tecnologia, a corrida pela inovação é uma constante. Empresas estão sempre testando novas ideias para ver o que cola com o público. Isso é, ao mesmo tempo, uma bênção e uma maldição. Por um lado, sempre temos coisas novas para admirar; por outro, muitas vezes somos presenteados com ideias que não parecem lá muito boas apenas porque uma empresa quis ser a primeira a chegar ao mercado.

Na CES 2019, poucos produtos se encaixam tão bem na segunda definição quanto o FlexPai, o primeiro híbrido de smartphone e tablet com uma tela dobrável, revelado pela empresa chinesa Royole.

Se você não acompanhou a indústria nos últimos anos, a expectativa pelo lançamento de um celular com tela dobrável da Samsung já havia virado praticamente uma piada do mercado após tantos anos de promessas e adiamentos. Então chega a ser duplamente engraçado que quando a coreana finalmente revelou um protótipo com a tecnologia, ela já havia sido superada por uma companhia chinesa absolutamente desconhecida.

Reprodução

Essa puxada de tapete deu origem, no entanto, a um produto bastante estranho. Sim, a tela dele dobra, permitindo alternar diferentes modos de uso, ou simplesmente ajeitar o tablet para que se encaixe melhor no bolso da calça. No entanto, há uma série de concessões estéticas e funcionais para que isso seja possível que nos leva a questionar se telas dobráveis são uma boa ideia.

Primeiro de tudo, a tela dobrável não dobra totalmente. Ela enverga a um ponto em que as pontas do aparelho se encontram na traseira, mas sobra um grande volume no meio. Ali, há dobradiças que impedem que o usuário coloque pressão demasiada no painel para achatá-lo completamente. Isso faz com que não seja tão fácil guardar o aparelho dobrado no bolso, por exemplo.

Em seu modo total tablet, o FlexPai tem uma tela AMOLED com resolução de 1920×1440, que equivale a uma proporção de 4:3. Ao se dobrar, ele se divide em um painel de proporção 16:9 e outro de 18:9; a diferença está na borda superior do dispositivo, que é enorme para abrigar componentes como câmeras e bateria que não poderiam ser espalhados por outra parte do corpo do produto justamente pela questão da flexibilidade. Ele também conta com até 8 GB de memória RAM e 256 GB de armazenamento interno para completar o pacote.

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“Mas por que diabos eu vou querer uma tela dobrável no meu celular?”, você pode se perguntar. Além dos dois modos de uso (tablet e celular), a Royole nos apresenta outros conceitos curiosos. Quando o aparelho está envergado em um formato de “V”, ele pode ser utilizado no formato “cabana” para assistir a um filme, por exemplo.

Um ponto interessante é que quando o aparelho está dobrado, cada parte da tela funciona de forma independente da outra. Na verdade, quando o aparelho está dobrado, ele funciona como dois celulares completamente independentes, com direito a cada lado com seu próprio chip de telefonia. Isso significa que é possível que um lado seja usado para ver um filme, enquanto outro rode outro aplicativo de forma completamente independente. Quando o aparelho está no modo tablet, um dos aparelhos é escolhido como o principal, e sua tela é expandida.

O FlexPai já é um produto estranho o bastante se olharmos ele apenas por fora, mas quando vemos o que ele traz em termos de software, ele fica mais esquisito ainda. A Royole não é uma fabricante de celulares, mas sim uma empresa jovem criada com o propósito de criar telas dobráveis; isso significa que software está bem longe de ser uma especialidade da companhia. E dá para perceber bem ao colocar as mãos no FlexPai, que sofre, por exemplo, para ajustar sua interface quando o aparelho é alternado entre a posição horizontal e vertical, ou quando o dispositivo é dobrado. A empresa utilizou o Android 9 (Pie) como base de seu sistema Water OS, responsável por fazer essas transições de forma tão desastrada.

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A função mais interessante de um celular com tela flexível, no entanto, não depende de ela ser flexionada ou não. Se o painel é capaz de resistir a ser dobrado como o FlexPai faz, ele também é capaz de resistir a quedas sem danificar a tela, o que é o pesadelo de praticamente todo mundo que tenha qualquer apego por seu smartphone. Talvez as empresas devessem dar um pouco mais de atenção a isso na hora de começarem a promover seus celulares flexíveis quando eles começarem a surgir.

No fim das contas, o FlexPai é aquele tipo de produto que não tem como dar certo, lançado antes de estar pronto para colocar a Royole como pioneira neste mercado. Ele ainda é caro, para piorar, custando 9.000 yuans, o que equivale a mais de R$ 4.500 na cotação atual. No entanto, com todas as suas falhas, o FlexPai também é claramente o resultado de um grupo de pessoas ambiciosas que tentou algo que talvez fosse impossível diante das suas capacidades e limitações. E no final do dia são essas pessoas que fazem o mercado de tecnologia ser um pouco mais interessante, mesmo diante do fracasso certo de um produto. Assim, nos resta torcer para que as outras empresas vejam onde a Royole errou para não repetir os erros e conseguirem apresentar aparelhos que realmente tenham alguma chance de conquistar o público.

Renato Santino é editor(a) no Olhar Digital